As reacções sobre a vida de Günter Grass só podem ser explicadas por gente muito apaixonada por ele. Só um intenso amor ou ódio explicam este frenesim sobre um acontecimento do seu passado. Já assisti a este tipo de fenómeno quando no primeiro ou segundo ano de faculdade se discutia acaloradamente as revelações sobre o passado de Heidegger.
O que importa a um amante da filosofia é a obra filosófica do autor que está a ler, e a um leitor importa a obra literária do escritor que escolheu. Se os autores tiverem um carácter impoluto, tanto melhor para a humanidade. Mas o que é um carácter impoluto? A tentativa de superar vilanias não conta?
O sofrimento dele é de certeza maior do que aquilo que alguma vez poderemos tentar infligir-lhe. O seu passado acorrenta-o mais do que qualquer atitude que possamos adoptar. Não gostamos. Mas não gostarmos não altera esse facto passado, nem ajuda a redimir o futuro.
A vida de um escritor é um ornamento. A vida política de um escritor deve ser avaliada independentemente do valor da sua obra. Eu adoro O Tambor. Vou adorar sempre.
O resto... é a existência de cada um, com as suas contradições, pequenos medos, pequenas traições, pequenas incapacidades de tomar as decisões certas.
Levou muitos anos a acultar esse episódio? Mas as pessoas têm o seu tempo próprio de expiação. Nem todos têm a capacidade de o fazer em quarenta dias.
Quando tomei consciência política pela primeira vez já estava a viver alegremente num país democrático, assim ser-me ia sempre muito fácil condenar outrem pelas escolhas políticas que fez, em tempos que não vivi e que desconheço. Não o faço. O senhor Grass não é um herói? Infelizmente.
quinta-feira, agosto 17, 2006
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1 comentário:
Infelizmente? Ainda bem ...
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