terça-feira, julho 10, 2007

Um bom debate entre os candidatos à presidência da Câmara de Lisboa é melhor do que o não disfarçarem a política das tricas

A RTP fez o meritório esforço de juntar os doze candidatos à presidência da Câmara de Lisboa para um debate. Quem diz que tal número de candidatos não daria um painel funcional em termos de apresentação televisiva enganou-se. Foi bem concebida e pensada a colocação das mesas e dos candidatos. Gonçalo da Câmara Pereira ainda se disse prejudicado por estar afastado da jornalista mediadora, juntando a si a sua companheira de "canto, Helena Roseta, esquecendo-se, no entanto, que a câmara de televisão pode pôr no centro quem está no canto, e vice versa, sendo que o critério é filmar quem fala, quando fala. Ora, a percepção de que houve uns que tinham mais câmara (tempo de antena), logo mais exposição, não é errada, porque em televisão a exposição é dada ao que fala, logo premeia-se aquele que interrompe, algo que na rádio já não é possível, porque não se identificará a voz que se sobrepõe e cria um ruído ininteligível. Na televisão também cria ruído, mas com o prémio da imagem aparecer.


Fátima Campos avisava os candidatos, às vezes em tom crispado, que eles estavam a perder tempo ao fugirem à pergunta que ela lhes colocava, refugiando-se em frases feitas de campanha ou em ataques pessoais que escapavam à lógica da pergunta. Mas eles, os mais experientes, sabiam como chamar a atenção sobre si ou, pensaram muitos, sobre os temas que gostariam de impor, mudando a agenda. Nesta tentativa de mudar a agenda estiveram sempre mais nitidamente empenhados Fernando Negrão e Telmo Correia. Algo que lhes deu, quanto a mim, um tom esforçado, de inconveniências e falta de ideias.

Num tom próximo do esgar público esteve Manuel Monteiro, que não dá descanso a sua voz alta de homem ressentido com Portas, e no seu propósito de recuperar um tempo de líder partidário com destaque, recuperando esses tempos que devem ter sido mágicos de amizade e de influência na pequena esfera do poder. A expulsão de um paraíso, mesmo que se tivesse transformado num inferno, é um acto de iniciação duríssimo. Que o digam os povos antigos, e nós e a interpretação simbólica dos seus mitos nas nossas experiências quotidianas.

António Costa esteve senatorial. Às vezes olhava com profunda atenção e interesse os seus opositores. Tive quase a certeza que o seu cérebro estava a registar a pertinência da intervenção e/ou a qualidade da proposta apresentada. Achei-o legitimamente empenhado na sua tarefa, a responder com o tom e a pose certa, descontraído, sem menorizar os seus rivais. Isso não impede que a figura que até há pouco tempo tinha consagrado toda a sua energia na área da Administração Interna, apareça ali como um novato, e um alheado sobre os grandes propósitos/projectos para Lisboa, concentrando-se em dizer que o mais importante é sanear as contas públicas da câmara.

Esteve menos bem hoje ao escapar às embrulhadas em que o seu mandatário Júdice se deixou enredar. Em Portugal parece que há meia dúzia de homens que estão à venda para tudo e para todos os lugares. Mas onde é que o advogado Júdice aprendeu sobre urbanismo para lhe ser atribuído o papel de Comissário? Pronto, não precisava de saber nada sobre urbanismo, mas conhecem-se-lhes interesses na área de projectos de urbanismo? Reflexões sobre a/s cidade/s? É a distribuição do poder avulso pelas personalidades do costume. Quando não são as do costume são as outras chamadas para assessorar. Para se calarem com as sobras?

Como o presidente francês compreende, ainda que o possamos acusar de egoísmo nacional, é que reformas não se fazem, em democracia, com chicote, e isso porque é desrespeitar as pessoas em todas as suas categorias existenciais, para apresentar um número baixo de défice. Não é por medo do eleitorado, não me parece de todo que Sarkozy o tenha, ,mas porque compreende que para fazer reformas há que explicá-las, prepará-las e impô-las quando tudo estiver claro aos seus concidadãos, que não são crianças mimadas e mal educadas a precisarem de um pai ameaçador e disciplinador.

Ruben de Carvalho esteve igual à CDU. O partido pode contar com um eficiente, ainda que esteja por explicar algumas das posições da CDU nas assembleias que decidiram certos negócios, membro que não se esquece do pronome pessoal inclusivo "nós", não cai na tentação do "eu". Coube-lhe uma das tiradas da noite com a frase "a câmara não está falida", explicando depois porquê (a outra foi a de Quartim Graça ao mostrar um quadro em que se provava a sustentabilidade do aeroporto da Portela). Fez bem o seu papel o candidato Graça ao alertar para situações de desvario iminente na cidade, pelo o Porto de Lisboa, instituição zurzida por todos, pela saída do aeroporto, etc.
Menos bem Gonçalo da Cãmara Pereira. De ideias só retive a de que o país (leia-se o governo) deve ajudar a capital do país no seu saneamento económico. Nem a evocação da cidade simbólica, nem nada parecido. Também não tinha que o fazer.

Helena Roseta apresentou as suas ideias para Lisboa. Tem-nas. Insiste demasiado na ideia de diálogo com os cidadãos, na necessidade de procurar consenso. Percebo a intenção, demarcar-se de um certo fazer política mais impositiva da do tipo do partido socialista no governo, mas não me parece que esse seja um objectivo para a cidade, quanto muito uma metodologia e mesmo assim...

Sá Fernandes apresentou uma solução interessante para a questão da reabilitação da baixa e depois achou por bem atacar o antigo presidente. É uma figura interessante do ponto de vista da fiscalização cívica, mas começou a perder quando se começou a enredar na questão dos assessores. É verdade que se procurou explicar, ainda bem. Mas não me convenceu uma linha. Os assessores dos outros são problemas (sérios) dos outros, ele só tinha que se preocupar com os seus, justificando a sua necessidade. O que não foi o caso.

Garcia Pereira foi o candidato que quanto a mim começou melhor. Sublinhou a importância de se ter e apresentar uma perspectiva estratégica para a cidade que queremos. Foi semi-visionário na sua proposta de um aeroporto, um porto, uma ferrovia (tudo grande). Depois perdeu-se em algum desvario ideológico, como no caso dos arrendamentos (uma lei que celebrei quando saiu e que pouco mais está que sob a forma de suspensa na vida de muitos proprietários que não sabem, ou temem, pô-la em execução). Nesse desvario ideológico também incorreu por vezes Pinto Coelho, à direita. Mas teve intervenções sóbrias, a procurarem manifestar-se no sistema, a querer justificar-se dentro do sistema. É útil trazer a possível desordem da frustração da extrema-direita ao espaço da ordem democrática.

Carmona Rodrigues respondeu bem a Sá Fernandes sobre o facto de terem que ser os tribunais a julgarem acerca da ilegalidade dos actos, mas esqueceu-se que são os eleitores que avaliam os actos que dão credibilidade aos programas. E o senhor é demasiado alheado, demasiado aéreo, para se lhe conhecer um acto credível de gestão, ou um projecto dinamizador para a cidade.

Aliás, projectos dinamizadores, por ali, no debate, nem ouvi-los.

Não foi um debate para se decidir seja o que for. A discussão a seguir, na RTPN, foi pobre, rápida e sem grande interesse. Recordo com saudade os debates nas últimas campanhas autárquicas e as discussões que se lhes seguia na RTP, na Sic Notícias ou com o programa "choque ideológico" na RTP N. Desta feita é o deserto em discussão. Ou sou eu que tenho mais em que pensar.

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