terça-feira, fevereiro 12, 2008

Crise 3

Uma pessoa para ser inteiramente fiel consigo própria devia deixar de escrever sempre que sente quando outro alguém escreve aquilo que de alguma forma fecha o sentido do universo. E esse fechar do ciclo pode durar quanto tempo no tempo?

Para ser fiel comigo própria eu não devia escrever mais depois de ler certos textos que me deixam "o coração num pingo". Acontece, por exemplo, com os textos de Lobo Antunes na revista Visão. Há ali uma escrita como eu nunca conheci em Portugal. Eu falo de uma escrita sobre a verdade numa vida, porque não tenho outras palavras para a definir. É o melhor que eu tenho para dizer.
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Os textos do escritor são como pedaços de gelo que agarramos com as mãos nuas e que continuamos a fixar mesmo quando a dor nos trespassa a pele, a carne e se aloja nos ossos até tornar inertes e insensíveis os dedos. Sabemos racionalmente que não podemos ficar com o gelo muito tempo nas mãos, e no entanto adiamos até ao limite a perda desse sentir, porque sabemos que de alguma forma o continuarmos a preocupar-nos com outras coisas para além daquilo que é a dor de ter pedaços de gelo nas mãos é perseguir num exercício menor na vida.
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E no entanto...continuamos à procura de razões. Não sou psicanalista por isso não vou dizer que procuramos razões para saber a razão porque não somos amados sem que esse amor precise de explicações ou razões para existir, como Lobo Antunes diz ser o que todos nós desejamos.
Procurar razões é o que faz o indivíduo que pensa, como o ensinaram os métodos e as teorias dos filósofos desde a antiguidade.
E a pessoa embica para a questão das razões dos acontecimentos presentes, e pensa nas razões que levam os timorenses a poderem temer a intervenção em cada vez maior número das forças armadas e da polícia australiana. Eu também me interrogo sobre as consequências desse ascendente. Mal por mal, eu se fosse timorense preferia um maior número de contingente do exército português. A história recente de Portugal prova a nossa capacidade de intervir exclusivamente nas questões militares sem nos imiscuirmos nas instituições de governo: não sei se é mesmo uma tendência da política externa portuguesa, orientada de forma inequívoca nesse sentido, ou se é consequência do pouco poder político real. Espero que seja a primeira das justificações a explicar a boa prática.
Também embiquei para o aplauso do que ontem disse o Prof. António Manuel Hespanha, quando falou de valores, e do que a nossa política actual fez com alguns deles como os de: bem público, serviço público, ética da responsabilidade, compromisso, liberdade e regulação. Ainda que fique sempre por explicar a questão dos critérios para avaliar as aplicaçãos dos valores. Ficamos sem saber se isso pertence à Assembleia da República desenvolver, à sociedade enquanto manifestação de uma tradição cultural, a Deus, à escola, à consciência de cada um, à sensibilidade pessoal ou ao estado nacional ou ao estado transnacional?
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Habitualmente de acordo com as posições do Prof. Adelino Maltez, não consegui no entanto fazê-lo a propósito da sua ideia de que as investigações sobre a vida passada do primeiro-ministro vão numa linha de imprensa (leia-se uma determinada elite) que se sente incomodada com a vinda do governante do Portugal interior. Julgo que são explicações infelizes. Se essa linha de procedimento fosse verdadeiro tinha funcionado logo na campanha. Não é por as pessoas serem oriundas da província, ou serem mulheres, ou serem negras ou qualquer outra característica dos diferente dos que por regra de maioria ocupam lugares de poder que são escrutinados, ou devem ser escrutinados. Que o não façam habitualmente é outra coisa, mas que um primeiro-ministro diga que isso é mau jornalismo é algo que não lhe compete oficialmente avaliar, só precisa de dizer se os factos estão correctos ou incorrectos.
Não foi por ser da magnífica Beira Interior que o nosso muito jovem, em termo políticos, primeiro-ministro teve o apoio da imensa maioria dos povo português, e não será por ser oriundo dessa região que a poderá perder nas próximas eleições. Há que não arranjar subterfúgios com a origem, ou com o género, para fugir à avaliação das nossas acções públicas e escamotear as nossas debilidades. É a democracia.
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Em total desnorte de valores continua o Ministério da Educação. A americanização do nosso sistema de educação só parará em que patamar? Agora a reforma a todo o gás chega ao segundo ciclo (antigo ciclo preparatório). Tudo em velocidade cruzeiro. É preciso é fazer reformas, não é? Ainda vamos todos saber de que mal é feito o nosso desejo de reformar contra tudo e todos e em nome de ideias importados de sistemas eles próprios em colapso. Mas quando mudarem os principais dirigintes principais internacionais e eles começarem a ter outro discurso haverá que na lusa pátria os queira logo seguir e venha reformar as reformas, pois ainda um dia haveremos deixar de ser portugueses e europeus e passar a ser cidadãos do país que nessa década estiver na moda: sei lá, finlandeses que vêm do frio (embora a moda da Finlândia com o caso do aluno que assassinou alguns dos seus colegas tivesse ficado um bocadinho menos luminosa).
E no entanto... eu escrevo: o tempo passa. Sim, e depois? Depois o tempo passa e passando obriga-nos a passar nele. Às vezes dá dó, outro regozijo, às vezes indiferença, outra resistência. Somos tão afortunados. E no entanto...ele há razões, que as há.

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