Cenário nº 1. Primeiro-ministro Sócrates é inocente. Está ofendido na sua honra. Processa um canal de televisão por este mostrar que existem testemunhos que o dão como envolvido num crime de corrupção. Noto: passa-se a processar um meio de comunicação por aquilo que ele mostra? Ou pelo conteúdo daquilo que ele mostra? Mas os meios de comunicação não podem mostrar material do foro do conteúdo de informação? Então Sócrates, o inocente, não estará a insistir num precedente grave em democracia, insurgindo-se (uma vez mais) contra o mensageiro e não contra o autor da mensagem? Sócrates, o inocente, terá que levar quem ele considera que o injuria a tribunal. Ou será que a injúria vem da divulgação da comunicação e não da comunicação em si divulgada?
Cenário nº 2. Primeiro-ministro Sócrates é culpado. Está ofendido na ideia de intangibilidade que faz de si. Processa um canal de televisão por este mostrar que existem testemunhos que o dão como envolvido num crime de corrupção. Para quê? Para alimentar a ideia de "campanha negra" dando nome de forma definitiva a um adversário, a TVI, no caso? Para desviar a atenção do conteúdo da notícia para a punição da forma (e da ousadia) na forma como esse conteúdo foi divulgado? Para dar sinais a outros mensageiros que ainda tem sob controlo grande parte da forma como se deve apresentar a informação?
Cenário nº 3. Sócrates está inocente. Ataca mensageiro em momento de desnorte. Mas reconsidera e decide deixar a justiça funcionar apresentando provas que ajudem a mostrar a sua verdade. Os portugueses (mesmo os que o desconsideram) suspiram de alívio por não terem afinal de contas um primeiro-ministro corrupto, coisa de filme rasca da máfia, e deixam-no ir a votos com a honra limpa, e votando ou não votando nele pela sua acção governativa.
cenário nº 4. Sócrates é culpado. Ataca o mensageiro por estratégia e por hábito bem sucedido na sua governação de pressão sobre os grupos, pessoas ou instituições que não partilham com ele da sua visão do mundo e de si. Continua bem sucedido e chega às eleições aureolado de vítima de ataques à honra (sempre indignos quando o são) e vai-se votar num primeiro-ministro sob suspeita.
Conclusão: no cenário 1,2 e 4, Portugal perderá sempre. No cenário 3, perde a política portuguesa, porque assim qualquer indivíduo se julgará no direito de envolver em grave acusação o nome de um ministro ou primeiro-ministro sem pudor e sem temer consequências no decorrer de uma convera privada sobre o deslindar de um crime.
O que sairá daqui para o futuro? Melhores leis anti-corrupção? Como? Se ainda hoje ouvimos um juiz, especialista, dizer que nesta legislatura foram criadas leis ainda mais restritivas à investigação?
Melhor liberdade de imprensa e mais preocupação com os conteúdos informativos? Como? Se a tendência é criar mecanismos de controlo ou de pressão utilizando os media quando interessa transmitir mensagem, e refreando-os quando desagrada? E que liberdade existe realmente quando os meios de comunicação se concentram nas mãos de dois ou três grupos económicos que não são inocentes no que a uma agenda mediática diz respeito?
Melhor democracia? Como? Se o discurso de fuga para a frente e do desejo de criar pequenos autocratas em cada local de funcionamento popular é um tique governativo que se está a tornar numa ideologia?
E agora que a banca e a indústria estende a mão ao governo, alguém pensa que aqueles alguém querem saber da verdade acerca de uns "trocos" desviados, preferindo o certo ao incerto?
O senhor presidente deve vir agora dizer-nos que lamenta, mas não tem solução.
Não se lamenta mais do que eu me lamento por eles. E sabendo, como se percebe no vídeo, que ali se fala do clima de medo instaurado (e ainda só se estava em 2006, início da legislatura), o que sobra agora de verdade? Ora Sócrates sozinho não conseguiria assim tanta influência. Até onde vai esta espoliação? Quem quis assim tanto que os portugueses aprendessem a ter medo? Que nos habituássemos?
sábado, março 28, 2009
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