segunda-feira, setembro 14, 2009

Quem não tem dinheiro não tem ideias?

Pedro Norton, na revista Visão, Henrique Monteiro, no Expresso e, ainda que de forma ideológica mais enviesada, João César das Neves e Manuel Maria Carrilho , ambos no Diário de Notícias, fazem aquilo que todos os eleitores portugueses deviam estar a fazer. Eles questionam-se sobre o tipo de Estado que temos, que claramente não parece satisfazer ninguém, e que por isso tem que ser urgentemente repensado, discutido, proposto e reinventado, no quadro dos valores pluralistas de um estado democrático de direito. E nós, o que estamos a fazer? A ver os tiques de cinco líderes partidários para confirmar uma crença ou iludir a descrença que cada um, ou todos à sua vez, aportem nos nossos sentimentos? Fazemos de conta que é verdade esta realidade política e social que se circunscreve à participação exponenciada nos media de cinco pessoas? Não há mais por onde escolher, nem outro meio como escolher?
Era aqui que se devia insistir no debate político: no tipo de cultura política que queremos criar em Portugal. As questões financeiras, as económicas e as jurídicas decorrem desta ideia definida de cultura política desejada. Claro que um governo tem que responder a questões de tesouraria, de resolução de problemas sociais imediatos, de manutenção institucional e obras públicas, enfim, um governo tem que dar resposta a toda uma necessidade de bricolage dos campos que constituem a manutenção da ordem social, e muitas vezes fá-lo com as ideias do passado, os hábitos sociais dos mandantes e dos actores, com as propostas assentes nas últimas conversas que se tiveram ou do último livro que se leu, procurando copiar modelos de campanha ou discursos e posições políticas de outras capitais na moda, ou porque sim.
Fica-nos por pensar Portugal, e o mundo, e Portugal no mundo.
Não consigo deixar de pensar nos EUA. Sorrio e digo: "Estes americanos são loucos", quando os vejo desfilar contra a reforma do sistema de saúde. Mas essa discussão, a do papel do Estado, é tão legítima como a que opôs, por motivos contrários, os cidadãos portugueses ao fecho de urgências hospitalares e de maternidades em Portugal, e como a que opôs os professores à dita reforma da Educação. Quem pode garantir que cidadãos e professores, ao defenderem claramente interesses privados e de comunidade, não estavam a defender o interesse geral, ao defenderem essa ideia de obrigatoriedade do Estado social em garantir a quantidade e a qualidade dos serviços? Todavia, se as funções do estado social não satisfazem, haverá que ter a coragem de perguntar se a questão se prende com a má gestão dos sistemas (como pessoalmente creio), se se trata de um deficiente uso do modelo de gestão escolhido, ou se este necessita de ser alterado. Precisamos de saber bem onde anda o nosso dinheiro, se é pouco ou o suficiente para responder às aspirações sociais deste povo, o que pode ser feito para o gerir melhor.
Os contribuintes americanos não parecem acreditar que saúde universal seja sinónimo de eficiência social e tarefa do Estado, sem que tal implique um aumento e um desperdício dos impostos. Nós por cá não parecemos acreditar que o aumento efectivo dos nossos impostos esteja a ser bem empregue. E sentimos que acreditando no Estado social, querendo defendê-lo como marco civilizacional europeu, este rapidamente se transforma num Estado tentacular, inoperante e sugador das energias individuais e colectivas. Como encontrar o equilíbrio entre um Estado que tem e deve garantir como tarefa sua a instrução, saúde, apoio social aos mais carenciados, obras públicas, justiça, segurança e defesa e sem se intrometer na vida dos seus cidadãos, em que os direitos e os deveres de cada um um sejam simples e claros, sem cair no paternalismo, ou na orientação da existência privada e dos serviços públicos autónomos como coisa própria sua?
Começando por separar totalmente os cargos políticos dos cargos administrativos seria uma boa coisa por princípio, e depois criar uma Escola de excelência e dignificação dos agentes públicos, não era uma má medida para começar. Mas para isso era preciso mais participação da chamada sociedade civil para esta pôr um travão, eleitoralmente desinteressado, na forma como opera o nosso sistema político-partidário.

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