sexta-feira, novembro 17, 2006

Mário Sottomayor Cardia. 1941-2006

Só conhecia Mário Sottomayor Cardia das suas obras. Sabia também que ele tinha uma biblioteca imensa, facto que me fez depois olhar sempre para ele com profundo espanto. Vá-se lá explicar o fascínio de uma biblioteca. Admirava-lhe o intelecto e a sua vida política, ao mesmo tempo que me lembrava de todas as manifestações em que, enquanto aluna, me vi envolvida por estar contra a sua acção política então como Ministro da Educação.

Naquele dia porém tive a oportunidade de o conhecer pessoalmente. Estava a concluir o mestrado e tinha que fazer uma apresentação do meu trabalho no grupo de investigação criado pelo prof. António Marques e que tinha por membro, entre outros, o professor Sottomayor. Eu estava a escrever uma dissertação sobre as consequências para uma filosofia política das teses do meu intensamente preferido filósofo Karl-Otto Apel. O professor Sottomayor, no seu jeito consequente, criticou do princípio ao fim as teses por mim defendidas, as quais eu apresentava como solução para as questões relacionadas com a valorização universal das acções humanas. Não se coibia de me interromper sempre que achava necessário, e por uma ou duas vezes as suas perguntas me fizeram balbuciar, e, por uma vez, me silenciaram. Nunca foi, nesse exercício, discricionário ou prepotente.

Bom, voltei a vê-lo, no mesmo contexto, mais umas vezes. Logo que podia fazia-lhe muitas perguntas sobre ética e sobre política. Sempre me respondeu pacientemente, sem familiaridade, mas também sem condescendência. Ficamos agora só com a obra.

Este é o meu testemunho a que junto o meu lamento pela sua morte.

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