domingo, dezembro 03, 2006

Discursos sobre a educação: analogia

Na aldeia na Beira, ou mesmo na aldeia do Ribatejo, havia sempre noites de incontornável mal-estar. Ir para a cama nas noites frias em que os meus pais se lembravam de ir visitar os seus pais, equivalia a um exercício de estoicismo. Entrava-se quase sempre numa cama de lençois de linho tão gelados e ásperos que fazíamos várias tentativas antes de finalmente nos conseguirmos cobrir com eles. Tínhamos depois um monte de cobertores pesadíssimos em cima que nos oprimiam o peito e não nos permitiam uma respiração serena. Não nos mexíamos nem um bocadinho, na esperança do lugar onde nos enrolávamos sobre nós próprios aquecer rapidamente e dar-nos o conforto almejado, para além de que aventurar um pé para além do território já decalcado, era como caminhar na neve. O cheiro a humidade da roupa que estava emalada hà muito antes de ser ali usada naquele inverno, o peso daquelas mantas feitas em casa, o frio das habitações que nos obrigava a manter o nariz dentro da roupa, tudo isso nos causava confrangimento e suspiravámos, discretamente então, pelas nossas camas da cidade, enquanto, tremendo, aguardávamos o sono que nos levaria dali para fora até à chegada de uma manhã mais clara e de uma cama finalmente confortável.

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