O programa do Prós e Contras de ontem não foi sobre adopção mas sobre o caso de vida de uma menina que está no centro de uma luta de poder. Ela está a ser disputada pelo poder judicial, o poder de pertença paternal convencional, o poder dos que a amam incondicionalmente, o poder da segurança social, o poder de informar e influir dos meios de comunicação e o poder de tomada de posição popular. Com o devido respeito pelo caso da pequenina, mas quem me dera que o programa fosse realmente sobre o rotundo falhanço do nosso sistema de adopção e reflexão sobre o meio de o alterar. Mas como pedir a um programa de televisão o que o parlamento não é capaz de fazer? Ainda assim, ontem parece que toda a gente descobriu afinal os méritos de uma coisa chamada "adopção restrita" e que parecia que estava na lei mas não era aplicada, ou coisa que o valha, e que de certeza alguém vai querer ver a sua aplicação mais complicada para justificar o seu trabalho.
O que me parece que está a perturbar todos os intervenientes deste acontecimento em particular é facto do poder judicial, o paternal convencional e o da segurança social , tradicionalmente escudados na intangibilidade dos seus direitos, estarem a ser questionados pela tomada de posição popular que, dizem os interessados, está ser influenciada pelos meios de comunicação, como, numa expressão infeliz, declarou o juiz do tribunal da relação do Porto ao afirmar que “Não há opinião pública, há opinião publicada”, declarando como sendo autor da frase um outro senhor do Porto, que, obviamente, não o é, pois quem a proferiu foi Winston Churchill, que, aliás, sabia muito bem publicitar a sua opinião. É como se um jornalista dissesse “Não há justiça na aplicação da lei o que há é arrogância administrativa aplicada”. Frases sem qualquer interesse teórico ou prático e que servem para toldar a argumentação, e cuja legitimação está longe de ser justificada. Mas adiante. O que me parecia essencial, para além da resolução do caso a favor da menina, era esclarecer de uma vez para sempre, quanto tempo é admissível que uma resolução judicial destas possa demorar, quando é que se passa a ter exclusivamente juízes formados em direito de família para analisar estes casos, quando é que o processo de adopção acelera e deixa de ter excessos de proteccionismo de um sistema de segurança social que tem vindo a provar à saciedade que é tudo menos seguro (e não me venham dizer que é o tempo necessário de o sistema garantir a protecção de uma criança, porque eu não acredito, e não tem fundamentação psicológica, legal e filosófica), quando é que a justiça deixa de falar sobranceiramente com o povo que, numa democracia, a financia e a legitima no seu poder, quando é que os directores, do Observatório sobre a adopção, e o do Instituto da Segurança Social, por exemplo, se deixam de conversa mole?
Ontem foi dito que Portugal não é o Brasil em termos de adopção. Portugal não é realmente o Brasil, de quem dão uma má imagem em termos de sistema de adopção, mas também não é os Estados Unidos que tantos gostam de exibir em credenciais noutras matérias. Portugal prefere então ser um país onde morrem crianças nas mãos de progenitores cruéis, e é um país com muitas crianças institucionalizadas, com uma lista imensa de pais desejosos de adoptar, com leis disfuncionais, e com muitos juízes a dormir descansados com o bom trabalho que fazem, e é isto que a opinião pública (que existe, como sabe os que estudaram estas coisas) reconhece, e, talvez tomando agora a parte pelo todo, não sei, quer poder evitar. Quer poder intervir, no limite da sua força e no restrito cumprimento da lei, ao invés de se limitar a receber de forma passiva as inúmeras notícias de crianças em risco. Se o faz é porque sente que quem de direito é incompetente para o fazer. E que chegou a hora de o afirmar. Isto é participação cívica. Não gostam? Pois a acção da democracia, como só na teoria se diz que a queremos, incomoda sempre as oligarquias. Sempre assim foi.
Exemplo prático (caso real). Eu conheço, infelizmente, muitos outros casos.
A casou com B. B tem dois filhos de um primeiro casamento já maiores de idade. A e B querem adoptar uma criança e vão a um Centro de Segurança Social, a funcionária comunica-lhes que para iniciarem o processo os filhos de B têm que ser chamados e declarar o seu consentimento. Mas A não quer a interferência dos seus enteados já adultos porque julga que se engravidasse também não lhes ia pedir autorização para ter a criança. Resultado, uma adopção de um casal estável e com imenso carinho e condições materiais para dar a menos, uma criança institucionalizada a mais. O sistema fica feliz porque garantiu a aplicação da lei.
O que me parece que está a perturbar todos os intervenientes deste acontecimento em particular é facto do poder judicial, o paternal convencional e o da segurança social , tradicionalmente escudados na intangibilidade dos seus direitos, estarem a ser questionados pela tomada de posição popular que, dizem os interessados, está ser influenciada pelos meios de comunicação, como, numa expressão infeliz, declarou o juiz do tribunal da relação do Porto ao afirmar que “Não há opinião pública, há opinião publicada”, declarando como sendo autor da frase um outro senhor do Porto, que, obviamente, não o é, pois quem a proferiu foi Winston Churchill, que, aliás, sabia muito bem publicitar a sua opinião. É como se um jornalista dissesse “Não há justiça na aplicação da lei o que há é arrogância administrativa aplicada”. Frases sem qualquer interesse teórico ou prático e que servem para toldar a argumentação, e cuja legitimação está longe de ser justificada. Mas adiante. O que me parecia essencial, para além da resolução do caso a favor da menina, era esclarecer de uma vez para sempre, quanto tempo é admissível que uma resolução judicial destas possa demorar, quando é que se passa a ter exclusivamente juízes formados em direito de família para analisar estes casos, quando é que o processo de adopção acelera e deixa de ter excessos de proteccionismo de um sistema de segurança social que tem vindo a provar à saciedade que é tudo menos seguro (e não me venham dizer que é o tempo necessário de o sistema garantir a protecção de uma criança, porque eu não acredito, e não tem fundamentação psicológica, legal e filosófica), quando é que a justiça deixa de falar sobranceiramente com o povo que, numa democracia, a financia e a legitima no seu poder, quando é que os directores, do Observatório sobre a adopção, e o do Instituto da Segurança Social, por exemplo, se deixam de conversa mole?
Ontem foi dito que Portugal não é o Brasil em termos de adopção. Portugal não é realmente o Brasil, de quem dão uma má imagem em termos de sistema de adopção, mas também não é os Estados Unidos que tantos gostam de exibir em credenciais noutras matérias. Portugal prefere então ser um país onde morrem crianças nas mãos de progenitores cruéis, e é um país com muitas crianças institucionalizadas, com uma lista imensa de pais desejosos de adoptar, com leis disfuncionais, e com muitos juízes a dormir descansados com o bom trabalho que fazem, e é isto que a opinião pública (que existe, como sabe os que estudaram estas coisas) reconhece, e, talvez tomando agora a parte pelo todo, não sei, quer poder evitar. Quer poder intervir, no limite da sua força e no restrito cumprimento da lei, ao invés de se limitar a receber de forma passiva as inúmeras notícias de crianças em risco. Se o faz é porque sente que quem de direito é incompetente para o fazer. E que chegou a hora de o afirmar. Isto é participação cívica. Não gostam? Pois a acção da democracia, como só na teoria se diz que a queremos, incomoda sempre as oligarquias. Sempre assim foi.
Exemplo prático (caso real). Eu conheço, infelizmente, muitos outros casos.
A casou com B. B tem dois filhos de um primeiro casamento já maiores de idade. A e B querem adoptar uma criança e vão a um Centro de Segurança Social, a funcionária comunica-lhes que para iniciarem o processo os filhos de B têm que ser chamados e declarar o seu consentimento. Mas A não quer a interferência dos seus enteados já adultos porque julga que se engravidasse também não lhes ia pedir autorização para ter a criança. Resultado, uma adopção de um casal estável e com imenso carinho e condições materiais para dar a menos, uma criança institucionalizada a mais. O sistema fica feliz porque garantiu a aplicação da lei.
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