segunda-feira, janeiro 01, 2007

uma concepção de democracia

Não há sinais dos conflitos que as notícias reportam sobre Paris. Milhares de turistas enchem as ruas nos lugares previsíveis que esta cidade com uma boa e bem vendida imagem tem para oferecer. Não há sequer vislumbre de reforço policial por parte das autoridades que, a existir, e existirá com certeza, não privilegia a regra da ostentação da figura. Parece uma cidade sem polícias à vista, com gente a deambular por toda a parte e que vem de toda a parte do mundo, misturada com os residentes de forma ordenada. É uma cidade que parece ser tomada de assalto, sim, mas pelos turistas que, de um modo que eu vi sempre ser pacífico, se aglomera em todo o lado esperando pacientemente a sua vez de entrar, de ver, de comprar, de tomar os transportes públicos, de comer. Tudo feito em fila, à vez. Terrível, mas ordenada, multidão que parece no entanto guardar-se a si própria nesta verdadeira Babel em que se cruzam freneticamente os indivíduos que, como eu os meus, vão em busca de um lugar, ou de uma coisa, ou de uma fotografia, enfim. O que há de gente a fotografar o que quer que seja, mesmo que seja algo a mexer-se muito depressa, dava um romance de muitas páginas.

E muito vejo eu também comprar em Paris. Lojas de bairro sempre cheias. Pastelarias com bolos enjoativos, lojas com boa e má roupa, sapatarias, casas de “souvenirs”, cafés e restaurantes mil, papelarias e livrarias, tudo cheio a toda a hora. Lojas com coisas de muito luxo em zonas com terrenos caros da cidade e outras que nem por isso, sempre todas com clientela farta. Pouquíssimas a publicitarem qualquer redução de preço. Não parece ser essa a razão para se continuar a comprar por estes dias. Tudo caro. Para os franceses parece que é véspera de Natal ainda agora.

O tempo, por estes dias, ora chuvoso, ora seco, quase sempre de céu cinzento. Os pobres sem abrigo, que os há e muitos, apresentam um ar alquebrado. Nos túneis do metro não se ouvem tantos músicos como já dei conta outrora. Se a cidade se apresenta festiva, com as ruas e estabelecimentos cheios de luz e decorações natalícias, notei uma muito menor presença de música na rua.

Um dia, aos vinte anos, amei com paixão e deslumbramento esta cidade. Hoje faz parte de uma cartografia pessoal que reconheço ainda sem me deixar já ofuscar. Aos vinte anos, Beauvoir e Martin Du Gard, Duras e Proust traziam-me pela mão e passeavam-me. Eu era mais olhos do que qualquer outra coisa, mais vontade de liberdade do que consciência de como preservá-la.

Hoje estou mais atenta ás questões políticas que este Estado continua a conseguir fazer determinar, atenta ao que pensam os seus filósofos e teóricos políticos. E se já muitas vezes critiquei a política narcísica deste presidente, uma replica para o modelo francês do que é o presidente americano para a sua cultura, na verdade tenho um reconhecimento maior do que este narciso europeu proclama de vez em quando. E fazendo coro com as palavras do editorial do “Le Monde” do dia 31 de Dezembro reconheço-me incluída na ideia de democracia defendida, apesar de tudo, pela Europa: “Beaucoup d`Iraquiens réclamaient la mort de celui que fit régner la terreur dans leur pays. Mais il n`est d`opposition à la peine de mort que de principe. Et ce principe s`il est admis, comme il l`est dans toute l`union européenne, ne soufre pas d`exception. Prendre en compte des circunstances exceptionnelles, c`est miner le principe lui-même. Jacques Chirac l`a bien compris, lui qui, face à une opinion publique toujours tentée par la loi du talion, veut inscrire l`abolotion de la peine de mort dans la Contitution.
George W. Bush, qui ne sait ni pourquoi maintenir ses 140.000 soldts en Irak ni comment les retirer, a salué l´exécution de Saddam Hussein comme « une étape importante sur le chemim de la démocratie ». C`est une conception de la démocratie. Elle n`est pas le notre.» Não é mesmo.

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