A educação de um revolucionário não assenta nos mesmos livros, ou pelo menos, não na mesma crença com que se lê esses mesmos livros, da educação de um democrata, de um defensor do processo eleitoral universal, ou sim?
O que sabemos dos livros com que Lenine procurava fundamentar a sua concepção política-social? Que ele “devorava Hegel, Feuerbach e Aristóteles” (p.318), que nutria profundo afecto “não por pessoas com quem vivia, mas por pessoas que tinham moldado as suas opiniões políticas: Marx, Alexandre Ulianov[1], Tchernichevski e os terroristas socialistas russos.” (p.176), e que “Pelos seus livros podemos ver que Hegel, Clausewitz e Aristóteles o ajudaram a apurar a sua interpretação do marxismo e a sua estratégia para a revolução. Talvez Darwin e Maquiavel tenham feito o mesmo por ele.” (p.269)
Acrescenta Service:
“Lenine formara a sua visão do mundo durante as duas últimas décadas do século XIX, e após 1900 não surgiu nenhum pensador que ele admirasse. (…) Mas tinha uma filosofia intelectual estabelecida. Carlyle, Freud, Kierkegaard, Le Bon, Michels, Nietzsche e Weber eram ignorados, totalmente ou quase, nas suas obras (embora viesse a ter o Assim falou Zaratustra de Nietszche na sua estante do Kremlin). A sua preocupação era alargar e aprofundar o seu conhecimento de Marx, Engels, Plekhanov e Kautsky". (p.268)
Podemos então dizer que estas leituras fazem o revolucionário? Não, seria ridículo. Explicam alguma das orientações de Lenine, mas não justificam as suas tomadas de posição. Porque na história do intelectual Lenine havia a questão da motivação. Porquê ler estes autores e transformar-se num revolucionário e não num democrata, ou porquê não contemplar obras críticas que se opusessem a esta teorias? Service avança com duas teorias: Estas leituras seguiam no pressuposto iluminista de uma razão triunfal que devia ser posta ao serviço do progresso, por um lado, e, por outro, ele estaria a cumprir um desígnio de vingar a morte do seu irmão. Tenho dificuldade em aceitar este tipo de explicações. As motivações só podem ser explicadas pelo próprio, ou por alguém que tenha acesso a manifestações suas que possam ser claramente decifradas. Tudo o mais é ficção.
“Lenine formara a sua visão do mundo durante as duas últimas décadas do século XIX, e após 1900 não surgiu nenhum pensador que ele admirasse. (…) Mas tinha uma filosofia intelectual estabelecida. Carlyle, Freud, Kierkegaard, Le Bon, Michels, Nietzsche e Weber eram ignorados, totalmente ou quase, nas suas obras (embora viesse a ter o Assim falou Zaratustra de Nietszche na sua estante do Kremlin). A sua preocupação era alargar e aprofundar o seu conhecimento de Marx, Engels, Plekhanov e Kautsky". (p.268)
Podemos então dizer que estas leituras fazem o revolucionário? Não, seria ridículo. Explicam alguma das orientações de Lenine, mas não justificam as suas tomadas de posição. Porque na história do intelectual Lenine havia a questão da motivação. Porquê ler estes autores e transformar-se num revolucionário e não num democrata, ou porquê não contemplar obras críticas que se opusessem a esta teorias? Service avança com duas teorias: Estas leituras seguiam no pressuposto iluminista de uma razão triunfal que devia ser posta ao serviço do progresso, por um lado, e, por outro, ele estaria a cumprir um desígnio de vingar a morte do seu irmão. Tenho dificuldade em aceitar este tipo de explicações. As motivações só podem ser explicadas pelo próprio, ou por alguém que tenha acesso a manifestações suas que possam ser claramente decifradas. Tudo o mais é ficção.
Então o que explicará as opções de Lenine? Os livros que leu e os autores que escolheu? Mas as leituras da mesma obra podem ter múltiplas interpretações, e o próprio Service nos diz que Lenine “Tinha ideias peculiares suas. Mas apresentava-as agressivamente como sendo a mais pura ortodoxia” (p. 176). Portanto quanto ao ele estar a seguir ortodoxamente a teria marxista estamos falados. Mas então o quê? O contexto familiar, histórico e cultural? São muitas variáveis para definir um comportamento. Robert Service prefere fazer cruzar a variável cultural (história de uma família profundamente crente nas faculdades cognitivas, na ilustração, como meio de evolução da pessoa e da civilização), a variável personalidade (a morte do irmão revolucionário por ordem do Czar que ensombrou a sua vida de adolescente protegido e cuidado), com a variante intelectual (Lenine era um intelectual agudo e um leitor ávido, ainda que orientado numa linha de interpretação marxista da realidade). Percebe-se bem as leituras de Feuerbach e de Hegel, mas é interessante a sua necessidade da leitura de Aristóteles. Apesar de tudo um crítico forte do regime democrático desde o século IV a C.
Assim, as ideias que se lêem consubstanciam o pensamento do indivíduo, ou o indivíduo lê para justificar o que pensa?
[1] Era o seu irmão.
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