segunda-feira, janeiro 07, 2008

O recrutamento terrorista e a sociedade civil 4

"Amiga, é o petróleo", diz-me voz avisada lá da venezuela. "
"Olha bem para o gráfico do aumento do preço do crude por barril durante, por exemplo, o governo de Chávez."
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Não o disse, mas podia ter acrescentado na mesma linha de pensamento, julgo eu: " Já viste o que este aumento exponencial não rendeu ao Estado directamente? E o que com isto se pode comprar em armas, ideias, meios de transmissão dessas ideias e pessoas? Para além do reforço psicológico que uma personalidade autoritária neste acumular de riqueza relativamente fácil vai buscar, e ainda que em cumprimento de um mandato legítimo?"

Pois é, esqueço com demasiada facilidade como a economia, esqueço menos o papel da violência, é uma excelente cobertura ou um reforço dos trabalhos de todos os sapadores ideológicos. Quando ouço alguém no mundo ocidental a dizer que as ideologias já morreram fico estupefacta, pois então nem considerarem por um segundo a hipótese de essa sua afirmação, por exemplo, resultar ela própria de uma crença ideológica?
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Nota 1. As televisões deram ontem em espaço nobre (o dedicado à informação) mais tempo de antena a um terrorista americano do que aquele que inicialmente ele deve ter pensado ter, visto que recorreu a um meio de divulgação ainda com um menor número de audiências. Ou talvez não, talvez a organização dele saiba muito bem que ao pô-lo a declarar insanidades sobre o mundo e a política, sendo ele um cidadão americano, isso atrairia os media ocidentais como peixes ao anzol. Seja como for o dever de informar não se confunde com o dever de fazer passar propaganda por actores não regulares no espaço público democrático. Para quê tanta exposição à sua mensagem? Não seria suficiente anunciar a existência dessa mensagem e contextualizá-la com informação critica sobre os meios e os objectivos propostos pelo dito "operacional" da al- qaeda?
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Nota 2.
Quem está naturalmente desapontado com a suspensão do rali Lisboa-Dakar por parte da França (os amantes do desporto automóvel, os concorrentes, a organização, Portugal, Marrocos, Mauritânia e Senegal) devia pensar nas hipóteses: 1. Invadir a Mauritânia com forças estrangeiras? 2. Bombardear interesses terroristas na Mauritânia? 3: Pressionar o fraco governo da Mauritânia a actuar urgentemente sobre as forças terroristas que operam no seu território sem seu conhecimento ou autorização e que põem em perigo a vida de nacionais franceses?
O governo francês optou por esta terceira via. A via do reforço diplomático e pela penalização económica antes da via mais musculada. Não estou a dizer que o esteja a fazer bem. Estou a dizer que me parece ter sido esta a via de pressão escolhida. Lembro-me que Israel há ano e meio entrou num Estado soberano, o Líbano, exactamente pelos mesmos motivos: proteger os seus cidadãos contra forças que operavam a partir do Líbano sem que o Estado libanês tivesse poder para as dominar, mesmo sendo elas organizações estrangeiras e apoiadas por países como a Síria ou o Irão. Preferiamos agora que o mesmo tivesse acontecido, mesmo se para proteger a organização, os concorrentes e o público desta corrida?
Claro que para a França os interesses franceses estão sobre todos os outros interesses antes enunciados (o dos amantes do desporto automóvel, os concorrentes, a organização do evento, Portugal, Marrocos, Mauritânia e Senegal). Não foi uma desistência em face da al-qaeda foi um aviso sério aos países onde a al-qaeda labora de forma mais ou menos impune, e onde assassinou três franceses ainda há dias, que a França não finge que nada aconteceu.
Bem pode o ministro da Mauritânia dizer que não nos podemos render ao terrorismo pois enquanto não houver acções visíveis que demonstrem essa intenção os governos mais fortes imporão sempre os seus interesses. E às vezes a favor dos direitos dos seus cidadãos mesmo contra os direitos de todos os outros.
Pois, a universalização dos direitos na prática é ainda uma luta de soberanias e não uma conjugação de esforços.

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