segunda-feira, março 10, 2008

A escola só como uma equipa que ganha dinheiro.

Porque é que a Ministra Maria de Lurdes Rodrigues não tem um pingo de dignidade democrática e se demite? Porque na realidade ela está convencida, e tem o primeiro-ministro com ela, que a razão, a razão estratégica e instrumental, está do seu lado. Então não é verdade que ela descobriu o ovo de Colombo financeiro da educação? Repare-se, passou a ter os cursos profissionais a serem leccionados nas escolas públicas, recebe 75 euros por hora da Comunidade Europeia (um curso CEF, por exemplo, corresponde a seis horas e meia de actividades lectivas por dia), põe os professores da escola a leccionarem esses cursos, no quadro das suas obrigações correntes e pagos segundo o seu índice de vencimento, e preenche as faltas com professores contratados que geralmente nunca são colocados no início do ano, portanto poupa em remunerações mensais, em subsídios de férias e de Natal, e reencaminha esse dinheiro não para as escolas profissionais que existiam, mas para os cofres do Estado. 1-0


Tratou de descompensar a carreira dos professores criando as pressões necessárias para que muitos se reformem compulsivamente ou deixem de leccionar.
Trouxe para a escola, com a promessa de simplificar a educação, muitos alunos que a tinham abandonado e que vêm agora uma boa oportunidade de possuírem o certificado. Muitos com a ideia de merecido reforço, a maior parte à conquista de um papel segundo a lei do menor esforço.
Não deixa as escolas contratarem auxiliares de educação, havendo escolas a funcionarem muito abaixo do número mínimo de contínuos, com o desnorte total no que às tarefas de vigilância, limpeza, manutenção e fiscalização da escola diz respeito.
Inventou a escola tecnológica para consumo da imprensa mas deixa que as escolas funcionem sem quadros em condições de qualquer espécie (e estou a falar de escolas no centro de Lisboa), e a maior parte do ano lectivo com poucos ou sem computadores para consulta/trabalho geral.
Impôs um novo estatuto do aluno que na prática é mais um momento de avaliação que não poderá ser contabilizado na sua nota final, mas que servirá para limpar o cadastro de faltas do aluno, no caso de ele obter nota positiva. Introduziu esta nota de permissividade às faltas mas impondo um elemento mais de confusão acrescido (não falo de trabalho mas de confusão) ao sistema de ensino.
Está a propor um novo sistema de avaliação que na prática continua a ser um instrumento de desestabilização individual e de criação de obstáculos na progressão da carreira, cuja funcionalidade está longe de servir para algo mais senão para paralisar o professor na sua função administrativa e torná-lo um manga-de-alpaca, um assistente social, um psicólogo, um gestor, um vigilante, enfim...

Se estivesse preocupada com os alunos e com a qualidade de ensino tinha privilegiado a avaliação científica e a realização de exames nacionais, com objectivos de realização por escola).


Fechou escolas e conseguiu convencer a opinião pública que isso era feito em nome da qualidade de ensino que se queria promover (ninguém se preocupou em saber as condições que as escolas de recepção tinham ou não para oferecer), o que interessou foi a medida de contenção de custos imediatos. As preocupações com a socialização escolar e o meio passaram para o domínio da fantasia teórica.

Pode-se agradecer tudo isto à Ministra. Ela realmente é uma funcionária exemplar num tipo de governo que utiliza todos os meios para atingir os seus fins que, desde o primeiro discurso, foram bem claros: redução do défice.

Só que depois não me venham dizer que nada disto é feito pelo dinheiro, em nome do dinheiro e para o dinheiro. Não é um crime. Mas digam-no, e não evoquem razões falsas como a preocupação com o ensino em Portugal.

Qualquer pessoa que seja ou tivesse sido professor sabe bem que o menosprezo social pelo papel social do professor o desautoriza dentro da sala de aula. Não do papel individual de cada um dentro do espaço de aula, porque isso depende da autoridade de cada um e da forma, as vezes no limite da força ética, como se souber impor, mas do que isso revelar de dentro da sociedade e depois para a sociedade, como froma de viver colectiva.

Se quiserem desautorizar os professores pensem bem nas consequências sociais dos seus actos , e que a sociedade continue a preparar-se para em tudo ser diferente.

Desacredite-se a autoridade e deixemo-nos vaguear de simulacro em simulacro de coesão social, até ao desejo final de uma força autoritária que se imponha como a única ordem.
Destrua-se paulatinamente os valores de uma sociedade democrática, como os da participação colectiva na resolução dos problemas comuns, e vejamos as almas a suspirarem por um regime punitivo, centralizador.
Preocupem-se só com o dinheiro na educação e esqueçam os valores a serem socializados. Assim como assim, haverá sempre princípios nos quais nos podemos exilar e pessoas com quem podemos argumentar. Talvez amanhã.

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