Lector (http://vestigialectionis.blogspot.com/e http://noinstante.blogspot.com/) instigou-me a desenvolver o tema da intervenção pessoal nos acontecimentos do mundo. A minha reflexão, durante grande parte da minha vida, tem a ver precisamente com a tentativa de compreender o “porquê” de agirmos de certa forma, o porquê das nossas escolhas. Fora do enquadramento neuro-psicológico, que não é o meu, o que tenho apurado leva-me a concluir que somos levados a agir na vida pública enquadrados ou por ideologias ou por instituições.
Há todo um espaço privado de cada existência consigo mesma de que desconheço, em absoluto, as motivações, o sentido mesmo, mas no domínio da acção pública, chego à conclusão que existem os criadores/produtores de ideologias ou organizadores de instituições que integram a acção individual coordenando-a, regulando-a de forma continuada ao longo dos séculos. Este aparente relativismo, e esta aparente interpretação marxista da formação das relações sócias, atenua-se quando se sabe que eu considero que existem umas formas mais valorizadas de acção social do que outras e que o critério que me permite fazer a distinção não assenta na autoridade do que disse algum “herói” ou do que fez algum “revolucionário”, esta distinção não se restringe à valorização do enunciado assente na sublimação da pessoa que o enunciou, mas depende sempre de um último teste que passa pela recusa ou aceitação dos interessados nessas teses, em circunstâncias de discussão que se querem equitativas, livres e com valor de decisão. Não há no meu pensamento a concepção de que temos uma solução/teoria definitiva e absoluta (geralmente aquela em que se crê) para os problemas de ordem prática.
Em confronto com a ordem da realidade há todo um conjunto de seres que ou a ela se submetem, ou a interrogam, ou a interpretam, ou a reproduzem ou a tentam modificar. Considero que as ideologias dominantes, e por ideologia entendo a produção de sistemas interpretativos da realidade, ligados à produção de conhecimento, são determinantes para compreendermos muitas vezes qual o nosso papel na acção colectiva geral.
Se instada a participar, a colaborar com as redes criadas internacionalmente para combater a pobreza, fá-lo-ei de forma tanto mais empenhada quanto maior conhecimento tiver das razões morais, éticas ou religiosas (depois cada um buscará os seus fundamentos nas instituições consolidadas de acordo com os preceitos da igreja, dos sentimentos ou da razão, nas suas múltiplas manifestações) que condicionam as reflexões do presente. É por isso que a nossa acção individual contra a pobreza, encontra, no presente, um grupo de instituições internacionais que podem de forma pragmática responder aos nossos anseios de participação na luta contra a miséria, aceitando-nos como voluntários. Não será uma participação orientada para a procura da eliminação das causas de miséria que dependem, muitas das vezes infelizmente, muito mais da vontade política dos Estados tomarem medidas adequadas na eliminação da pobreza, mas será sem dúvida uma tomada de posição e uma ajuda concreta a pessoas necessitadas.
Em termos gerais, há que ter em conta que uma chamada de participação dos cidadãos na vida política poderia ter efeitos perniciosos na ordem social constituída. Efeito paradoxal que tendemos a ignorar mas a que Michael Roskin , por exemplo, chama a atenção em Political Science an Introduction (http://www.powells.com/biblio?show=TRADE%20PAPER:USED:0130991341:32.00#table_of_contents).
As nossas tomadas de posição políticas, se extensivas a todos os cidadão, parece que podem conduzir mais ao colapso do sistema por excesso pontual e concentrado de participação (como nas revoluções, por exemplo) do que a um desenvolvimento continuado de maior preocupação com a vida pública como factor de desenvolvimento harmoniosos do sistema democrático. Não sei se será assim, mas parece-me que o conhecimento das razões que nos levam a agir, que julgo fundamental para esclarecer a nossas história de participantes na comunidade, não implica necessariamente que cada um se dedique depois a averiguar minuciosamente o que faz o poder com essas razões, podendo cada um seguir livremente o seu caminho, inclusive o que o leva a assumir não ter vontade de participar.
De uma forma resumida: há profissionais que na área da saúde, da assistência social, do apoio psicológico e técnico, têm os conhecimentos relativos à logística, aos meios e objectivos necessários à resolução dos problemas como o da fome, por exemplo. As soluções estão estudadas e, sabe-se hoje, com contas feitas, que a miséria não é um estado imutável da natureza social do ser humano. Terão que ser essas pessoas que estão no terreno (e não políticos em gabinetes a milhares de Quilómetros de distância) a decidir como, quanto e para onde vai o dinheiro. A cada um de nós caberá pôr-se à sua disposição na medida das nossas competências e vontade, e de forçar os nossos governos a financiá-los.
Demasiado simplista? Sem dúvida. É por isso que há uma comunidade de discussão. Discussão que pára quando se começa a discutir o valor da vida de cada ser humano. Não devia haver derrogação possível a este valor ou devia?
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