quinta-feira, julho 20, 2006

Portugal e a ONU

Em Dezembro de 1948 os membros do Movimento de Unidade Nacional Antifascista (MUNAF) distribuíram às delegações reunidas em assembleia nas Nações Unidas, em Paris, um documento de vinte páginas intitulado “Portugal e as Nações Unidas”. O documento acusava o governo português de cercear as liberdades públicas e de não garantir as condições políticas para estabelecer um sistema de sufrágio universal, pelo qual se acabasse no usufruto de um regime democrático, terminando com um pedido para que a Assembleia Geral votasse contra esse pedido de adesão.

No dia 8 de Dezembro, Portugal fica a saber que a antiga União Soviética e os países de Leste, que constituíam o bloco eslavo, votam, mais uma vez, contra a admissão de Portugal à ONU. A imprensa dá destaque à informação. Algumas notícias descrevem esse acto como consistindo numa clara traição à pátria por parte dos seus signatários, ao mesmo tempo que criticam o peso político da União Soviética que com o seu veto determina muitas das opções políticas internacionais adoptadas.

Pensamos que os democratas ganharam. Errado. Eles diziam no documento “que os democratas portugueses se esforçam por criar em Portugal, as condições indispensáveis para que possa ser admitido na ONU” (“o Século”, 10 de Dezembro de 1948), mas, antes dos democratas poderem criar essas condições, é Portugal aceite na ONUem 1955.

As Nações Unidas não tiveram visivelmente nenhuma vontade de interferir no rumo da política governamental portuguesa antes dos anos sessenta, princípios de setenta, pois só então se acentuam as críticas à presença portuguesa em África, dizendo-a um factor de perturbação da paz no Continente. E começam as pressões, com ciclos de maior ou menor intensidade crítica consoante o interesse das potências sobre Portugal e as suas colónias. Os EUA abstiveram-se de tomar posições contra ou a favor dessas resoluções pelas quais a Assembleia condenava o nosso colonialismo. No entanto Portugal resistiu até 1974. Falta de interesse efectivo das potências em alterarem o mapa geo-político da África Austral por temerem a nova ordem? Ou condescendência para com um governo que manifestava oposição efectiva à ideologia comunista, ficando ao lado de nações democráticas?

Porém, esse aparente cinismo da Organização manifesto pela prática dos seus membros, que agem na promoção dos interesses da sua nação mesmo se é preciso apoiar estados não democráticos, embate contra os pressupostos teóricos que a estruturam (a Carta das Nações Unidas, por um lado, e a Declaração dos Direitos do Homem, por outro lado). É entre o que é possível e o que é desejável, é na procura de adequar a prática à teoria, que as relações entre povos tem vindo a evoluir desde 1945. Como muitos sobressaltos pelo caminho.

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