segunda-feira, julho 10, 2006

Propaganda e imprensa desportiva

“A censura parece ser tanto mais rigorosa quanto mais lido for o órgão de informação em questão, sendo, porém, esta regra afastada no caso – de resto pouco frequente – de publicações que assumem normalmente posições pró-governamentais. O rigor da censura é assim consideravelmente maior nos jornais desportivos – lidos por camadas populacionais geralmente pouco motivadas – do que por exemplo, no Expresso.”, p. 65.


Isto é-nos dito por A. Arons de Carvalho no seu livro A censura e as leis da imprensa, publicado em Lisboa pela Seara Nova em 1973 , livro que resulta de uma adaptação de um outro livro Da liberdade de Imprensa que escrevera em 1971 juntamente com A. Monteiro Cardoso.

Os jornais desportivos eram os mais lidos, logo os que mais possibilidades tinham de influenciar alguém na adopção das suas atitudes em sociedade. Percebiam os serviços de informação, controlados directamente por Salazar, a importância do desporto como motor de orientação de comportamentos, daí a censura.
Ora nos dias de hoje, em que felizmente a imprensa é livre, qualquer professor de Comunicação Política poderia dar uma lição sobre propaganda a partir da análise da imprensa desportiva deste mundial, sobretudo o que na imprensa francesa e inglesa se escreveu, e uma aula de como fazer contra propaganda, analisando a imprensa portuguesa quer no dia do jogo de Portugal com a Alemanha quer no dia seguinte.
Propaganda para enfraquecer a moral dos adversários do jogo e dos seus apoiantes (usada pelos franceses contra os portugueses), e contra propaganda para reforçar o apoio dos adeptos à equipa portuguesa e consequente fortalecimento da sua força anímica.
Um serviço de informação militar em cenário de conflito bélico não faria melhor.

A análise deveria incidir sobre a quantidade de termos depreciativos, e mesmo ignominiosos, utilizados para descrever o carácter dos jogadores e da sua prática desportiva utilizados pela imprensa francesa, por exemplo, para descrever o adversário em campo, termos usados para retirar ao adversário a possibilidade de ser visto como alguém passível de se vir a estabelecer empatia, logo ser entendido como um semelhante, de molde a favorecer um ambiente agressivo, visando a prostração e consequente desistência do confronto por parte do adversário (por alguma razão os portugueses em França se sentiram inibidos de aplaudirem publicamente a selecção portuguesa).
Como contra propaganda temos como exemplo a capacidade da imprensa portuguesa, em tudo mais comedida em relação aos termos utilizados para descrever as equipas adversárias do que a sua congénere francesa, de transformar um quarto lugar obtido num campeonato do mundo, num paradigma absoluto de qualidade e sinal de mérito a dever ser alcançado pelas outras actividades em Portugal, num absoluto exagero comunicativo de imposição, junto da opinião pública, de demonstração das qualidades dos jogadores (que aliás a FIFA homenageou considerando-os responsáveis pelo melhor jogo em campo).
Há mesmo uma jornalista que, à chegada da selecção ao aeroporto, afirma algo parecido com: “Nem com um primeiro lugar teriam mais gente do que têm aqui!”. É paixão, é um exagero, mas é simpático.
Quanto à objectividade...? Segue dentro de segundos.

1 comentário:

João Carlos Correia disse...

A normalidade da situação descrita é quase redundante. Meu deus, o Futebol é uma das poucas paixões permitidas. As descrições da zidanosa cabeçada não são de molde a entusiasmar os crentes na objectividade. Apesar de tudo, os italianos, nalguns jornais generalistas, quase não foram facciosos.