domingo, dezembro 23, 2007

E porque estamos tão próximos do Natal

"A.B.- Confundir Deus com poder é fundamentalismo. É preciso derrubar todos os ídolos para, no fim, ficar o encontro com Deus, Mistério Infinito, na mística.
Mário Robalo: - O místico não é aquele que foge do mundo?
A. B. - Pelo contrário. Aliás, é muito interessante observar que Jesus não olhou em primeiro lugar para os pecados mas para os sofrimentos das mulheres e dos homens, e fez tudo para os aliviar. A mística tem de traduzir-se em compaixão pelos seres humanos. Particularmente pelos que sofrem. No futuro, ou há uma experiência mística autêntica ou as religiões degeneram."
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Padre Anselmo Borges em entrevista ao Expresso de 22 de Dezembro.
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Um dia confundi Deus com poder e perdi-o por esse cosmos fora. Tenho eu a pretensão de dizer. Errado, dir-me-ia Rilke, se Rilke pensasse que a carta que escreveu ao poeta Kappus também poderia ser lida por mim. Errado está aquele que pensa que perdeu Deus, porque se o perdeu é porque na realidade nunca o encontrou: "(...) pergunte a si próprio, meu caro senhor, se realmente O perdeu ou se não será mais verdadeiro pensar que nunca O possuiu."* Seja. Aceito sem retorquir que assim tivesse sido. Não perdi o que nunca tive. Está bem, mas daí nem consolo nem desconsolo obtenho. Não há palavras que possam repor essa ideia perdida, mesmo se imaginada. Nem a comoção pela pessoa de Cristo nem o respeito pela esfera do sagrado, que na realidade me inquieta mais do que sossega, nada faz laçar esse laço deslaçado.
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E no entanto é quase Natal, podemos pois esquecer essa entrevista de um candidato a primeiro-ministro nas mesmas páginas de um jornal onde são publicadas as sete conclusões do "livro branco" sobre o emprego. Conclusões que põem em causa muitas das ideias feitas dos políticos que mastigam teorias estrangeiras para formatar a realidade portuguesa aos seus interesses, e que põem em causa muitos dos objectivos afirmados daquele que quer ser o futuro governante de Portugal e que tem sobretudo duas ideias: desmantelar o Estado e investir-se no estilo de actor político da nova coqueluche europeia no imaginário dos políticos machos que é o Sr. Sarkozy. Como princípios orientadores de oposição ao governo de Sócrates estamos conversados.
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* Rainer Maria Rilke, Cartas a um Poeta, trad. Fernanda de Castro, Lisboa, Portugália Editora, 1971, "carta VI", p. 63.
E eu que comecei este texto com palavras tão nobres, foi logo o pensamento escapulir-se por esquinas e travessas...

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