sexta-feira, dezembro 21, 2007

"o regresso da barbárie" 2

O livro de Delpech combina uma boa e fluida reflexão sobre os acontecimentos de política internacional passados com uma hipótese controversa para descrever o futuro imaginado. A autora delimita um conjunto temporal cuja representação se compreende entre os marcos cronológicos de 1905 e 2025.
..
O ano de 1905 escolheu-o a pensadora por ser um ano que ela define como uma data de "ponto de viragem das ideias" (p.109), pois foi nesse ano que em física, em psicologia, na arte e na política as novas formas de pensar e de criar do século XX terão começado. Einstein na física, Freud na psicologia e os "Fauves" e futuristas na arte , abalam os modelos tradicionais de entender o comportamento dos corpos, das mentes e da acção artística. Todo um novo comportamento individual e social, e uma nova compreensão para esse comportamento, estava a evoluir, o que fazia esperar que qualquer coisa de novo acontecesse. Mas esse comportamento novo tinha que originar uma ordem violentamente agressiva e destrutiva, tal como se veio a provar que o era?
..
Delpech afirma que qualquer observador perspicaz em 1905 podia prever o desmoronamento do império russo, a ascensão do militarismo japonês, uma guerra entre a Alemanha e a França por paixões nacionalistas e o papel ascendente de intervenção da América nos destinos mundiais, como começava a acontecer com a intervenção dos EUA como mediador entre a Rússia e o Japão, e como Tocqueville já o dera a entender que assim seria (p.104).
..
E qualquer observador perspicaz poderia compreender que se estava a preparar então um século de terror e destruição, no seguimento da interiorização e gosto por ideias de morte e de conflito, uma época que febrilmente dá a precedência à força das armas sobre a força do direito na resolução de conflitos (p.99), e que cria uma habituação e potencia uma insensibilidade psicológica à morte e à violência que os conflitos e as guerras sucessivas irão potenciar. É curioso que a autora ressalve apenas a imprevisão do aparecimento de Hitler (p.115). Como se este não coubesse em nenhuma história do mal, mesmo imaginada. O absoluto homem novo do mal. Hei-de voltar a esta ideia.
..
Se os acontecimentos do passado estão bem pensados, pois Delpech traça a história intelectual do início do século para se compreender as razões que levaram à acção política e social que da divulgação das ideias se faz realidade, já a sua predição para o futuro, mesmo que partindo de uma arguta análise dos acontecimentos do presente, é mais polémica. Não que ela se engane no método adoptado, a saber: inventariar as ideias e os valores que circulam, que têm mais poder e que estão a ganhar terreno (p.85). É isso mesmo que terá que se fazer se quisermos falar sobre o futuro, porque, como ela diz "A humanidade, tal como os indivíduos, é sempre confrontada com escolhas e todos os seus actos têm consequências" (p.131). Mas é questionável que ela tenha encontrado em 2o25 a marca de água que exemplifica o zénite de uma cadeia causal de acontecimentos.
..
Porém, Delpech defende-se dizendo que nos é permitido imaginar o futuro porque a maior parte do tempo seguimos na direcção dos nossos pensamentos. E sobre esta ideia, e sobre o tipo de pensamentos que estamos a seguir na contemporaneidade, que no próximo post se escreverá.

Sem comentários: