sábado, fevereiro 09, 2008

Três presidentes prováveis

De todas as pessoas que leio ou ouço nos meios de comunicação que comentam as eleições americanas em Portugal, a única a quem dou total assentimento aos seus argumentos e concordância total com a perspectiva de análise é a José Cutileiro. Reparo no artigo deste sábado no Expresso “Terça-feira gorda nos Estados Unidos” e deixo-me cativar por uma escrita que destaca o fenómeno da participação elevada dos americanos nestas primárias (lá se vai a teoria política sobre o fenómeno de despolitização crescente das pessoas nas sociedades contemporâneas e a sua consequência num sempre crescente número de abstenções) e fala da Hillary Clinton como a senadora de Nova Iorque, e de Barack Obama como senador do Illinois e de John MacCain o senador do Arizona. Fala do candidato republicano e dos candidatos democráticos, não fala da mulher ou do negro ou do herói do Vietnam. Fala de senadores, de pessoas políticas com projectos para a América, fala e bem dessa sociedade que durante anos, e porque os Media lhe pediram, se entregou nas mãos de um líder e de um pensamento político que levou os Estados Unidos, e o mundo por arrasto, para mais uma encruzilhada ideológica perigosa imbuídos da crença que essa era a melhor estratégia para a nação e que agora, de forma empenhada, parece querer demonstrar com o número da sua participação nas eleições a bater recordes, que está atenta, que quer decidir e que quer escolher, porque despertou do torpor idiota que os terá adormecido embalados pela ideia de “quem não está por mim, está contra mim”.

A sociedade americana não está a escolher o negro ou a mulher ou o herói, está a escolher políticos, senadores com obra feita, está a seleccionar ideias, está a dizer o que prefere numa pessoa para o cargo de presidente. Não é o sexo ou a cor, ou por si um passado militarmente glorioso que são eleitos. Isto parece-me uma análise da sociedade do século passado, do tipo: “Olhem, incrível, um negro, ou uma mulher a poderem ocupar um cargo da natureza a que se encontram a concorrer!” É retirar à pessoa o que ela ganhou com as conquistas ideológicas promovidas e divulgadas pelas declarações dos direitos do homem. Não há que reparar no que é óbvio. São aquelas pessoas, com a experiência que acumularam, com o carisma que possuem, com o dinheiro que conseguiram angariar para as suas campanhas, com os apoios que conseguem obter, com as ideias que defendem e o comportamento que manifestarem, que vão ganhar. Não me parece que seja por serem ou mulheres ou negros ou só homens brancos a disputarem as eleições o que leva as pessoas às urnas numa américa do século XXI, mas sim o que essas pessoas têm a oferecer de diferente, ou a propor na governação do país, por serem candidatos credíveis numa América que tinha muitos candidatos por onde escolher.
Ali não há imposições dinásticas ou golpes de Estado, não há candidaturas únicas ou auto consagração. Existem propostas diferentes com pessoas diferentes. É por isso que se compreende que a mais mediática das mulheres americanas, Oprah, venha dizer que escolheu apoiar Obama por concordar com as suas ideias mais do que com as de Clinton, e isso sem a impedir de continuar a ter um papel fundamental na promoção dos direitos da mulher e de contribuir no mundo para impulsionar a conquista dos lugares de poder pelas mulheres. Mas impulsionar candidaturas de mulheres não equivale a assumir que só por ser mulher se deva deixa de poder estar em desacordo com o que ela diz ou faz. Dizer que as mulheres devem candidatar-se em número correspondente ao seu lugar na sociedade, e incentivar a que esse fenómeno se generalize, não é idêntico a garantir um lugar de poder só por ser mulher. O mesmo para a cor. Isso seria repetir o mesmo padrão de selecção dos últimos séculos e que em muitas sociedades continua a ser uma realidade: é homem, é branco e tem dinheiro? Então manda porque pode.




Paul Haggis, li no jornal Público de ontem, está a levantar com o seu filme “No Vale de Elah” (que ainda não vi) uma questão fundamental para o futuro dos americanos: o que pensam vocês que vai acontecer com os soldados que estão a vir do Iraque? Esta questão vai mais longe do que a mera constatação de uma realidade como é a de que esses soldados não estão a ser devidamente acompanhados pelo Exército no seu regresso. Isto é mau. Mas pior parece-me ser o que daqui possa advir no que a uma ordem interna dos Estado Unidos diz respeito. Dir-me-ão que as sociedades têm uma grande capacidade de resistência e de integração das pessoas. Que os soldados e as suas histórias serão devidamente escalpelizados pela indústria cinematográfica o que dará à imensa maioria um meio de sublimar a sua dor. Talvez haja uma pequena minoria a soçobrar, e que sendo lamentável não será inibidor da estrutura social tal como ela se conhece, mas eu duvido que estes milhares de soldados a chegarem, e tendo os meios de comunicação digitais ao seu dispor como nenhum outro soldado da história o teve, não tragam consigo uma mudança social, nos modelos sociais e no tipo de projectos políticos futuros. Infelizmente não sei prever em que direcção essa acção ou pensamento se encaminhará. Sou péssima a fazer previsões. Não sei se daqui sairá um maior reforço à Carta das Nações Unidas ou um outro documento internacional sobre conflitos, ou se, pelo contrário, se procurará fechar mais o país sobre si próprio e os seus problemas internos, suspendendo, ou invertendo as políticas externas mais agressivas. Seja como for, e como Cutileiro o destaca, o que se pode dizer é que, por agora, “os projectos de qualquer dos três presidentes prováveis em Janeiro de 2009 acabarão com os lados mais ofensivos, iníquos e ruinosos da política da administração actual e as relações dos Estados unidos com a Europa Melhorarão”.
Espero que a prática confirme esta hipótese.

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