terça-feira, março 04, 2008

A escola pública não começou no século XIX, porque já existia mundo antes da América se inventar.

Ouça-se o que dizem estes dois ensaístas sobre a educação pública, no vídeo que há dois dias é disponibilizado online pela página do Sapo.


O argumento é o seguinte: a escola pública foi criada nos Estados Unidos pelos homens de negócio do século XIX, os mais ricos, que precisavam de mão-de-obra para as suas fábricas, e não a tinham em número suficiente de um tipo que fosse especializada em manter-se durante um longo período de tempo a cumprir tarefas de repetição, em linhas de montagem, ou que interiorizasse regras de comportamento como a pontualidade, a obediência no cumprimento de horários por turnos ou a sujeição à autoridade de uma figura dominante: patrão/professor.
Hoje em dia, alterado o tipo de economia, numa era pós-industrial, o que é preciso é oferecer ao sistema económico um outro tipo de educação mais criativa e que ensine os alunos a pensar. Mas dito isto porque é que o sistema não muda? Bem, dizem Alvin e Heidi Toffler, porque existem milhões de trabalhadores nas escolas que resistem a esta mudança. Os professores, por exemplo, têm medo de perder o emprego e não permitem a mudança do desastroso sistema. Mas eles até não desgostam dos professores... Alvin gosta da sua irmã, e ela é professora! (Ena! Belo argumento!)
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Contra-argumento: Nem enveredo pela discussão do último argumento que se prende com a afirmação de "isto não significa que os professores sejam maus" porque não merece comentário. Começo antes por perguntar o seguinte: então se é a economia a exigir um novo sistema de ensino, e que pressiona a criar a escola segundo os benefícios que dessa acção possa retirar para a produção de uma maior riqueza através da empregabilidade de uma mão-de-obra especializada nas novas exigências dos negócios, porque não o faz novamente, a partir do zero, na medida em que já criou um sistema anterior que satisfazia os seus interesses, e tem um poder imenso na pressão sobre as políticas de qualquer parte do mundo? Ou criando escolas privadas que sirvam a sociedade de forma estruturalmente diferente das comuns?
Por outro lado, nos Estados Unidos, de onde vêm estes ensaístas, o ensino público é maioritariamente de gestão privada e continua a ser um desastre nas estatísticas relacionadas com a literacia. Serão assim tão competentes a formar o futuro, ou são os critérios das estatísticas que têm de mudar para responderem a uma nova sociedade com um novo tipo de valores/objectivos económicos?


E será que a responsabilidade é dos professores na inércia do sistema, ou é dos políticos que são quem realmente governam a educação? Qual é o poder do professor na orientação das políticas de educação do mundo? Haverá sistemas que tenderão a ouvi-lo, mas hoje em dia todos parecem saber na sociedade qual deve ser a atitude, os conteúdos e os competências que cada professor deve ensinar aos seus alunos, excepto o professor ele mesmo, o qual, por mero acaso, até se especializou de forma continuada e com uma exigência na prestação de provas constante para exercer a sua profissão. Mas quando este deixou de saber como fazer na sala de aula , dizem, parece, surpreendentemente, que continua a ter o poder de não deixar mudar o sistema no ministério da educação, de saber como impedir as reformas. Esta conclusão é deveras surpreendente!


Por outro lado, teremos que aceitar a interpretação economicista da origem do ensino público sobre a perspectiva sociológica? Porque razão se esquecem da transmissão de valores sociais e políticos que os homens americanos do século XIX também quiseram potenciar?
E mais, porque se esquecem estes ensaístas da existência de sistemas de ensino público desde a antiguidade, passando pela Idade Média até a idade moderna?

A igreja católica, primeiro, e a protestante mais tarde, podiam ensinar-lhes alguma coisa de sistemas públicos de educação e, já agora, da escola como meio de transmissão de valores que não só os do saber fazer/saber comportar-se. E é aqui que todos temos que saber quais preferimos, ou os quais devemos adoptar para uma sociedade livre e justa.

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