quarta-feira, maio 28, 2008

Só hoje li o suplemento de economia do Expresso. Retirei logo de manhã, para benefício dos meus alunos, o artigo sobre as piores crises em Portugal, para lhes contextualizar o tom arrastado dos discursos contínuos da crise que não esta pela qual estamos a passar, e porque os sinto seduzidos por uma argumentação catastrófica. Convencida que estou que é sobretudo com a circulação de informação e pela posse de conhecimento que poderemos alterar crenças e atitudes.
Mas depois passei ao artigo de Nicolau Santos e fiquei mentalmente emparedada com esta conclusão: "Ou seja, acabou a comida barata, a energia barata, os combustíveis baratos ou a água barata. Por outras palavras: bens democráticos, a que a generalidade dos cidadãos tinha acesso, como a água, pão, electricidade, gasolina ou gasóleo estão a tornar-se bens de luxo ou quase, a que cada vez terão mais dificuldade de acesso as classes médias e de menores rendimentos.

As razões são várias, mas a mais decisiva é que a subida vertiginosa dos preços do petróleo e a ascensão de milhões de cidadãos dos países emergentes a níveis de vida que nunca tiveram antes está a produzir uma enorme transferência planetária de riqueza, estimada anualmente em três biliões de dólares, da Europa e Estados Unidos para a Ásia, África e América Latina.

As consequências também serão várias - e todas elas potencialmente explosivas, porque a fome, a sede e a miséria não são boas conselheiras. A primeira é que a possibilidade de violentas convulsões sociais, com impactos fortíssimos a nível político e mesmo riscos para os sistemas democráticos é fortíssima. A segunda é que, à luz da História, situações destas acabam por resolver-se através de conflitos bélicos mundiais, que dizimam milhões de pessoas e reequilibram as condições de vida no planeta. 210 anos depois, Thomas Malthus volta a estar na moda." in Expresso, p. 5.
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Nem o excelente, uma vez mais, artigo de Baptista-Bastos "O hediondo sorriso" no DN, nem o apelativo artigo de Rui Tavares, "o ano da desigualdade" no Público, conseguiram fazer-me recuperar do torpor. Torpor este que se sentiu coadjuvado por notícias como as que dão conta de abusos de crianças por forças dos capacetes azuis. Isto é o que dá os países ocidentais falarem de direitos humanos e de protecção mas depois não corresponderem com os seus próprios militares, deixam a porta a aberta para que países sem respeito por direitos civis e políticos enviem em massa os seus exércitos a troco de dólares, deixando a organização nas suas mãos.
E depois, eu que até me tinha rido com a boa ironia do artigo "Só ares" de João Paulo Guerra no Diário Económico, fiquei sem conseguir pensar: é que a teoria da necessidade de morte de milhões de pessoas para reequilibrar os sistemas sociais não é uma teoria só hedionda, é defendida por muitos e poderosos governantes que se definem como realistas. É transformar o horrível em facto natural da vida em sociedade. Espero que não seja nenhuma profecia auto-realizável; que este discurso não venha preparar-nos mentalmente para aceitarmos acções que conduzam a tal desfecho na história.

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