terça-feira, março 31, 2009

Há mais ameaças neste país do que estrelas sob a nossa cabeça

"(...)Ao ameaçar com processos disciplinares magistrados e demais indivíduos, Pinto Monteiro cai numa trovoada pouco respeitosa. O caminho por que enveredou não é o melhor trilho. Até porque o que a Procuradoria-Geral da República devia esclarecer de vez, em respeito ao estado de direito e aos contribuintes, seriam as razões porque o processo Freeport esteve em banho-maria este tempo todo. E sobre isso não há nenhum tipo de comércio intelectual. Os cidadãos têm todo o direito a saber para onde vão os seus impostos e ao mesmo tempo avaliar o estado da justiça em Portugal. É essa satisfação que Pinto Monteiro não pode declinar. De todo!", in Almocreve das Petas

A mentira repetida há-de dobrar a verdade?

Como era, naquele filme alemão, em que o governo da República Democrática não permitia que se escrevesse sobre o número de suicídios no deslumbrante "paraíso na terra" que era aquele, a ex RDA?

segunda-feira, março 30, 2009

A aventura no Vale de Enid Blyton. É uma das histórias de Blyton que recordo melhor. Tudo me impressionou então, as comidas em lata (!), a catatua Didi (na minha escola primária havia uma catatua), a gruta atrás de uma queda de água (um clássico juvenil e de filmes de matiné), as grutas com as suas estalactites e estalagmites (associada à minha imagem da gruta de Santo António, hoje em dia uma sombra da importância turística que já teve, quase abandonada, e no entanto ainda tão fascinante), as perseguições (a oposição clara entre adultos malvados e crianças espertas, autónomas e competentes: uma parábola possível para um ideal do estado de infância), e, sobretudo, a existência de um tesouro roubado que era preciso encontrar e proteger. A aventura, enfim.
É o livro que estou agora a ler ao meu filho. E das páginas amarelas com a capa a descolar-se (o livro já pertencera a outra criança antes de mim, e ela escrevera-lhe na contracapa ser ele pertença do "clube da arma secreta". A minha mãe tinha-mo comprado numa loja de livros usados que se vendiam num átrio ali para os lados do Saldanha, expostos no chão. Pelo menos é assim que me lembro), dessas páginas chega-me inteirinha uma ideia certa de mim no mundo, que agora seduz o meu filho e o recoloca no mundo da aventura, o mundo verdadeiro para qualquer criança habitar.
Passa-se por certos comportamentos datados (não me tinha apercebido então que, das quatro crianças, era às meninas que cabia preparar os piqueniques e as camas, e aos meninos era esperado que fizessem as acções que exigissem mais força física ou destreza manual!). Uma pena, mas Blyton não fugiu totalmente ao estereótipo. Salve-se o facto de ela não fazer distinções ao nível das soluções encontradas e da resolução de enigmas, na inteligência entre rapazes e raparigas.
O resto é toda uma linguagem certa e rigorosa para transportar para a história, sempre bem contada, simples, com capítulos curtos e fazer crescer o suspense.

Penso na linguagem e nos mundos que essa linguagem abre. Não conheço bons alunos que não sejam bons na posse de uma linguagem. Os vigaristas também. Possuir uma linguagem, torná-la aceitável e impô-la como modelo, é uma forma de fazer mundos.
Em cada género de expressão oral e escrita abre-se a existência real a uma existência possível, se verosímil for a ideia potenciada pela linguagem, se apresentar o desconhecido a partir de um anseio conhecido. A criança não quer, e ao mesmo tempo quer, perder-se num vale e afastar-se temporariamente do conhecido e do familiar. O adulto não quer e ao mesmo tempo quer acreditar que o discurso em política o possa fazer acreditar que dele se espera uma aventura: a do respeito pelo indivíduo no espaço dos direitos e dos deveres sociais.

Esperam ouvir isso de quem? Ou só esperam fórmulas de ganhar um dinheirinho extra com a credulidade alheia para prosseguirem com os seus projectos de projectos políticos?

Também se pode pensar nos cidadãos a serem perseguidos por políticos escroques enquanto procuram o tesouro da repartição do poder em democracia. Uma trágico-comédia.

Ah jornalista!

Perguntas, Mário Crespo. In JN

sábado, março 28, 2009

E?

Cenário nº 1. Primeiro-ministro Sócrates é inocente. Está ofendido na sua honra. Processa um canal de televisão por este mostrar que existem testemunhos que o dão como envolvido num crime de corrupção. Noto: passa-se a processar um meio de comunicação por aquilo que ele mostra? Ou pelo conteúdo daquilo que ele mostra? Mas os meios de comunicação não podem mostrar material do foro do conteúdo de informação? Então Sócrates, o inocente, não estará a insistir num precedente grave em democracia, insurgindo-se (uma vez mais) contra o mensageiro e não contra o autor da mensagem? Sócrates, o inocente, terá que levar quem ele considera que o injuria a tribunal. Ou será que a injúria vem da divulgação da comunicação e não da comunicação em si divulgada?

Cenário nº 2. Primeiro-ministro Sócrates é culpado. Está ofendido na ideia de intangibilidade que faz de si. Processa um canal de televisão por este mostrar que existem testemunhos que o dão como envolvido num crime de corrupção. Para quê? Para alimentar a ideia de "campanha negra" dando nome de forma definitiva a um adversário, a TVI, no caso? Para desviar a atenção do conteúdo da notícia para a punição da forma (e da ousadia) na forma como esse conteúdo foi divulgado? Para dar sinais a outros mensageiros que ainda tem sob controlo grande parte da forma como se deve apresentar a informação?

Cenário nº 3. Sócrates está inocente. Ataca mensageiro em momento de desnorte. Mas reconsidera e decide deixar a justiça funcionar apresentando provas que ajudem a mostrar a sua verdade. Os portugueses (mesmo os que o desconsideram) suspiram de alívio por não terem afinal de contas um primeiro-ministro corrupto, coisa de filme rasca da máfia, e deixam-no ir a votos com a honra limpa, e votando ou não votando nele pela sua acção governativa.

cenário nº 4. Sócrates é culpado. Ataca o mensageiro por estratégia e por hábito bem sucedido na sua governação de pressão sobre os grupos, pessoas ou instituições que não partilham com ele da sua visão do mundo e de si. Continua bem sucedido e chega às eleições aureolado de vítima de ataques à honra (sempre indignos quando o são) e vai-se votar num primeiro-ministro sob suspeita.

Conclusão: no cenário 1,2 e 4, Portugal perderá sempre. No cenário 3, perde a política portuguesa, porque assim qualquer indivíduo se julgará no direito de envolver em grave acusação o nome de um ministro ou primeiro-ministro sem pudor e sem temer consequências no decorrer de uma convera privada sobre o deslindar de um crime.
O que sairá daqui para o futuro? Melhores leis anti-corrupção? Como? Se ainda hoje ouvimos um juiz, especialista, dizer que nesta legislatura foram criadas leis ainda mais restritivas à investigação?
Melhor liberdade de imprensa e mais preocupação com os conteúdos informativos? Como? Se a tendência é criar mecanismos de controlo ou de pressão utilizando os media quando interessa transmitir mensagem, e refreando-os quando desagrada? E que liberdade existe realmente quando os meios de comunicação se concentram nas mãos de dois ou três grupos económicos que não são inocentes no que a uma agenda mediática diz respeito?
Melhor democracia? Como? Se o discurso de fuga para a frente e do desejo de criar pequenos autocratas em cada local de funcionamento popular é um tique governativo que se está a tornar numa ideologia?
E agora que a banca e a indústria estende a mão ao governo, alguém pensa que aqueles alguém querem saber da verdade acerca de uns "trocos" desviados, preferindo o certo ao incerto?


O senhor presidente deve vir agora dizer-nos que lamenta, mas não tem solução.
Não se lamenta mais do que eu me lamento por eles. E sabendo, como se percebe no vídeo, que ali se fala do clima de medo instaurado (e ainda só se estava em 2006, início da legislatura), o que sobra agora de verdade? Ora Sócrates sozinho não conseguiria assim tanta influência. Até onde vai esta espoliação? Quem quis assim tanto que os portugueses aprendessem a ter medo? Que nos habituássemos?

quinta-feira, março 26, 2009

"Coitadinhos, de todas as escolas, uni-vos!"

"(...) certos professores estalinistas, trotsquistas e maoístas, feitos ministros, deputados e candidatos a deputados, dando lições magistrais e autoritárias sobre a defesa da democracia constitucional, de que eles foram primitivos e assumidíssimos inimigos. (...)
Percebi ontem o ambiente, quando um senhor secretário de Estado veio a parlamento, mais uma vez, insultar os professores, dizendo que quem não cumprisse o regulamento decretino, emitido pelo verticalismo hierarquista, não passaria de um coitadinho que não poderia ser promovido. Por outras palavras, a ministerial figura do nosso burocratismo delegado tornou patente a cultura de que é consequência. Não lhe dou o nome de pedra, pedreira ou pedregulho, nem lhe respondo, de baixo para cima: coitadinho é Vossa Senhoria! Prefiro reverenciá-lo sem temor, com um hossana nas alturas, extensível à ministra rodriguinha e ao sousíssimo José, o Primeiro. (...)"

terça-feira, março 24, 2009

O meu fim-de-semana público foi salvo...

pelo filme "Boa noite, e boa sorte". No meu universo público de referências contraponho o discurso do jornalista Edward R. Murrow, frente ao "Radio and Television News Directors Association in Chicago", ao anúncio da jornalista Eduarda Maio. No meu plano público de referências, contraponho o comentário dos políticos nacionais com a entrevista dada por Rânia al Abdullah da Jordânia , no programa Sociedade da Nações. No meu universo público de referências, o livro de de John Le Carré, Um homem muito procurado, é contraposto às explicações dos nossos economistas e até a essa última cimeira europeia.
Ah, ele é um jornalista americano, uma monarca de revistas cor-de-rosa e um escritor inglês! Pois sejam. Eles são isso, e foram eles que salvaram o meu fim-de-semana de exposição aos líderes e comentadores da vida pública em Portugal. Foi com eles que eu caminhei. Como se eles precisassem de mim para alguma coisa...mas eu precisei deles.

A ignomínia do Darfur:consegue-se sempre descer a outro ciclo

Darfur

sexta-feira, março 20, 2009

Liderança política como meio de partilha de bens pelos governantes?

"Que esta partición de bienes, que es como seguramente los corruptos de este gobierno perciben al país, me recuerda una anécdota personal, tragicómica si se quiere, ocurrida en los prolegómanos de mi primer divorcio, cuando el marido de entonces aceptó finalmente mi petición de separación con una sentencia inolvidable, jurando que se estaba vengando de mi desamor: "Ok. Yo me voy para el coño... tú te quedas con la niña y yo con el Volkswagen"... Así están los chavistas hoy, celebrando puro presente, puro oportunismo, puro dinero recién llegado y contratos pendientes, mientras de este lado de la torta a nosotros nos dejan la mejor parte."

Elizabeth Fuentes, "La torta de Tibisay"

terça-feira, março 17, 2009

"Qual a relação entre o Governo e o Presidente da República?
É de responsabilidade institucional e política do Governo perante o Presidente da República. O Governo responde perante o Presidente da República através do Primeiro-Ministro."
..
"(...) Cavaco Silva, como profissional que é, regressa à política com uma longa e feroz luta pela presidência da República. Assumiu-se como a "boa moeda" que conseguiria resistir às investidas das "más moedas", na sua cruel pedagogia da Lei de Gresham, que foi determinante para aniquilar um governo do seu próprio partido e dar-lhe a chefia do Estado.
É um homem de acção impiedosa e firme, quando a quer ter.
Se o pronunciamento que fez de não ter soluções para esta crise foi uma tentativa de culpabilizar só o Governo, então foi de um insuportável, mas característico, tacticismo. Se foi sincero, então foi vergado pelo remorso, e anunciou que a sua longa carreira de político e de homem público chegou ao fim." Mário Crespo, Desculpem, não tenho soluções", in JN

segunda-feira, março 16, 2009

Uma boa ideia.

Portugal é de todos nós.

É uma bela ideia, mas a participação, se em massa, como se deseja, é igualmente respondida, como individual?
Isto é, a partir de um determinado número de respostas quem tem capacidade de ler e de dar continuidade à proposta?
A não ser que pensemos que as respostas são agrupáveis, e que o tratamento a fazer é estatístico. A democracia de massas é uma democracia estatística?
Bem pior era se a democracia de massas fosse indiferente. E não o será de facto, mesmo com estes jogos de participação?

sexta-feira, março 13, 2009

Eu não queria nada escrever sobre isto, mesmo nada. Queria escrever sobre os livros que leio, teorias que aprendo, ideias que se me tornaram claras. Sobre exposições que tenho visto, sobre as pessoas que aí tenho encontrado. E não queria escrever sobre aquilo. Mas não consigo escrever sobre os livros, as ideias e as teorias, de que gosto tanto, e de que não consigo escrever há tantas semanas, como se uma garra tolhesse a minha vontade, e vou falar sobre isto de que não quero escrever? Podia parar aqui. Pôr-lhe um ponto final. E não escrever mesmo sobre isto. Porque é demagógico, porque é pessoal, porque não tem interesse. Como este espaço é semi-público, a parte semi-privada que dele me é permitido usufruir, concede-me uma certa liberdade inconsciente na escolha dos temas e das palavras, mas a parte semi-pública impele-me à consideração dos eventuais indivíduos que possam circular pelo espaço, que é público.
Não me apetece falar sobre professores (maioritariamente professoras) mortos ou agredidos nas salas de aula, por esse mundo fora. Nem dos alunos mortos e agredidos na sala de aulas. Não quero. Mas eles continuam lá a morrer como se a escola se tivesse tornado um campo de batalha na cabeça de muitos indivíduos. Penso neles.
A escola é um espaço de frustração exacerbada (que o digam os nossos governantes), porque é nela que estão centrados todos os rituais de iniciação do indivíduo na cidadania. Hoje, pede-se à escola que substitua as figuras parentais, que responda a anomalias clínicas, que dê assistência social, que pratique a solidariedade, que promova o convívio, que forme o cidadão, que o eduque, que o ensine, que o regule e o vigie e o entretenha. A família, os vizinhos, os amigos, a comunidade, a igreja, os clubes desportivos e recreativos, as associações, tornaram-se satélites do grande planeta escola, e aguardam dela a ocupação da maior parte do espaço livre dos indivíduos em formação. Só quem passar a prova "Escola" entra na vida adulta, e nas promessas de mel e pão que os adultos dizem estar à espera de quem a termina.
Mas a escola impositiva, este ritual de passagem sem fim que a nossa sociedade instituiu, é mais um espaço social, e, como os demais, é um espaço agressivo, competitivo, relacionalmente exigente, mesmo quando os currícula se tornam simulacros de aprendizagem. Ou talvez mais agora. Se esvaziarmos os conteúdos ficamos com as formas. As formas de relacionamento. Ora lidar em relações humanas, gerir expectativas, como agora se usa dizer, ficar de frente com as nossas debilidades humanas e emocionais, dá explosões constantes.
Para mais, a universalização do ensino, juntamente com a prática de alguns governos em subverterem o princípio de autoridade do professor, assente no seu trabalho como pedagogo, obrigaram a que certos indivíduos se sintam encurralados na sua individualidade fazendo frente a outras tantas individualidades. Outrora, o menino ou a menina não queriam, ou não podiam, seguir a Escola, e tinham imediatamente actividades em que ocupar a cabeça e as mãos. A comunidade instituía rituais paralelos de aprovação do indivíduo que não o deixava cair na frustração de si perante o olhar dos outros.
A normalização do comportamento não vinha da frequência da escola, mas na capacidade de executar um trabalho, ou de namorar e casar, de ir à missa aos domingos, de saber jogar às cartas, ou de fazer umas calças ou croché, de ter uma casa arrumada e asseada, de beber umas cervejas com os amigos sem cair bêbado para o lado, enfim...uma multiplicidade de papéis, que um jovem podia iniciar cedo e dar-lhe estabilidade.
Hoje encafua-se tudo na escola desde os quatro meses de idade. Tudo para lá. As formas e os feitios a adaptarem-se a outras tantas formas e feitios, porque não há propriamente uma ideia de educação porque não há uma ideia de cidadão.
As classificações baixas são sobretudo vividas pelos pais dos alunos como fracassos familiares, e os alunos cedo se começam a comparar com os seus pares: comparam as roupas, os gadgets, mas também os neurónios. E para além da preguiça de alguns, a verdade é que a natureza privilegia de facto mais uns que outros, assim bem como a estrutura social em que se nasce favorece mais uns que outros. É assim. É a verdade. As pessoas nascem condicionadas e reagem em tempos diferentes à exigência do modelo cultural e social dominante, que os está a avaliar. A Escola é um prolongamento desse modelo dominante e não conseguirá nunca substituir-se à socialização parental, porque as primeiras palavras, os primeiros valores, a primeira forma de aprender a pensar se aprende em família, se vier a aprender isto na escola, aprende ou tarde ou mal. É a realidade. Isto não implica que nos desobriguemos da pública e política exigência de dar oportunidades iguais a todos os jovens. Mas não tenhamos ilusões, ninguém parte, no momento zero da existência, na mesma linha da meta de todos os outros.

Solução? Deixar aqueles alunos que querem trabalhar, começar a fazer essa aprendizagem mais cedo. Voltar à figura de aprendiz. A Escola deve manter-se como uma possibilidade para esses, mas quando for reconhecida como uma necessidade, ou quando for aceite como espaço de conflito de forma natural, não imposta.
Conflito porque há de facto uma luta do saber contra a ignorância, do poder do indivíduo professor contra o do seu aluno, da qualificação académica contra as formas de vida não académicas. De outra forma estaremos a incentivar à desistência, ou à violência, todos os que não conseguem suportar esta institucionalização. Estaremos a querer fazer com que a escola se assemelhe a a um campo de batalha de ódios e de vitimizações, ou de logro, para os que a trapaceiam e adquirem certificados sem consistência científica.

No Japão há indivíduos que se fecham em casa durante anos e se recusam a ir à escola, noutros países entra-se com armas e mata-se e fere-se. Em Portugal assiste-se à violência comportamental crescente.
Quem olha pelos professores e alunos que de facto estão a cumprir o seu dever na Escola? Não devia o governo estar ao lado destes cidadãos de forma inequívoca e frontal?

Mas não, no ensino , como noutras esferas de acção, prefere-se em Portugal dizer mal das pessoas, amesquinhá-las, torná-las ainda mais pequenas. Não sei quem ensinou os nossos líderes que atacar é a forma mais correcta de promover um trabalho correcto e rigoroso. Hão-de conseguir trabalhar com almas enfermiças, hão-de.

P.S. No cordão que os professores (maioritariamente professoras, gente corajosa e digna) fizeram no sábado passado, muito foram os transeuntes ou automobilistas que invectivaram os professores, num discurso e num palavreado digno de regimes totalitários e de ódio sexista e laboral. Fiquei a pensar na podridão existencial em que certa gente pulula. Coisa de escravos e que dura há séculos colada às suas peles.

quinta-feira, março 12, 2009

A China quer tapar o sol com a sua grande peneira. E lá continua a sua longa marcha.
Nós não podemos morder a mão de quem nos dá de comer. Mas, tal como a revista Visão fez, e bem, isso não nos impede de questionar o que está mal. E pelas terras de oportunidade há muita coisa mal para os seus cidadãos.
Eu recebo este vídeo muito bom e bem explicado. É de ver e ouvir a História das Coisas.
Na rua, as árvores cobriram-se em poucos dias de milhares de botões que desabrocham em pequenas flores. É uma esquisitice, parece, mas olhá-las faz-me pensar na dialéctica hegeliana, e esta traz-me uma profunda paz.
Semente, flor, fruto, semente, flor, fruto, semente, flor, fruto. É uma espécie de mantra. Uma ideia de paraíso.

terça-feira, março 10, 2009

9 milhões e meio menos uma, a não deixar de ouvir.

Excepto a questão do presidencialismo, uma ideia, mas uma ideia apesar de tudo que eu não reconheço, tudo o mais soa a verdade:
Mário Crespo entrevista Medina Carreira

sábado, março 07, 2009

Nem quando se faz aquilo que se tem que fazer, por obrigação, e por convicção, se fica impedido de pensar na contrariedade que essa acção provocará em alguém.
Eu admiro a assertividade de certas pessoas. Em certas mulheres, por exemplo, há sempre a ideia de uma imensa competência pela forma como fazem fluir o discurso de forma determinada. É curioso que geralmente são mulheres licenciadas em direito. Parecem-me quase sempre futuras promissoras ministras. Sem dispromor para elas.
As minhas amigas que vêm das ciências naturais, das ciências sociais e das humanidades, têm uma forma de falar e de se expor mais cheia de reticências, uma mais reflexiva forma de explicar as coisas, menos rigor na discussão sobre valores, um maior ziguezague discursivo.
Julgo que a competência das pessoas da esfera jurídica se deva à prática argumentativa que o Direito lhes dá, uma diferente competência linguística relativamente às demais, que as forma num discurso coerente, normalizado e escorreito sobre a vida política, mais próximo daquilo que é expectável ouvir-se. Aquilo que para as demais é uma vivência emocional ou reflexão teórica sobre a descrição da realidade social, para as pessoas de Direito parece uma compreensão da realidade normativa em que se vive.
Evidentemente, a assertividade surgirá em cada pessoa na sua área de saber, ou como reflexo da sua competência prática em algo, mas parecer-nos-á sempre, se em exercício da política, um arremedo de pensamento.
Quer dizer, parecem-me que as esferas do saber e da experiência por vezes são produzidas para se manterem encapsuladas. Se isto decorre de uma qualquer forma de entropia dos processos, como dizia, penso que neste sentido, Lévi-Strauss, ou se decorre de estratégia das lideranças, por inércia ou com intenção, isso não sei.

quinta-feira, março 05, 2009

E as quotas femininas no sufrágio universal?

Nem de propósito. Hoje vou fazer um breve apresentação sobre o assunto das quotas e da participação das mulheres na vida política.
Desde quando é que eu me interesso por isso especificamente? Deixa cá ver... desde que comecei a ler sobre o assunto para fazer a apresentação: desde há uns quinze dias.
O que é que eu posso dizer em minha defesa? Nada. Ou, talvez, digamos que sou de filosofia. É isso. Uma boa defesa. Em filosofia falamos de conceitos. Fazemos deduções, argumentamos, fazemos contra-argumentações, à volta de conceitos. As questões das influências sociais, as manipulações das acções e dos discursos, o estudo de atitudes e comportamentos não é, não foi, a minha área de formação. Pronto.
Para além do mais eu sou obtusa relativamente a certos temas. Acho que nunca me tinha apercebido da existência do tal tecto de vidro, porque na realidade o pensamento não tem que ter género. Esta é a minha defesa. Eu sou uma defensora da razão como faculdade universal.
E no entanto... bastava eu ter sido menos distraída, ou menos ingénua, e tinha percebido como as mulheres que conheço bateram uma, e muitas vezes, contra esse tecto de vidro. Em política ou na academia. Sempre com um sorriso e a comporem a roupinha. Que estúpida que eu consigo ser. E ainda sou capaz de, por cima, oferecer um ramo de flores e fazer uma discretíssima vénia a todos esses estupores.

Despotismo esclarecido

Este fim-de-semana fugi da socratização dos media. Desliguei.
Há muito tempo que não conseguíamos ir ver um filme sem ser animado para crianças. Este fim-de-semana deixei o sentimento de culpa de lado, convidei a avó a fazer companhia ao rapazinho, e abalei à procura de um cinema com o meu marido. Havia escolha. Seleccionamos o MilK. Não nos arrependemos.
Ao princípio estranha-se a interpretação de Sean Penn, e pensa-se:"Irá cair no estereótipo da personagem tipo?" Mas não, começa o actor a caminhar no fio da navalha em termos interpretativos e desequilibra-nos em relação ao tema. Faz-nos caminhar no fio da navalha da nossa adesão à pessoa de Milk.
A homossexualidade não foi, como muitos outros temas ditos fracturantes, uma causa pela qual eu desfraldasse uma bandeira. Até muito pouco tempo não via onde estava propriamente a questão em exigir-se que se respeite legal e civicamente os direitos das minorias, quando era mais que óbvio que só dessa forma se pode proceder em democracia. Quer dizer, não me apercebia que era preciso continuar a lutar por direitos que eu à partida julgava mais que estabelecidos na sociedade portuguesa, não para um grupo específico, para os cidadãos em geral. Obviamente, neste, como noutros assuntos, a minha perspectiva universalista impedia-me de ver a árvore na floresta. De facto havia cidadãos que se queriam casar civilmente e.., não podem. Pois. Também gostava de saber se são preteridos na vida política pelas suas opções. Mas sobre isso preferem nada dizer. Eu penso que era importante saber-se.
Com Milk, como noutros filmes de causas de minorias, o que se evidencia é o caminho de luta contra o status quo político e social estabelecido. Sobressai a estrutura mental do pioneiro. É um clássico do cinema americano. Desta feita o pioneiro era um activista (homem e branco) dos direitos sociais e políticos dos homossexuais americanos. É pouco? Claro que não. Mas é um facto que a sua vida corre a par da de outros tantos homens e mulheres que lutaram e morreram igualmente pela defesa de outras tantas garantias para as minorias que representavam então.
O que mais me seduz em Milk é de igual género ao que me seduz noutros filmes de causa centrados em pessoas: a sociedade civil (um indivíduo a provocar a sociedade civil), com um código ligeiramente diferente do da maioria (não tão diferente até ser irreconhecível, mas suficiente qb. para provocar rupturas), a percorrer um caminho de legitimação das suas exigências. Fascina-me ver os movimentos populares de reforma social.
Já os movimentos reformadores vindos do Estado, dos tais déspotas esclarecidos, cada vez me provocam mais náuseas. Essa força motriz que falta ao cidadão substituída pelo tom de voz do dono do poder que ocupa a cadeira do momento é verdadeiramente perturbador.
Mas isto também é um clássico: alguns detentores do poder, sobretudo quando sentem os adversários temerosos, transformam-se em paternalistas figuras da sociedade que representam. Abominável forma de viver a política.