sábado, janeiro 31, 2009

Bom, agora já estão esclarecidos quanto às medidas.

"11. Meios de comunicação social
Encontra-se no Anexo “3” um email datado de 21 de Novembro de
2008, do senhor Rui Araújo.
A política da Polícia da Cidade de Londres e da Serious Fraud Office
relativamente aos meios da comunicação social é actualmente a de não
efectuar comentários, ou de declarar que ‘ não nos é possível comentar”
no tocante a quaisquer pedidos de informação recebidos.
Agradecia que esclarecesse quais as medidas, se as houver, que estão a
ser tomadas relativamente à divulgação não autorizada de informação.
Agradecia que esclarecesse qual a política actual dos departamentos do
Ministério Público e da Polícia em Portugal em matéria dos meios de
comunicação social relativamente a este caso."
Carta rogatória

Não há nada de mais irritante numa sociedade do que desconhecermos continuamente as formas de proceder para atingirmos um objectivo. Se em cada instituição estivermos dependentes de humores ou de vontades dos agentes envolvidos, então estamos completamente cilindrados como cidadãos. É por isso que eu defendo a existência de protocolos, que dão estabilidade e confiança nas decisões e nos procedimentos aos sujeitos, que se tornam livres da contingência dos humores dos agentes.
Porque é que um procurador fala muito ou pouco ou nada? Não há procedimentos universais a ter em conta para cada caso? Ou justifica-se a existência de circunstâncias? e quem decide sobre essas circunstâncias? E se é verdade que um ministro tem direito ao seu bom nome, isso torna-se menos verdade no caso de uma Srª Belmira qualquer?
Eu só me sentiria completamente descansada se soubesse que para casos iguais haveria investigação igual, comunicação semelhante, procedimento coincidente, ainda que respeitando as características próprias de cada caso.
No outro dia precisei de tratar de um pagamento de uma viagem de trabalho de uma instituição em Portugal. Desisti e paguei do meu bolso. Não foi o excesso de confirmações ou de garantias que me pediram que me levou à desistência, acho bem que se exijam provas seguras, mas o facto de ao fim de negociações de duas semanas, eu compreender que estava nas mãos da boa ou má vontade da funcionária que me assistia e que exercia esse direito, consciente ou inconsciente, de forma arbitrária e discricionária, revelando prazer em ter-me sob o seu controlo e em conduzir o processo no seu pessoalíssimo entendimento de tempo. E isto nem sequer é um assunto que tenha alguma importância ou que envolva decisões fundamentais na existência de um indivíduo.
Imagino pois o drama de quem precisa de lidar com decisões policiais, judiciais, ou de quem quer ver aprovar um projecto ou um licenciamento, e depara com um funcionário que não segue regras! Ou então o horror de quem acaba por descobrir que as regras existentes são tão arbitrárias na sua aplicação quanto na sua criação, o que permitem a justificação para mais paralisia das decisões.
A falta de critérios e de fiscalização de critérios, e de julgamento célere aquando da quebra desses critérios, paralisa as iniciativas e põe-nos nas mãos de pequenos tiranos, quando não de corruptos.
Para alguma coisa o novo discurso que vem de Washington aponta na questão da "transparência": é porque em democracia, sobretudo as modernas democracias dirigidas por e para milhares de indivíduos, a única possibilidade de salvaguarda dessa mesma democracia é submetê-la a escrutínio de forma directa e eficaz.
Como as ideologias vêm e vão como desfiles de moda em cada estação, pode ser que em Portugal a nova colecção do novo discurso americano cá chegue; e um dia, quem sabe, se comece a praticar.
Pelo menos o discurso do eixo do mal do presidente Bush já chegou ao discurso de Sócrates, e se este acenar bem com esse perigo, o de um mal imanente e difuso que é preciso combater, vamos lá ver se todos aqueles que em Portugal sonham com "partir espinhas" não encontram armas de destruição maciça numa escola qualquer, numa redacção de jornal ou num gabinete de um juiz. A ver, senão.

sexta-feira, janeiro 30, 2009

"Pequenas diferenças"?! Onde ficam os "factos" por entre essas diferenças?

"O que para os ingleses são 'provas', em Portugal podem não passar de 'indícios'. E estes ainda podem ser fracos ou fortes. O que, em Inglaterra são suspeitas, em Portugal precisam de ser 'fundadas suspeitas'. Desde o ano passado, quando a polícia inglesa começou a ter contactos mais regulares com a portuguesa, é sobre estas pequenas diferenças que tem decorrido o caso Freeport. Agora, o DN revela o conteúdo do pedido feito pelas autoridades inglesas que solicitam dados às portuguesas." In DN

quinta-feira, janeiro 29, 2009

"Quási"

Chega o meu amigo Fernando Mouro à blogosfera em espaço próprio e a mensagem em que mo comunicava foi retida e só hoje chegou até mim. Bem-vindos, Fernando e companheira de escrita! O espaço é de liberdade. A mim, esta liberdade, inebria-me e comove-me.

E se...


conseguíssemos fazer oposição sem desejar que o opróbrio caia sobre os nossos opositores? Se conseguíssemos fazer oposição baseados em factos e em argumentos e não em insinuações ou em mentiras forjadas para o momento?
Eu votei neste primeiro-ministro que nos governa, eu desiludi-me absolutamente com este primeiro-ministro que nos governa, eu combato em fóruns próprios o primeiro-ministro que nos governa, defendendo que muitas das suas políticas, nomeadamente na área que conheço melhor, a educação e a investigação em Portugal, são um simulacro de políticas públicas. Mas jamais considerarei a insinuação, ou a ofensa pessoal, como princípio de luta legítima em política. Este governo utilizou-a contra toda uma classe profissional. Mas eu não tenho que fazer o mesmo contra este governo. E não sei porque razão estando nós a defender uma política de educação diferente temos que passar a dar notícias sobre o Freeport, a não ser por aplicação directa da falácia do envenenamento da fonte. Mas quem não conseguir convencer outrem com a verdade, e só com esta, não merece ser escutado por ninguém.
Eu não sei se o primeiro-ministro é ou não culpado de fraude. Espero que se o for possa ser julgado e penalizado pelo seu comportamento, e que tudo se esclareça o mais depressa possível, em nome da independência de poderes. E que se o não for, possa ser julgado pelas opções discursivas e atitudes revanchistas que adoptou na condução dos negócios deste país, aplaudido por extremistas que em tempos foram defensores de ideias totalitárias e que têm em si as sementes de uma política do confronto e da discórdia, pela regra da imposição de objectivos considerados superiores.
Mas se não compreendo os que se regozijam com o que está a acontecer a Sócrates, como se isso alterasse as razões das suas causas políticas contra ele, e não fosse um problema à parte (um gravíssimo e profundo problema dele, e nosso como país e como democracia, mas um problema à parte de outras questões, como as que se dedicam só à esfera das questões da educação, por exemplo), também não compreendo o toque a rebate dos militantes do PS. É como se no país só houvesse chafaricas para defender e não existissem princípios pelos quais lutar.
Que raio! Então eu que não concordo com as políticas do primeiro-ministro, que não as sufragaria em eleições, teria, caso tivesse um cartão do partido, ver em tudo isto uma cabala para atacar o PS? Porquê? Um partido só é atacado se perder identidade ideológica e se perder a realidade do país e do mundo de vista, pois líderes, esses, hão-de haver sempre muitos. As consequências dessas lideranças é que podem ser duradouras na história. O mais importante é o PS ou a verdade dos princípios ideológicos do PS. A não ser que estes princípios se reduzam a termos que ganhar eleições e estarmos no poder seja como for, de que forma for e com quem quer que for.
Neste caso do Freeport eu não tenho crença nenhuma sobre Sócrates. Não sou polícia, nem advogada, nem juíza, nem jornalista de investigação. Espero que a verdade se apure. O meu combate é contra políticas concretas das quais eu tenho conhecimentos e contra as quais eu posso argumentar. E é também pela mudança de comportamentos na hora de fazer política: para mim, as deliberações públicas são mais do que um direito, são um dever de qualquer cidadão. É isto que eu ensino nas aulas, é isto que eu tento cumprir.

quarta-feira, janeiro 28, 2009

A cada um o seu situacionismo

Recebi por e-mail este texto que aqui deixo registado. Não sei de quem é a autoria, mas os factos estão confirmados, daí eu a deixar aqui como símbolo do que um governo não deve fazer: mentir. E deste governo são tantas as mentiras que não sabemos que verdade lhes aplicar quando algo nos parece menos mau, e mesmo que algum de entre eles começar a ser atacado com possíveis mentiras, já ficamos insensíveis a essa verdade. Que venham os tribunais e decidam o que é de justiça penal, que venha o povo e decidia o que é de justiça política. E que venham novos princípios e novos comportamentos para a acção política, que promovam uma efectiva participação democrática.
..
"Sobre o relatório agora apresentado pelo governo:
Políticas de valorização do primeiro ciclo do ensino básico em Portugal (2005-2009)

· Apresentado pela Comunicação Social como Relatório da OCDE;

· Foi esta a “actuação” de Sócrates:

«Que dificuldades, que incompreensões. Foram quatro anos de governação difíceis, mas valeu a pena», salientou, felicitando directamente Maria de Lurdes Rodrigues pelos resultados.
«Foi um gosto trabalhar consigo», acrescentou, lamentando que seja preciso «alguém vir de fora», como os técnicos estrangeiros que elaboraram o relatório da OCDE, para dizer «bravo».
· Apresentado assim no Portal do Governo:
Avaliação internacional das reformas do 1.º ciclo elogia as melhorias introduzidas entre 2005 e 2008
http://www.governo.gov.pt/

A verdade:

1. Não é da OCDE. Segue os critérios ("metodologia e abordagem") da OCDE e foi solicitado (e pago) pelo governo;

2. Foi desenvolvido por um grupo de peritos: Peter Matthews, Elisabeth Klaver, Judit Lannert, Gearóid Ó Conluain e …. Alexandre Ventura (Presidente do Conselho Científico para a Avaliação de Professores (CCAP); realizou várias acções de formação sobre o modelo burocrático de avaliação de desempenho; subinspector geral da educação, em 2007, por proposta de Maria de Lurdes Rodrigues e colaborou activamente com o Governo PS durante a presidência portuguesa da União Europeia);

3. Foram consultados 4 peritos portugueses (João Formosinho, Isabel Alçada, Lucília Salgado e Rosa Martins ): todos próximos ou militantes do PS (os primeiros 3 favoráveis às políticas do governo);

4. Baseou-se num relatório prévio feito pelo Ministério da Educação;

5. Os autores ouviram 7 municípios (Guimarães (PS); Santo Tirso (PS); Amadora (PS); Ourique (PS); Lisboa (PS); Portimão (PS); Gondomar (Major Valentim Loureiro);

6. As fontes documentais:

• Galvão, M.E. (Ed.) (2004). Desenvolvimento da Educação em Portugal. Ministério da Educação e Secretaria de Estado dos Assuntos Europeus e Relações Internacionais.

• Ministério da Educação (2007). Educação e Formação em Portugal. Ministério da Educação, Portugal.

• Ministério da Educação (2008). Medidas Políticas Implementadas no Primeiro Ciclo do Ensino Obrigatório em Portugal: Relatório Nacional. Ministério da Educação, Portugal..

Serrazina, M.L. (2008). Programa de Formação Contínua de Professores de Matemática: recompensas e desafios. Escola Superior de Educação de Lisboa.

• Foram elaborados relatórios sobre a reorganização da rede escolar do primeiro ciclo em cada uma das cinco regiões, lavrados com objectivo da avaliação, e foram produzidos registos por alguns grupos de testemunhas entrevistados.

• As informações e dados produzidos por todos os Serviços Centrais

7. A linguagem utilizada é propagandística , tecendo rasgados elogios às políticas educativas deste governo:


“O Ministério pediu – e nós realizámos – uma avaliação totalmente imparcial e independente dos elementos mais importantes relativos à reorganização do primeiro ciclo do ensino básico. Queremos felicitar o governo pelo enorme sucesso alcançado nos últimos três anos…” (p 13)

“A abordagem de Portugal à reforma educativa está também a atrair a atenção internacional. O presente relatório merece ser estudado por outros países que enfrentam questões e desafios semelhantes, porque apresenta um excelente estudo de caso sobre como implementar uma reforma com êxito, e, simultaneamente, como conseguir melhorias efectivas dos resultados educativos.”(p8)

“ Foi um privilégio avaliar as mudanças que ocorreram na oferta escolar para o primeiro ciclo em Portugal durante os últimos três anos. Como é afirmado no relatório, a ambição e a rapidez demonstradas na reorganização da educação para os alunos mais jovens têm poucos, ou nenhuns, paralelismos internacionais. As reformas tiveram um grande apoio em todo o país e irão atrair um crescente interesse internacional. As mudanças no ensino básico trouxeram uma ampla melhoria à vida das crianças e dos respectivos pais, e existem indícios de que estão a contribuir para aumentar os níveis de qualidade do ensino básico em Portugal.” (p 13)

E esta pérola:

“As principais alavancas do processo, tais como a Ministra e os Directores Regionais, não são funcionários públicos independentes, mas políticos nomeados e sintonizados com os objectivos da política governamental. São apoiados por serviços de dados actualizados ao minuto, que permitem uma tomada de decisão inteligente e bem informada.” (p. 77)"

terça-feira, janeiro 27, 2009

Sem um bom sistema de justiça, e de interiorização da ideia de justiça, não há verdade que nos salve

"(...)Olha-se em volta, à procura de sinais. De optimismo e esperança, para uns. De castigo e autoridade, para outros. Não se vêem. Ou vêem-se mal. Todos se viram para o último reduto, o da justiça, aquele que nem sequer durante a revolução, por pudor ou receio, foi assaltado ou reformado. A expectativa não é satisfeita. A justiça não é pronta. Não é eficaz. Não parece isenta. Não mostra pertencer ao seu povo. Foge ao escrutínio. A sua autogestão sobrepôs-se à sua independência. O reconforto que deveria oferecer aos cidadãos não vem dali. Não se vive sem castigo ou recompensa, vegeta-se e faz-se pela vida. A qualquer preço.
(...) Mas nada permite compreender uns energúmenos que, de noite, furtivamente, fecham as fábricas, deslocam as máquinas e desaparecem. E a ninguém prestam contas, enquanto se preparam para mais um projecto, daqueles que têm subsídio europeu. De madrugada, quando os trabalhadores se apresentam ao serviço, estacam diante de portas fechadas. Sem explicação. Sem conversa. Ficam à chuva, à espera de instituições e de justiça que tardam. Há quem diga que “é fita” para a televisão. A verdade que essa é parte do problema. Temos olhos cansados, habituámo-nos a tudo, à miséria e à fraude, à corrupção e ao despotismo. A televisão, predadora de sentimentos, mostra imagens até à fadiga, à insensibilidade. Não se acredita, nem se vê o sofrimento dos outros, para não incomodar as nossas certezas ou para não revelar a nossa insegurança.
TODA A GENTE ESPERA pelos veredictos da Casa Pia (a qual, verdadeira culpada, nunca foi julgada...), do Apito Dourado, do Furacão, do Bragaparques, dos presidentes dos clubes de futebol, de vários autarcas e agora do Freeport, mas a verdade é que a debilidade da justiça é muito mais vasta e profunda do que esses casos ditos de primeira página. Na justiça de família e dos menores, no penal de todos os dias e na justiça económica e laboral: é aí que toma real dimensão a desorganização, a morosidade e a ineficácia do sistema judicial, de investigação e de instrução. O próprio primeiro-ministro pôs em causa a eficácia e a orientação ou do ministério público ou a de uma certa imprensa com acesso às “fugas” orientadas. (...)
As vítimas sem compensação. E os trabalhadores sem indemnização. É verdade que há milhares de casos resolvidos. E de processos acabados. Desses, ninguém fala. Mas é certo que o número dos que ficam para trás, dos que não se resolvem e dos que não reparam é excessivo. E suspeito.
(...)
Se tivéssemos uma justiça à altura, toda a crise actual seria mais suportável. Não haveria mais emprego. Mas a sociedade seria mais decente."
António Barreto In jacarandá

segunda-feira, janeiro 26, 2009

"Portugal é, depois da Holanda e de Israel, o país com menor liberdade de voto. A conclusão resultou de um estudo a 26 países que o economista Paulo Trigo Pereira apresenta no seu livro O Prisioneiro, o Amante e as Sereias, publicado pela Almedina."Isto não é opinião, é resultado de uma investigação" sobre uma "grande fonte de injustiça" da democracia portuguesa, diz o académico, que participou na comissão da reforma da administração central do Estado e presidiu à revisão da Lei das Finanças Locais.O índice de liberdade de escolha do cidadão foi construído tendo em conta o número de partidos, a dimensão média do círculo eleitoral e os índices de proporcionalidade; mede, na prática, a liberdade do eleitor, comparativamente com o partido, na escolha dos candidatos." in jornal Público

Junte-se a este facto o tipo de discurso político em Portugal ser dos que menos promove a ideia (já nem falo da realidade) de uma democracia participada, e ainda a existência de um sistema de justiça completamente inoperacional, em tempo útil, relativo às demandas dos cidadãos, e vemos porque está Portugal em recessão política e social. Mas os senhores economistas pensam que o únivo valor a atender e com efectivo poder é o dinheiro, por isso continuemos todos a caminho de coisa nenhuma. É uma roda livre de valores, mas à custa dos valores dos pequeno-burgueses que continuam a suster as bases sociais dos que vivem literalmente sem lei.

sexta-feira, janeiro 23, 2009

Será que a maioria PS que hoje votou na Assembleia da República compreendeu bem o mal que estava a fazer ao seu próprio país, para não falar ao partido?
Manda a tradição que um investigador se mantenha afastado do objecto de observação. Se o objecto de estudo for a acção política (o comportamento comunicacional dos envolvidos nos processos de formação, tomada de decisões e recepção das mesmas, por exemplo) não é fácil fazer com que os resultados do trabalho de um investigador evitem ter influência sobre a própria realidade estudada, porque o discurso de um investigador faz oscilar o universo da acção política para o uso de determinados termos em detrimento de outros, e que é aquilo que se faz precisamente com os discursos. Ora as palavras afectam os sujeitos que as produzem, ou que as lêem, mesmo que o seu produtor prime pela equidistância entre todos os elementos de interesses ponderados na estruturada que está a analisar.
Pierre Bourdieu, para justificar o seu activismo político, saindo do gabinete da universidade para a rua, considerou que todo o impedimento que leva ao investigador a não envolver-se em interacção com o objecto estudado de forma intencional, é o equivalente a proceder à auto censura.
Eu penso que não é preciso avançar por este tipo de argumentação, porque a busca do conhecimento verdadeiro em qualquer área de investigação humana vale bem o investimento e o autocontrole de alguém toda uma vida, na exacta medida que a paixão pelo saber de qualquer pesquisador não tem que afectar o rigor na sua aplicação do método proposto como mais eficaz para se chegara conclusões verdadeiras. E na clara análise de provas devidamente publicitadas na comunidade de entendidos, primeiro, e na comunidade geral, de seguida.
No entanto, tal como nas ciências naturais, a divulgação de resultados afecta não só a comunidade que estuda a matéria ora comentada, como afecta a própria compreensão que as pessoas podem ter do objecto em causa: ora isso, no universo dos seres humanos, provoca alterações no sentido de representação que temos do objecto (do objecto enquanto conceito).
O que quer dizer que os investigadores em acção política estão a fazer política, ainda que seja correcto que os seus métodos não seja os da política mas os da ciência escolhida para analisar essa realidade.
No fundo é a clássica questão de saber se é o poder do conhecimento a contextualizar o discurso do político, ou se é o poder do político a contextualizar o discurso do cientista. O que tem a ver com o dinheiro dispendido para investigação, o modo como é utilizado, ou, em casas extremos, como o político silencia efectivamante as questões dos cientistas. Estas são as questões fáceis de responder. As outras, as dos efeitos dos sentidos/deveres implicitos, essas é que são difíceis.

quinta-feira, janeiro 22, 2009

Todas as palavras têm consequências

Em política, as consequências das palavras proferidas têm efeitos durante décadas, e para algumas pessoas podem ter efeitos de vida ou de morte.
Eu já aqui escrevi, mas preciso de repetir de mim para mim estas palavras: podemos admirar o discurso (e a acção) de líderes políticos mundiais que não se renderam à retórica da defesa do uso do poder ideológico totalitário (os EUA saíram de um ciclo discursivo e conceptual do tipo autocracia interna e unilateralismo externo), que, em alguns países latinos e europeus se traduziu numa variável um tom abaixo, e que é o discurso de líderes "machos", mesmo sendo mulheres a desempenharem cargos.
É o fascínio pelo agente que faz a política de voz grossa, do respeitinho, do não contradigas o chefe que o enervas. E isto numa democracia, em tempos que devíamos estar a usá-la para saber como alargar a influência da sabedoria e do conhecimento humano para melhorar a vida dos cidadãos de forma participada.
Há quem tenha tradições de liberdade para se refazer, nós temos que ir buscar a nossa.



De volta a este meu lugar.

Aprendi duas coisas enquanto estive ausente: 1. O meu trabalho de investigação começa a cruzar-se cada vez com os interesses que estes monólogos interiores de algum modo aqui vão deixando algum sinal; 2. ao contrário do que pensava, sei que quando tiver que responder pela acção a cumprir os princípios que me formaram como pessoa, eu estarei lá com entusiasmo e não me refugio nos livros.
Sabia que não era cobarde, sabia que sempre me foi fácil ir embora dos sítios onde não me encontrava bem, sem condescendências a não ser com a da estrita observância dos meus compromissos, só não sabia quanto medo eu tinha na certa, e se calhar ainda não sei de todo. Mas tenho-o encarado de frente, e não morri.

quinta-feira, janeiro 15, 2009

Uma querida colega, a Helena Monteiro, enviou-me a referência para esta carta que aqui transcrevo na íntegra, de Barack Obama a suas filhas.

"Dear Malia and Sasha,
I know that you've both had a lot of fun these last two years on the campaign trail, going to picnics and parades and state fairs, eating all sorts of junk food your mother and I probably shouldn't have let you have. But I also know that it hasn't always been easy for you and Mom, and that as excited as you both are about that new puppy, it doesn't make up for all the time we've been apart. I know how much I've missed these past two years, and today I want to tell you a little more about why I decided to take our family on this journey.

When I was a young man, I thought life was all about me - about how I'd make my way in the world, become successful, and get the things I want. But then the two of you came into my world with all your curiosity and mischief and those smiles that never fail to fill my heart and light up my day. And suddenly, all my big plans for myself didn't seem so important anymore. I soon found that the greatest joy in my life was the joy I saw in yours. And I realized that my own life wouldn't count for much unless I was able to ensure that you had every opportunity for happiness and fulfillment in yours. In the end, girls, that's why I ran for President: because of what I want for you and for every child in this nation.

I want all our children to go to schools worthy of their potential-schools that challenge them, inspire them, and instill in them a sense of wonder about the world around them. I want them to have the chance to go to college-even if their parents aren't rich. And I want them to get good jobs: jobs that pay well and give them benefits like health care, jobs that let them spend time with their own kids and retire with dignity.

I want us to push the boundaries of discovery so that you'll live to see new technologies and inventions that improve our lives and make our planet cleaner and safer. And I want us to push our own human boundaries to reach beyond the divides of race and region, gender and religion that keep us from seeing the best in each other.

Sometimes we have to send our young men and women into war and other dangerous situations to protect our country-but when we do, I want to make sure that it is only for a very good reason, that we try our best to settle our differences with others peacefully, and that we do everything possible to keep our servicemen and women safe. And I want every child to understand that the blessings these brave Americans fight for are not free-that with the great privilege of being a citizen of this nation comes great responsibility.

That was the lesson your grandmother tried to teach me when I was your age, reading me the opening lines of the Declaration of Independence and telling me about the men and women who marched for equality because they believed those words put to paper two centuries ago should mean something.

She helped me understand that America is great not because it is perfect but because it can always be made better-and that the unfinished work of perfecting our union falls to each of us. It's a charge we pass on to our children, coming closer with each new generation to what we know America should be.

I hope both of you will take up that work, righting the wrongs that you see and working to give others the chances you've had. Not just because you have an obligation to give something back to this country that has given our family so much-although you do have that obligation. But because you have an obligation to yourself. Because it is only when you hitch your wagon to something larger than yourself that you will realize your true potential.

These are the things I want for you-to grow up in a world with no limits on your dreams and no achievements beyond your reach, and to grow into compassionate, committed women who will help build that world. And I want every child to have the same chances to learn and dream and grow and thrive that you girls have. That's why I've taken our family on this great adventure.
I am so proud of both of you. I love you more than you can ever know. And I am grateful every day for your patience, poise, grace, and humor as we prepare to start our new life together in the White House.
Love, Dad "

terça-feira, janeiro 13, 2009

"A antiga Cidade-Estado era para os cidadãos a garantia de todos os princípios ideais da vida; (...) Em tempo algum o Estado se identificou em tão alto grau com a dignidade e o valor do Homem." Werner Jaeger, Paideia, Aster, Lisboa, 1979, p.135.


Jaeger tem um propósito: defender a ideia de que é necessário prover à formação contínua duma camada de dirigentes no quadro de uma arete política geral (um poder e um saber simultâneos), isto é, formar os cidadãos para proferirem belas palavras e para realizarem acções.
A questão, parece-me, continua a estar nos critérios do que se entende por belo e por justo, quer no discurso quer na acção. Mas é isto que é paideia, ou seja, educação: saber como se forma um cidadão, e para o quê.

segunda-feira, janeiro 12, 2009

"You and I, Tovarich, we are students, writers, and readers; we belong to something that's bigger than any government; we owe loyalty, if you want, to something higher than any one state. Political loyalties are conditional upon our reasoning, and such loyalties are not circumscribed by national boundaries.... The internationalism of the mind and sensibilities is not an abstract internationalism. Nor is it inaccessible. It is available in the bookstore on the corner, and the library downtown; it is as solid as the feeling set up by the look of a steel beam, as specific as the grace of a bamboo shoot, as general as the idea of nature or humanity....
"To write is to reason; it is to fight against chaos and murk. There's an enthusiasm that "takes you over" when you feel -- it doesn't matter now whether it is so or not -- when you feel you're conquering a little more of it for and by understanding. "
C. Wright Mills (1954) Letters and Autobiographical Writings, University of California Press 2000: 184-187).
E se precisarmos do Estado para nos defender ou assegurar a paz? Ou, como deixar de precisar dele sem ficar apátrida, pária ou excluída socialmente?

sexta-feira, janeiro 09, 2009

Este país não é para crianças,

não mesmo.
Fui espreitar a página da biblioteca digital do Instituto Camões, Teresa. Muito Obrigada pela referência.


Li por curiosidade o texto A historiografia sociológica de António Sérgio, lá disponível.
Podemos não concordar com a sua visão, mas ele sim, já em 1915, tinha um plano de formação das pessoas através da educação. Não era um gestor de empresas da área educativa, como é esta administração, que tem o vergonhoso aval da Assembleia da República.


«O primeiro passo seria
conhecer as necessidades do País e elaborar o seu
pensamento, para depois lho restituir já completo,
coordenado e nítido, de maneira que a Nação
encontrasse a expressão consciente do seu próprio
espírito, e nesta revista uma espécie de guia que ela a si
mesma se ditasse, depois de haver sondado e esclarecido
as suas necessidades e aspirações.»
in "Pela Grei" (Lisboa, 1918-1919)

Uma guerra é uma guerra, não tem a ver com sensibilidade, mas com falta de inteligência.

E esta resposta do Estado de Israel e do Hamas à resolução da paquidérmica ONU, ofende mais do que a consciência individual, fere o direito internacional de morte. Não é que seja uma novidade.
O que me espanta é a capacidade de resistência da ONU, não a capacidade de resistência da violência na resolução de conflitos internacionais.
Humanidade: a capa da Visão desta semana traz-nos uma imagem não encenada de humanidade humilhada e frágil. Não pelos escombros, não pelos ferimentos da vítima apoiada por um companheiro, não por manifestar estar em estado de choque, mas pelo medo que sabemos habitar ali (em nós) e que corta rente a capacidade de controlo do corpo humano, no que mais é ensinado a um indíviduo que se domine em público. A nossa humanidade. A nossa utilização individual por poderes que se querem donos da gente.

quarta-feira, janeiro 07, 2009

Uma boa notícia que me tenho esquecido de anotar aqui.

Lançamento da versão Beta da Biblioteca de Livros Digitais, com livros que de forma muito intuitiva e prática podem ser lidos e ouvidos. Uma delícia para as crianças.
Veja-se o caso do livro "A cidadania de A a Z" com exercícios práticos para os professores dos mais pequenos. Exercícios úteis, simples e directos para trabalhar na sala de aula. Uma bela ideia do Plano Nacional de Cultura. Mais livros seria desejável.
Outra boa notícia, sobretudo quando estiver em pleno funcionamento, é a biblioteca europeia digital, a Europena. Nestas matérias não há vencidos, só vencedores.

terça-feira, janeiro 06, 2009

Um "Moomin" também para Portugal: votos de ano bom


As nossas fábricas de faianças das Caldas da Rainha caiem umas atrás das outras, levando ao desemprego centenas de pessoas, e fazendo desaparecer um produto regional muito curioso do ponto de vista artístico e cultural popular.


Um dia destes entretive-me a ver um programa sobre dois barmans americanos que percorrem o mundo e criam uma bebida nova em cada país por onde passam, depois de se documentarem e experimentarem várias formas de vida desses lugares. O programa em causa era sobre a Finlândia. Retenho várias informações, uma delas dá conta da existência de um produto de marchandise do maior sucesso internacional, que tem num boneco todo branco, o "Moomin", a sua imagem de marca. Confesso que não conhecia o boneco nem as histórias que o têm como personagem, mas que os números astronómicos da balança comercial a favor do país por causa do respectivo boneco eram de espantar, lá isso eram.


Nós por cá publicitamos Ronaldo e Mourinho e o Allgarve. Enfim, uma marchandise perfeita. Os dois primeiros, então, conseguimos vendê-los em série. Não os temos é em produção, quanto mais uma série. Um pormenor.
Mas se pusermos o Senhor Primeiro-ministro a falar sobre isto ele há-de convencer-nos a todos que o "Magalhães" há-de vir a dar cartas a esse tal de "Moomin", pois que nenhum ministro finlandês o traz em pin ao peito nas reuniões internacionais, logo... "Moomin" 0 -"Magalhães" 1.

Se perguntarmos sobre os currículos...

e as competências adquiridas neste fogacho de ensino acerca dos propagados 30 mil alunos do ensino profissional, estaremos a cometer um crime de lesa-pátria?
Parece que vale tudo neste rol de números, em que ficamos tão especados com a quantidade que mandamos às malvas qualquer preocupação com a consistência científica, técnica e profissional do que é oferecido. Alguém pensará que a maioria daqueles alunos nem sabe ler e escrever, e que estão ali como se em terapia ocupacional?
É que eu quando vou a feiras temáticas também vejo muita gente a correr para os senhores dos brindes de mão estendida e com um ar satisfeito e glutão, nem por isso os brindes valem um caracol.

A democracia e as TIC - nova visão da relação entre comunicação e política.

"Críticos movem-se no sentido de encontrar expressão organizativa, com hesitações sobre se virão a ser partidos, ou movimentos, ou explosões sentimentais, uma indefinição que acentua a desconfiança nos modelos tradicionais de intervenção. A abstenção nas urnas perde o significado da indiferença quando os movimentos cívicos atípicos se multiplicam e conseguem audiência, com tendência para ultrapassar as fronteiras nacionais, mas para ali se encontrarem com a desgovernança internacional. Os novos meios de comunicação fornecem apoio às imaginações, desafiam o isolamento dos cidadãos que se afastam dos modelos tradicionais de intervenção, alertam para a necessidade de solidariedades, forçando uma linha entre o desencantamento e o renascimento da esperança. Mas uma esperança difusa e insegura de ser capaz de reorganizar os mecanismos da vida civil e política, de fazer renascer a responsabilidade pelo futuro, de evitar o alargamento da sociedade de desconfiança que tende para dominar o panorama da entrada no milénio: é urgente reforçar a esperança."
A IDADE DA DESCONFIANÇA Adriano Moreira in DN
Como se reforça a esperança? Continuando a pensar e a escrever, e a ouvir e a ler, e outra vez a pensar, agindo a favor de um sistema de informação para todos.

segunda-feira, janeiro 05, 2009

Às vezes parece que a democracia não quer sair daqui. E no entanto, passe a prepotência do interpelante, há uma dúvida que fica: o que temos como poder de decisão quando o entregamos a outrem em nosso nome? Estamos a emprestar-lhe uma competência nossa? Ou a assumir uma fraqueza, arrostando a nossa incapacidade de governo ou de compreensão das matérias de governo?
Um dia teremos que dar uma resposta em massa, para nos conhecermos como eleitores e não como vítimas dos governos que elegemos. Ou pelo menos teremos, cada um, que proceder a uma introspecção que lhe permita dar uma resposta a esta questão. Com verdade. Sem ressentimento. Quando nos movemos, tomamos posição individual ou colectiva sobre determinado assunto, na educação por exemplo, somos qualificados de corporativistas por quem se nos opõe, ou por quem verbera contra os movimentos, e quando assobiamos para o lado, somos acusados de passivos e pouco participativos, uns paroquiais cidadãos. Temos que nos entender um dia sobre a natureza, a finalidade e a capacidade do nosso papel interventivo na política. Se calhar os cidadãos terão que se especializar por áreas de interesse, ou por necessidade. Mas a isto não se chamará depois precisamente defesa de interesses corporativos? Bom, então há que criar o cidadão interdisciplinar: que saiba de justiça, educação, diplomacia, segurança e defesa, tanto como de economia, finanças, medicina, arquitectura e agricultura, como de cultura, desporto e ambiente. Um cidadão a construir em laboratório. Com o que temos, temos cidadãos minimamente interessados num mínimo de assuntos. É pouco? Ou é perigoso? Se a democracia nos seus procedimentos jurídicos funcionasse, bastava para impedir a autocracia. E não, não era perigoso.