sábado, setembro 30, 2006

Durão Barroso no Sudão por Darfur

Tenho pelos políticos, e o nosso Presidente da União Europeia não é excepção, sentimentos contraditórios. É por isso que me escudo nas ideologias para os interpretar, afastando deles o que deles é mais humano e ambíguo, vendo-os como representantes de ideias e executores de uma tradição democrática de governar as coisas da cidade. Procuro não me agradar de nenhum no exercício dos seus cargos públicos, tal como procuro não ter aversão continuada, faço com que os seus discursos e os seus trabalhos sejam contextualizados, entendidos como servidores da nação, sem ignorar a importância da personalidade própria no processo, claro. É a solução que encontrei para não desesperar de neles ter, ou não, votado, e de não me deixar cair na conversa de que “eles são todos iguais”.
Não me vejo num comício a gritar por nenhum indivíduo, mas isso não é propriamente uma atitude cínica. E uma reserva. Essa reserva, porém, não me impede de aplaudir as acções que julgo dignas de o serem. Aplaudo, de pé, a decisão de Durão Barroso de ir ao Sudão. Não quero saber se podia ser mais cedo, não quero saber que a sua acção tem a aprovação tácita das Nações Unidas como a instigá-lo. Não quero saber de intrigas institucionais. Quero só aplaudir de pé e acreditar na boa-fé do Presidente da Europa. Pelos habitantes de Darfur, sobretudo, mas também por nós europeus.

Pas-de-deux

Hoje é que é o dia do pas-de-deux da Belém. Que delícia. Felicidades.

quinta-feira, setembro 28, 2006

O império português




Na "mailing list" da Livraria Cultura vinha a indicação de que já tinha sido traduzido no Brasil, pela Companhia das Letras, o livro de Kenneth Maxwell subordinado ao título O Império Derrotado, Revolução e Democracia em Portugal.
O império derrotado?! Estranhei. Fui ver a tradução que em Portugal se adoptara e verifiquei que o tradutor da Presença escolhera para título da mesma obra: A Construção da Democracia em Portugal. Na realidade mais próximo de uma tradução à letra, já que Maxweel dera como título ao seu livro The Making of Portuguese Democracy.

O tradutor brasileiro ainda acha que destacar a ideia da derrota do império português faz mais sentido do que destacar a criação da democracia. Será porque a ideia de derrotar o o império, ou o discurso imperial, continua a ter algum significado no discurso político no Brasil? Haverá ainda essa inquietação no Brasil relativamente à matriz de construção da identidade nacional?
A não ser que o tradutor se esforce por representar em título o espírito da obra, e considere que em democracia não pode haver impérios, porque esta os derrota sempre. É uma ideia poética, para além de ser objecto de estudo da Ciência Política e da Teoria Política. Faz sentido. No sentido clássico de império, claro. Em que por império se entende uma unidade política formada por um conjunto de territórios, nações ou populações sob o governo de uma só autoridade.
Mas fará sentido no futuro pensar em democracia e em derrota de impérios? A concepção que temos de Estado-nação está a modificar-se nas últimas décadas, e nem sequer estou a discutir a ideia imperialista que alguma nação possa manifestar.
Relativamente ao título do livro publicado no Brasil, então, para sermos exactos, teríamos que dizer: Portugal, o império que se extinguiu a si mesmo em nome da democracia. Porque até provas em contrário foram os filhos da nação imperial que terminaram com o seu império.
Quanto à melhor capa, para mim não há dúvidas. O prémio vai para a editora Companhia das Letras.

Com música a desnorte

Andava eu anteontem à procura de “links” sobre shostakovich e descobri este blogue, o desnorte. Pensei: “Fantástico. Quem vai adorar esta referência é a Belém”. Mas é claro que a Belém já sabia disso, ou não fosse ela uma verdadeira melómana. Aqui fica a minha menção também.

quarta-feira, setembro 27, 2006

Entre a minha vida pessoal e profissional (exemplo: eia, eia, já recebi a carta da FCT a oficializar a aprovação da minha candidatura a um novo projecto pós-doc.), a apreciação da hora que dediquei a ouvir os esclarecimentos do Primeiro-ministro ao parlamento (ao país), o meu constrangimento psicológico com o estado físico das pessoas que encontro aqui no meu bairro quando ando a pé, e que descubro espantada serem em grande número vítimas de Acidentes Vasculares Cerebrais, e nas quais nunca tinha reparado antes, e as solicitações que determinados temas mundiais como o das privações e da violência continuada em Darfur, como noutras zonas do globo, têm sobre mim, onde ficará a verdade da minha tentativa de racionalizar a existência?

Entre o que eu quero escrever, o que posso, o que não posso deixar de escrever, onde está a verdade?

Como equilibrar a minha tendência panfletária, que me faz pender às vezes para o lado mais populista das questões, e a minha profunda vontade de objectivar e de conhecer fundadamente a realidade em apreço? Como evitar dizer que o Primeiro-ministro teve o tom e o conteúdo certo no parlamento, dificultando, às vezes caricaturalmente, as intervenções da oposição, sem que isso me impeça de criticar as políticas que os seus ministros da Saúde e da Educação, sob seu consentimento, têm conduzido em alguns aspectos pontuais? Como ignorar que por mais projectos de investigação que veja ser financiados me sinto tão confundida como no primeiro ano em que entrei para a universidade? Como esquecer a fome e a violência sobre os que não conheço, e a doença e a morte dos que caminham a meu lado, sem saber o que lhes hei-de fazer?
Filho, meu filho.

terça-feira, setembro 26, 2006

Sim, mas há excepções. Como é que elas acontecem?

"Num regime que domina pelo medo, a convicção individual das pessoas deixa rapidamente de estar em causa."

Artigo de Luís M. Faria sobre o compositor russo Shostakovitch na "revista actual" do jornal "Expresso" do último sábado

Políticos e blogosfera - artigo de Rachman 2

Isto não é uma explicação.

Passo a explicar, optei por fazer uma "colagem" integral do artigo de Rachman porque o achei integralmente interessante, e porque ele tem as ligações a blogues de figuras como H. Clinton, Jospin ou M. AhmadiNejad, entre outras.

Os políticos e a blogosfera - artigo de Rachman

"Apostles of the blogosphere"
By Gideon Rachman
Published: September 25 2006 19:31, FT. com (Financial Times)

A few weeks ago I mentioned to a friend, who works in the “new media”, that I was to start a blog for FT.com. He was not impressed. “Blogging is over,” he informed me coldly.
I shrugged off the rebuke. After all blogs – personal online journals – are proliferating. According to Technorati, a firm that monitors such things, more than 50m blogs had been created by last month – and the number is doubling every six months.
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My doubts returned, however, when I saw an ominous message on the website of Britain’s main opposition party: “Conservative Party enters the blogosphere”. It announced that David Cameron, Tory leader, had started a blog. When the world’s least fashionable political party discovers a social trend, it is surely a sign that it is peaking.
Mr Cameron is far from alone. Over the summer a strange array of politicians started blogging. They included Hillary Clinton, who hopes to be the next president of America; Lionel Jospin, who hopes to be the next president of France; and Mahmoud Ahmadi-Nejad, who is already president of Iran.
Political advisers around the world are clearly giving the same advice to their bosses. Blogging is meant to let politicians communicate directly with voters in a folksy style. In practice it makes aspiring statesmen sound like Mr Pooter, the character from Victorian fiction whose Diary of a Nobody was famous for its banality.
Mr Cameron’s entries from his recent visit to India have cheery little headlines, such as: “Going green in a Delhi tuk-tuk”. The Tory leader is shown around by a tour guide who is “a real character”; he sees the Delhi metro and pronounces it “amazing”. This kind of deadly dull stuff crosses the political divide. David Miliband, Britain’s clean-cut environment minister, got blogging earlier this year – claiming that this might help bridge “the growing and potentially dangerous gap between politicians and the public”. One of his most recent entries has the scintillating headline: “Three cheers for Brighton library”.
Mrs Clinton and Mr Jospin are saved from Pooterisms by their inability even to attempt chatty informality. By contrast, Mr Ahmadi-Nejad’s first blog was full of strange personal details. He notes, for example, that he did very well in his university entrance exams, in spite of suffering from a nosebleed. But after a promising debut in August, he has fallen silent – perhaps distracted by other tasks, such as governing the country and building a nuclear bomb.
Ferenc Gyurcsany , prime minister of Hungary, is more conscientious. He posts new comments on his blog most days – sometimes twice a day. He also has a dangerous frankness, making him a natural for the blogosphere. In a recent speech – now posted on his blog – he confessed to lying constantly to get elected; a revelation that prompted riots in Budapest.
Mr Gyurcsany’s blog is apparently a good read – if you have mastered Hungarian. But it is not clear that it has worked to his political advantage. In fact – for all the interest that consultants are showing in blogging – there is only one politician’s blog that has clearly had a real impact.
In France, Segolene Royal, who is likely to win the French Socialist party nomination to stand for the presidency next year, has been running a website and blog that has generated lots of interest and new support. Ms Royal puts essays on topics such as unemployment or immigration on her site and invites readers to post responses. She claims that she will then incorporate the best ideas into her platform for the presidency. It may be a gimmick, but it has helped her appear modern and in touch with the people – qualities in short supply in French politics.
The Royal experiment will certainly be watched with great interest by other politicians. But so far it seems to be a one-off.
That will hardly surprise the apostles of the blogosphere, however. They have always argued that blogging is politically significant, precisely because it is not a tool of the elite. Bloggers are, as a book on the phenomenon, An Army of Davids by Glenn Reynolds, puts it, holding the Goliaths of the media and the political world to account.
In the US, bloggers are claimed to have played a key role in forcing the resignation of Trent Lott as Senate majority leader in 2002, after he made comments that seemed to express nostalgia for the South in the days of segregation. It is argued that blogs kept the issue alive when the mainstream media was prepared to let it drop. The blogosphere is also said to have been crucial in mobilising support for Ned Lamont, an anti-war candidate, who defeated Senator Joe Lieberman in Connecticut’s Democratic primary in August.
In reality, it is hard to measure the precise impact of bloggers on such events. But the idea of an insurgent grass-roots movement, energised by folk tapping away at their computers, appeals to the romantic, anti-elitist strain in US politics. Many politicians in America and elsewhere clearly feel the need to pay their respects to the blogosphere – if only as a precaution.
It is not self-evident, however, that the blogosphere’s influence on politics is all for the good
. A political consultant once complained that his bosses’ reliance on focus groups handed power to people who were prepared to sit around for hours talking about politics with strangers, in return for a free sandwich. Similarly if politics is increasingly shaped by the blogosphere, it will mean more power and influence for a sub-section of the population willing to waste hours trawling through dross on the internet.
Blogging as a medium has virtues: speed, spontaneity, interactivity and the vast array of information and expertise that millions of bloggers can bring together. But it also has its vices. The archetypal political blog favours instant response over reflection; commentary over original research; and stream-of-consciousness over structure.
Was that last judgment fair? Does it really follow logically from the rest of the argument? I am not sure and I have no time to think about it further. I have to get back to my blog."

segunda-feira, setembro 25, 2006

Giordano Bruno


Campo de Fiori, Roma. Há dois anos, vi que aos pés da estátua imensa de Giordano Bruno havia muitos e variados ramos de flores frescas, lindas.

Bruno era um filósofo. Ao contrário de Galileu, não tinha provado nada, nem pela matemática, nem pela experiência empírica, acerca da sua ideia de infinito e acerca da teoria heliocêntrica do cosmos que Copérnico apresentara.
Sob tortura não abjurou.

Não sei porque estou a escrever sobre isso hoje.

"...it`s funny, how things go."

domingo, setembro 24, 2006

grupos de reflexão e influência

Pierre-Emmanuel Moog, Les clubs de réflexion et d`influence, 2006/2007, Paris, L`Expansion, 2006.

Um livro prático que apresenta uma lista dos “Think-tank” franceses, com os contactos e identificação, ao mesmo tempo que delineia em traços breves a sua história. Com este guia ficamos a saber a quantidade e as características destes “clubes de reflexão”, nomeadamente o tipo de financiamento que os mantém, os temas sobre os quais reflectem, as suas publicações, a organização que escolhem para se estruturarem e as condições em que aceitam os seus membros.

O autor aceita a definição de “Think-tank”, expressão original de uma realidade americana, como sendo a que descreve a existência de um “centro de pesquisa independente que produz um tipo de trabalho de investigação com o intuito de modificar a política”. Centros que se querem financeiramente independentes quer da universidade quer dos governos, com estruturas não lucrativas, que tomam por objecto de investigação o estudo de políticas públicas, tendo como membros pessoas independentes em relação aos poderes públicos e com formações multidisciplinares.
Nos Estados Unidos há grupos que funcionam com um orçamento suficiente para lhes permitir contratar pesquisadores que trabalham exclusivamente em investigação, em França há apenas um pequeno grupo de instituições que consegue ter um corpo próprio de investigadores de forma permanente.
Estes grupos de reflexão e influência manifestam-se com estruturas e formas bem diferentes entre si, sendo no entanto que todos visam influenciar os decisores políticos. O impacto desta influência é dificilmente mensurável, porém é registado como um sinal de sucesso da capacidade de influir, o facto da imprensa fazer eco do seu comunicado, notificando e premiando assim a difusão pretendida. Ainda que haja outros grupos franceses que tenham dito que “preferem que um relatório de duas páginas chegue a um ministro a que um artigo vir a ser publicado num determinado jornal”.
Como refere o autor, estes grupos não têm um poder real e muitas das vezes não têm constituintes reais, eles reunem-se tendo como ideia elaborar recomendações contextuais e não a de produzirem um saber teórico.
Mas…, interroga-se Moog, “porque há tantos relatórios , notas de reflexão e tão poucas alterações?” (p.55).

Às questões de Moog terão que se acrescentar as de Helena Garrido que, no seu artigo de sexta--feira passada, se interogava por que razão os indivíduos presentes na organização e constituição do grupo “Compromisso Portugal”, por exemplo, não começam por alterar as práticas que apontam como necessárias a serem modificadas pelo governo, no seu próprio círculo de influência e competência profissional. A ler.
Em Portugal não temos nenhum "grupo de reflexão e influência" com um corpo de investigadores próprio e que se dedique integralmente à reflexão sobre as políticas públicas. Não temos grupos de produção com reflexão própria.
Mas temos grupos que se querem de influência (fundações, ou organizações como o "Compromisso Portugal"). Estes produzem reflexão contando com um corpo difuso de intervenientes que "benevolamente" se constituem para apresentar as suas conclusões e propostas em fórum, de forma dispersa (definição de benévolo na p. 37).
Em rigor não temos em Portugal nenhum "think-tank" clássico.

sábado, setembro 23, 2006

Visconti

Os filmes de Visconti. Dentro dos filmes de Visconti. A música dos filmes de Visconti.
Take 1.

ou era isto ou era um poema ou era uma fotografia

Museu Militar

Hoje, enquanto visitávamos o Museu Militar, senti que Visconti podia ter passado por ali. Não na ausência de informação em língua inglesa ou francesa que ajudasse os frustrados turistas estrangeiros que, em maioria em relação aos portugueses, por ali circundam. Não pela deficiente, quase lúgubre, iluminação de algumas salas. Não pelos desadequados expositores de amostra do espólio. Não pela falta de informação didáctica apelativa para crianças e jovens. Não pela falta de dramatismo com que são retratados os episódios da nossa história político-militar. Não pela ausência de música. Mas pela cenografia do edifício ele mesmo. Por aquelas salas tão ostensivas, mas espectacularmente adornadas. Pela beleza de alguns dos artefactos expostos. Pelo fio das espadas.

Uma instituição com tantos recursos humanos deixa assim, sem imaginação nem glória, passar os dias sobre a memória?

sexta-feira, setembro 22, 2006

comunicação política

No JN de hoje Nuno Rogeiro escreveu sobre a importância do estudo da linguagem em política, reiterando a ideia de que "as palavras não são inocentes". Um artigo didáctico.

Vou deixar aqui algumas ligações à "Rede" sobre os nomes de autores por ele referidos.

Robert Hariman

Murray Edelman
http://www.amazon.com/exec/obidos/search-handle-url/index=books&field-author-exact=Murray%20Edelman&rank=-relevance,+availability,-daterank/002-3506302-5470457

Não identifiquei nenhum E. Lakoff. Mas nesta área temos dois autores com apelido Lakoff, sendo o primeiro mundialmente reconhecido:

Chilton

Georg LaKoff (link ao seu blogue)
e
Robin Lakoff

Derian
http://www.watsoninstitute.org/contacts_detail.cfm?id=24


Shapiro

Lasswell

Bentham

John Rupert Firth

Apter


Dorsey

Roig ( será uma referência a Artur Andrés Roig, o filósofo argentino?)

Não consegui saber quem era e o que escrevia M. Golg Bliss.

quinta-feira, setembro 21, 2006

O que eu ouvi na rádio ou na televisão que me fez ficar a pensar:


Televisão, RTP 1, programa “prós e contras” da passada segunda-feira. Falava-se sobre o estado da educação. Dizia uma senhora professora, Presidente do Conselho Executivo de uma escola: “As creches já não aceitam uma criança logo que ela tem uma pontinha de febre, por isso as mães (professoras da dita escola) têm que faltar muito”.
Nem sinto vontade de comentar. Isto e outras coisas que por lá se disse. Mas vou esforçar-me: Na cabeça desta senhora Presidente, uma criança com uma pontinha de febre (isto não existe, ou se tem febre ou não, logo ou se está doente ou não) não tem nada que ficar no aconchego do lar com a sua mamã ou papá, preferencialmente, a cuidar dela. Não, é ir para a escola que é assim que se faz em Estados em que os indivíduos estão submetidos aos interesses da administração central.

TSF, ontem ao fim da tarde. Falava o Vice-presidente da Câmara de Oliveira de Azeméis a comentar o anunciado encerramento para o dia seguinte (hoje) de escolas por parte de pais que protestam dessa forma contra a falta de auxiliares nas escolas dos filhos. Que sim senhora, que era verdade que havia falta de auxiliares, mas que os pais têm que compreender que o país não está em condições económicas de dar resposta a estas questões. Realmente há que saber que muitas das escolas públicas só conseguem dinheiro para que se compre material escolar e outro, como o papel higiénico, por exemplo, porque os pais dão um dinheiro extra por mês para satisfazer essas necessidades. As pessoas dão o que podem. Os amigos que me contaram isto contribuiam todos os meses com 20 Euros para a escola que a sua filha frequentava. Logo, o ensino público não é inteiramente gratuito e o ensino público está mal financiado e/ou mal gerido. As câmaras que vejam bem onde andam a gastar o dinheiro e quais as prioridades. O Ministério que não ande doido à procira de contenção de despesas que passe a ficar como o cão que persegue a própria cauda.


Antena 1, hoje de manhã: Nicolau Santos comentava a proposta do documento proposto pelo Think Tank Compromisso Portugal” sobre o tema da Segurança Social, criticando a defesa que António Carrapatoso fazia da ideia de passar a haver uma conta individual, gerida por entidades privadas ou públicas, onde cada trabalhador poria o seu dinheiro a capitalizar para a sua reforma. Aquele seria só o seu dinheiro. Como Nicolau Santos referiu e muito bem, isso iria destruir uma ideia social base para a coesão de um grupo alargado que é o da solidariedade inter-geracional, sendo que a longo prazo os mais pobres iriam ficar ainda mais pobres (os seus descontos iriam ser proporcionalmente muito inferiores o que lhes daria a perspectiva de acabarem na velhice com muito pouco). Ora é na contenção de um tecto a aplicar às reformas, a partir de uma determinada quantia não se pagaria reformas exorbitantes, que pode passar a solução, sendo que estas pessoas, pelo seu próprio percurso económico/profissional, teriam sempre a hipótese de aplicar as suas poupanças em fundos de investimento para a reforma, algo que os trabalhadores com salários mais baixos obviamente não conseguem ao longo de uma vida de descontos.

Sendo eu o mais possível a favor da responsabilização dos indivíduos, não concordo de maneira nenhuma que se deixe fora da esfera dos deveres do Estado as suas responsabilidades sociais com os mais desfavorecidos, e que isso seja feito sem o sentido de solidariedade social que tem formado as sociedades europeias nas últimas décadas. Não são só questões económicas, são questões que se prendem com o tipo de socialização que queremos promover. Se o sistema falir em termos económicos terá que se proceder a um reajustamento das contas, a uma nova ordem de destribuição, mas não a uma fuga das responsabilidades colectivas.
É isto que eu acho que o Ministério da Educação, que está a querer fazer coisas, e a querer resolver pragmaticamente alguns problemas estruturais, se está a esquecer. É que a escola que propuser agora forma a sociedade que vamos ter. Pouco mais terá tanta influência neste momento. Esqueça-se disso e quando as contas estiverem todas certinhas ainda andaremos à procura de quem são e porque o são as nossas crianças e jovens como são.

O homem anda a fazer de propósito...só pode.

Com discursos destes o que é que ganha a política? Já para não falar no mundo? Ninguém lhe exige, aos gritos histéricos nas ruas, que ele peça desculpa? Ah, é verdade, o discurso de vítimas é para outros.

Há Presidentes que se atraem na asneira, e Chávez anda a provocá-las.

quarta-feira, setembro 20, 2006

Os rapazinhos e a escola


Hoje apetece-me escrever sobre as histórias fabulosas do “Menino Nicolau" de Goscinny e com ilustrações de Sempé, para aproveitar e falar sobre os que falam de educação? Ou falar do livro de Fukuyama sobre a construção de Estados, para falar sobre o nosso Estado? Hum… e o vencedor é: “O menino Nicolau”!

Ainda não estou completamente convencida de que não devia falar da importância social de proferirmos ideias "proibidas". Eu posso dizer o quê? Quando? E Porquê? Respondo primeiro perante quem? Perante a minha consciência ou perante os meus parceiros sociais, mesmo os que eu amo, mesmo a quem eu devo obediência? Perante a intuição ou perante a convenção? Digo alguma coisa de novo ou repito o que já li, escutei ou vi? E em quantas vezes me enganei, me confundi e disse asneiras sem balbuciar? Quais são as minhas certezas? E as minhas dúvidas? Quando falo não abro caminho para que outrem fale também, me responda pelo menos? E isso não é já uma provocação ao diálogo? Adiante.

O tempo da infância não pode tudo, é o tempo precisamente da aprendizagem de que não se pode tudo, mas, para os mais sonhadores, aqueles para quem a disciplina chega de forma tangencial porque não a provocam, logo não a enfrentam inequivocamente, há todo um espaço, de auto-sugestão, de uma liberdade infinita. Julgo que para estes chega a ser surpreendente descobrirem um dia que cresceram e que são pais, e que agora há na sua esfera de gravidade um outro ser a procurar tudo de novo, tudo para si, tudo da primeira vez. E o sonhador ou se torna um moralista desgraçado que prega o que não fez, por desistência da vontade de resistir e de ser difícil ou porque não estava ali, ou se torna espectador dessa natureza e observa-a a seguir o seu curso, planando sobre a existência, escutando.

Porque é que as pessoas que nunca foram professores do secundário ou do ensino básico, que nunca tiveram que andar seis anos a estudar, com vários concursos públicos pelo meio, só para iniciar a carreira, só, falam dos professores como se tudo soubessem destes? Porquê encher a boca com os mestrados que os professores no estrangeiro têm (onde é que isto fica?), como se não soubéssemos que esses graus não se comparam ainda em termos de exigência com os nossos trabalhos? Porque é que quem sempre leccionou no superior e levou anos e mais anos a fazer em doce remanso um doutoramento, debita sobre o que falta aos outros professores em Portugal? Algum professor, sem ser os do ensino não universitário, deixou de cumprir escrupulosamente os critérios de admissão pública ao ensino, providenciados pelo Estado? Conhecem algum professor, fora das universidades, que estivesse a dar aulas porque, com toda a legitimidade, mas uma legitimidade mais que subjectiva, alguém o convidou? Porque é que de repente o estado se vira contra os seus professores na voz de alguns ex-ministros, ministros e afins? O estado do ensino deve-se exclusivamente à política da educação e social escolhida para Portugal e nunca aos seus agentes. Quem é que tem dúvidas?

Não falei ainda do livro “o menino Nicolau”. As histórias, só ligeiramente datadas, porque na realidade algumas coisas mudaram nas estruturas familiares e na escola, contam-nos a vida do menino Nicolau com a sua família e amigos. Era um tempo em que não existiam pedagogos e pediatras, nem a ansiedade de pais a ouvirem pedagogos e pediatras sobre tudo e mais alguma coisa, era o tempo de brincar na rua com os amigos e de ir para a escola sozinho. O tempo em que os pais, ou o estado, não tinham que obrigatoriamente preencher as horas de brincar dos miúdos com actividades pedagógicas, para que os papás possam produzir muitos produtos para o país ser rico. Ou o que quer que seja que se quer rico. Como são histórias pequenas cabem bem na hora de ir deitar. Esses rapazes são os nossos rapazes, sempre a resolverem com os punhos o que não conseguem através do discurso. O humor é superior. Compreendo o desespero do Clotário quando diz aos seus amigos, que "pintaram a manta" na festa dos seus anos: “Ele explicou-nos que queria conduzir uma locomotiva quando fosse grande, mas depois da festa de ontem ele não iria crescer mais porque o papá dele lhe tinha dito que não ia haver mais aniversários”. (p. 84).

um pirata português em Washington

Um dia destes vamos dar-vos um grande abraço de celebração por um sonho português em terra americana. "Windfall" para o "Piratz Tavern", mano!

terça-feira, setembro 19, 2006

Uma mudança não uma cruzada

Uma interpretação mais relacionada com os possíveis interesses e perspectivas da igreja por JOHN L. ALLEN Jr., in "The New York Times" relativamente ao discurso do papa.

"carta sobre a tolerância"


Muitas pessoas estão a confundir a intervenção do papa Bento XVI na Universidade de Ratisbona com se de um tocar de sinos a rebate para reunir a congregação cristã se tratasse. Eu continuo a julgar que antes de mais o papa está a fazer uso da sua capacidade de raciocinar e de usar argumentos para falar para a humanidade, em nome da capacidade de cada um poder utilizar a sua razão, desenvolver o seu espírito crítico e manifestar-se livremente. Isto não é uma prerrogativa do ocidente, são faculdades comuns a todos os seres humanos que devem poder discutir em público as suas ideias e crenças.

Mais do que uma defesa dos valores ocidentais, o papa está a defender os valores universais da pessoa humana. Temos tendência a esquecer que os radicais islâmicos não nos fazem mal a nós ocidentais em primeiro lugar, fazem-no ao seu próprio povo que está constrangido a moldar o seu comportamento de acordo com os ditames de suas excelentíssimas individualidades supremas. Quantas pessoas moderadas se sentem forçadas ao silêncio, porque senão serão perseguidas, presas ou mortas? Quantas pessoas que não crêem o podem afirmar sem incorrer em penas de morte? Quanta liberdade existe para o povo muçulmano pensar e agir para além da que os seus líderes religiosos/políticos lhes ditam? Isto é viver sob ditadura, e, a esquerda que não se engane, não é passível de ser contextualizada na esfera do respeito pela diferença cultural de cada povo. Isso é entregá-los a forças violentas que não os atendem ou prezam em nome de uma vontade de poder abusivo.

Não se trata de um discurso que contraponha o mérito dos cristãos (até porque a história ensinou-nos bem, onde e como tão mal se empregou esse mérito) ao desmérito dos muçulmanos, a direita que não se engane. É um discurso que anuncia a possibilidade de cada um interpretar as crenças num quadro alargado de reflexão e uso da vontade autónoma. O mundo muçulmano está a guardar por um John Locke que escreva a sua “Carta sobre a tolerância”, e nós não devemos ignorá-lo em nome de uma ideia de que não nos devemos imiscuir nos seus assuntos internos. Claro que não devemos, mas daí a calarmo-nos cobardemente com medo dos urros da populaça há uma diferença enorme para o animal que pensa. O papa não temeu nem se acobardou. Falou pelos intelectuais do mundo inteiro, sobretudo pelos que não podem exprimir o que pensam.

Eu penso nas muitas crianças e nas mulheres muçulmanas que continuadamente são reféns da violência, penso sobretudo nas crianças afegãs que ontem foram vítimas de uma maliciosa criatura que não suportou vê-las felizes a receber pequenas lembranças. O ódio pelo ocidente é grande, mas o sentimento do ocidente por eles não deve ser o de uma indiferença maior, em nome dos que lutam pela liberdade.
“... não cabe ao magistrado civil o cuidado das almas, nem tampouco a quaisquer outros homens. Isto não lhe foi outorgado por Deus; porque não parece que Deus jamais tenha delegado autoridade a um homem sobre outro para induzir outros homens a aceitar sua religião. Nem tal poder deve ser revestido no magistrado pelos homens, porque até agora nenhum homem menosprezou o zelo de sua salvação eterna a fim de abraçar em seu coração o culto ou fé prescritos por outrem, príncipe ou súdito. Mesmo se alguém quisesse, não poderia jamais crer por imposição de outrem. (...)
Em segundo lugar, o cuidado das almas não pode pertencer ao magistrado civil, porque seu poder consiste totalmente em coerção. Mas a religião verdadeira e salvadora consiste na persuasão interior do espírito, sem o que nada tem qualquer valor para Deus, pois é a natureza do entendimento humano, que não pode ser obrigado por nenhuma força externa. Confisque os bens dos homens, aprisione e torture seu corpo; tais castigos serão em vão, se se esperar que eles o façam mudar seus julgamentos internos acerca das coisas”.
John Locke

segunda-feira, setembro 18, 2006

O papa com os intelectuais árabes. Eu com o papa: pela liberdade de pensar e de interrogar.

“A Revelação vinda com o Islão criou um quadro que se torna tanto mais rígido quanto se considera ameaçado. Ora, este quadro pode perdurar mais dez séculos. Esta é a razão pela qual a quase totalidade dos países muçulmanos que quer mostrar ao mundo um rosto “moderno” vive sob regimes quase ditatoriais, Síria, Irão, Iraque, líbia, Argélia, Sudão, Indonésia, ou então sob monarquias autoritárias, Jordânia, Marrocos, Arábia Saudita….

Esta é igualmente a razão pela qual o estatuto de intelectual árabe é um dos mais frágeis, não tendo teoricamente um intelectual nenhuma razão de existir num meio no qual o Corão tudo explicou e no qual os únicos comentários que ainda resta fazer são do âmbito das autoridades religiosas”.
Gerald Massadié, História Geral de Deus, Edições Europa América, Lisboa, 2001, p.434

Quem dizia que a ONU tinha morrido? Quem?

President relenting on value of U.N.
By Joseph Curl
THE WASHINGTON TIMES September 18, 2006
President Bush, who once said the United Nations was teetering on the brink of irrelevancy and demanded it show some backbone, has increasingly turned to the organization for international problem-solving, even as most Americans think the body has outlived its usefulness. On issues from North Korea to Iran to Sudan, the president, who arrives in New York today to attend the U.N. General Assembly's annual meeting, has deferred to the United Nations to drive action. Critics say Mr. Bush has been forced to become more multilateral after bucking the world body by invading Iraq, but administration officials assert that the United Nations remains a useful tool to spur foreign leaders to step in on major issues. "This business about 'Our relationship is so bad' and 'We can't get anything done,' when you look at it, we actually have a fairly smart record of achievement," one senior administration official told The Washington Times last week. "We've gotten resolutions on some pretty serious issues where nobody thought we could get them." But it remains the enforcement of those resolutions that so frustrated Mr. Bush in 2002, when the U.S. led a coalition of nations to oust Iraqi dictator Saddam Hussein. Four years ago, he asked, "Will the United Nations serve the purpose of its founding, or will it be irrelevant?" Mr. Bush continues to have doubts about the organization. On Friday, he said, "I think a lot of Americans are frustrated with the United Nations, to be frank with you." He cited inaction over Sudan, where genocide has left an estimated half-million people dead. "The problem is that the United Nations hasn't acted. And so I can understand why those who are concerned about Darfur are frustrated. I am." He is not alone. A poll released last week shows nearly three-quarters of Americans think the United Nations is no longer effective and would support cutting U.S. contributions to it. In fact, 57 percent of those surveyed by the Hudson Institute said they agreed that "if the U.N. cannot be reformed and made more effective, it should be scrapped." The United States will spend more than $1 billion this year on international organizations, much of it through the United Nations. Some lawmakers on Capitol Hill have sought to tie continued U.S. contributions to the implementation of reform at the world body, but the White House has fought most measures. Still, since his assessment that the United Nations was becoming irrelevant, the president has sought to employ the body when faced with criticism that he is intent on running roughshod over world consensus. Internationally, this approach has been seen as hypocritical, as when U.N. Deputy Secretary-General Mark Malloch Brown said in June that the Bush administration is engaged in "stealth diplomacy" by working with the organization on a number of issues, but blasting it publicly. The White House official last week sought to downplay the president's earlier criticism, saying he was merely warning the United Nations over a simple concept. Former House Speaker Newt Gingrich said the United Nations continues to be the model of inaction, failing to follow through on its resolutions. For example, he cited North Korea's test-firing of missiles on July 4 as proof that the body is all talk. "The entire 'civilized world' declared in midsummer that it would be 'unacceptable' for North Korea to fire missiles," he said. "They deliberately fired seven missiles on our national holiday as a way of showing how much total contempt they had for us." The organization has proven itself ineffectual time and again, said Mr. Gingrich, citing the corrupt Iraqi oil-for-food program, continued kleptocracy, and the decision to put the world's worst offenders on its Human Rights Council. "I think we should be actively trying to create alternative institutions that matter," he said. "I think we should take virtually nothing to the Security Council."

Entre a apanha das uvas e o lavar dos cestos

A vinha é pequena mas dá trabalho. Coisa pouca, de castas misturadas, para consumo familiar. Os meus amigos entendidos enrugam-se todos.
Fazer vinho é um hino de louvor à ideia de imortalidade do meu pai que envelheceu em seis meses o que a vida não conseguira fazer envelhecer em 75 anos.

Deixámos de discutir as nossas diferenças ideológicas no dia em que começamos a discutir a necessidade de aplicação de químicos nos pomares e a poda das árvores. Eu chamava para minha defesa os autores que eram contra as podas, e evocava o grau de dividendos que no futuro a agricultura biológica daria, dando exemplos práticos. O meu pai chamava os velhotes da aldeia que me ouviam entre um sorriso distraído e outro condescendente para concluírem: “Ò filha, isso são tudo lérias de quem nunca plantou coisa nenhuma. Não é possível haver agricultura biológica tal como nos querem fazer crer. A bicharada dá cabo de tudo.”
Entre a experiência dos antigos e o meu saber livresco o meu pai não tem hesitado. Eu por mim continuo a ler Gonçalo Ribeiro Teles e a deixar aberto o capítulo sobre “como se deve podar” do livro que este escreveu há muitos anos com Francisco Caldeira Cabral A Árvore em Portugal, reeditado pela Assírio & Alvim em 1999.
Não consegui comprar o “Expresso” ou o “Sol”. Em Rio Maior, às 10:30m, o primeiro já tinha esgotado e o segundo ainda não tinha aparecido. Depois de almoço já o segundo tinha desaparecido. Ou os meus concidadãos andam a ler muitos jornais ou a distribuição nas cidades pequenas não é grande coisa.

Tal como já ouvi dizer ao especialista João Canavilhas sobre blogues: “O que me preocupa não é que apareçam muitos, porque nunca são de mais, o que deve ser investigada é a razão porque eles desaparecem.”, eu digo o mesmo para os jornais. Saúdo o seu aparecimento e lamento quando algum desaparece.

quinta-feira, setembro 14, 2006

pensamento e acção política: acerca da biografia de Mao

Enredada em auto contradições.
Acabei de ler a biografia de Mao. Atentamente segui as indicações bibliográficas, as fontes, os nomes das pessoas entrevistadas. Não posso deixar de pensar como me é mais fácil defender Heidegger ou Gräss como autores, apesar dos seus actos políticos, do que defender Mao. Poderei dizer, para me desculpar, que os primeiros com as suas opções deploráveis não foram decisivamente causa de morte e infortúnio de tantos milhares de seres humanos. Mas incomoda-me, de qualquer modo, que tenha para com aqueles intelectuais um tipo de respeito para com a sua obra que não tenho para com a de Mao. Vamos lá a ver, não que eu me recuse a ler os seus escritos. A falta de interesse que revelei até agora não significa rejeitar essa leitura. Mas recuso-me a pensar que um homem que praticou o poder como ele o entendeu, e como de uma forma geral a revolução assente em pressupostos sociais marxistas o entendeu, possa ter um pensamento que evolua acima dessa contingência histórica que representou o seu governo.

Tal como não aceito o estafado aforismo atribuído a um general romano sobre os portugueses, qualquer coisa que tem a ver com o facto de que os “portugueses não se sabem governar, nem se deixam governar”, como se, na realidade, nos interessasse muito aquilo que um ocupante da nossa terra tem para dizer acerca dos povos que quer dominar…também passo a não aceitar o aforismo de Mao de que “Se vires um homem com fome não lhe dês um peixe, ensina-o a pescar.” Como se interessasse muito o que diz um homem que deixou morrer de fome milhares dos seus compatriotas e que nem a pescar os ensinou.

O mais que fica é o comum na história das relações que se tecem no poder, para manter o poder. Da incompetência dos líderes ou dos seus conselheiros, sejam eles de ditaduras ou governem em democracia. Pese embora os erros de uns e outros não terem o mesmo preço a nível pessoal em ditadura ou em Democracia. Nixon que o diga.
É interessante ver como os autores interpretam o papel de George Marshall no desfecho, a favor de Mao, da guerra civil chinesa, e do papel de Nixon e Kissinger na entrada da China na ONU em 1971. Interessante também a relação entendida como de atracção/repulsa de Mao por Estaline, e do confronto motivado pela vontade de hegemonia do poder comunista no mundo entre Mao e Kruschev. Relações de interesse.

Tudo o mais é avassalador. A ideologia de uma engenharia social que trata o indivíduo, a família, o grupo, os valores culturais e religiosos tradicionais, como meros elementos ao serviço de uma ideia de estado absolutamente adversa à liberdade, à responsabilização, à crítica e ao respeito pela vontade da pessoa e centrada no culto de personalidade de um líder.

A figura é odiosa, mas julgo que os autores poderiam distanciar-se dessa aversão e justificarem pelas palavras de outrem a caracterização da figura, com testemunhos ou registos, ao invés de consecutivamente utilizarem um discurso próprio valorativo que, a mim, me incomoda. Eu advogava um maior distanciamento.

Mas, fora a questão emocional relativamente à figura, há umas questões que o livro não resolve: explica porque é que Mao não recuperou à Inglaterra o território de Hong-Kong, mas não explica qual o interesse em não ter recuperado Macau tirando-o do governo de Portugal. Ambos os territórios eram governados por potências coloniais, inclusive Portugal perdeu os seus territórios na Índia em 1961, então porque deixar Macau em mãos portuguesas? Os autores não avançam com explicações para este caso.
Algo que também fica por esclarecer é a importância do que os autores consideram ser o maior partido maoísta no ocidente: o de Portugal.
No final não há indicação a nenhuma consulta de arquivo português. Seria importante sabermos como se processava a ajuda da China ao partido, sendo que esta devia ser substancial tendo por comparação as ajudas que eram dadas a outros partidos e apoiantes pelo mundo inteiro. O que fizeram os membros portugueses com esse dinheiro? E qual a sua importância na função de divulgadores do pensamento maoísta no mundo?

A inteligência na Rede

Ontem, enquanto pesquisava na Rede, encontrei duas coisas que me espantaram particularmente: a página do “opinion source” e a página que diz respeito à agenda de actividades da Universidade de Londres (London School of Economics and Political Science). Os motivos são os mesmos: ambos os sítios providenciam um acesso ao conhecimento, à informação e uma variedade na escolha de temas, verdadeiramente assombrosos.
Sendo que na página do “opinion source” temos entrada em artigos que nos podem ser enviados na forma de “newsletters”, com origem em várias partes do mundo e tendo por fonte a imprensa e blogues. Atente-se no artigo "Hysteria, hypocrisy and immigrant hordes", de Gideon Rachman, publicado no "Financial Times", no que à região Europa diz respeito.
É claro que os critérios de selecção pertencem à fundação que edita o “site”, mas não deixam de ser muito interessantes, ainda que nos possamos perguntar porquê estes e não outros? Como em quase tudo na vida.

Os salários dos professores e a OCDE

Raposa Velha do Fliscorno faz uma análise do relatório da OCDE e das consequentes conclusões por parte do nosso Ministério da Educação no que aos salários dos professores diz respeito, deixando um bela questão aos nossos jornalistas.

terça-feira, setembro 12, 2006

A crítica ao imperialismo, no discurso antigo da crítica às acções injustas


Difícil é pensarmos como criticar um estado de coisas ou alguém, sem que isso signifique que queiramos o seu aniquilamento. É uma das questões que o pensamento grego nos legou: como ser fiel à verdade dos acontecimentos sem trair a sua cidade que acolhe igualmente os que os autorizaram ou praticaram com o sentido da justiça ou os que buscaram satisfazer interesses pessoais ou de classes, escondendo dos outros a má acção praticada? Pior: Como perscrutar incansavelmente pela verdade sem parecer-se culpado de traição para com aqueles que julgam ser os defensores da cidade e guardiães da virtude?

Na antiguidade, a história teve o desfecho trágico que todos conhecemos: se buscas a verdade e perdes de vista a lisonja para com os poderosos, e a paciência em condescenderes com as opiniões dos altaneiros néscios, então poderás ser condenado à morte. Se o fores, sendo-o injustamente, o que fazer?
Sócrates respondeu ficando e aceitando a sentença de morte para as falsas acusações que lhe foram feitas. Ele podia perfeitamente ter partido para o exílio, mas como responder perante as leis de cidades estrangeiras que ele considerava infinitamente menos justas que as da cidade de Atenas, sendo que mesmo assim estas contemplavam o suficiente grau de injustiça, no modo como processualmente decorriam os julgamentos, para permitirem a condenação de um homem inocente?
Sócrates morre por compromisso com as leis da sua cidade, porque como cidadão aceitara contratualmente as consequências desta ligação do indivíduo com o Estado, do indivíduo que vive sob as leis do Estado que escolheu para viver, e cumpre-as até ao fim. Mesmo sabendo que os homens que formavam esse estado legislavam de forma injusta. Não morre calado, nem subjugado, morre porque escolhe viver até ao fim como proclamou: respondendo à injustiça com a justiça.

Criticar o Estado, o nosso ou o dos outros que sob o nosso exercem uma esfera alargada de influência, é tarefa, para não utilizar um termo com conotação ética mais forte, o dever, de todos os que têm que considerar se as acções praticadas, por si, ou por outrem em seu nome, são justas ou injustas. Saber dar as respostas é que é difícil, porque estas fazem-nos cair nos quadros de explicações culturais, sociais ou políticas em que estamos socializados de ordinário. Que método de análise, para que tipo de prova da argumentação, com que tipo de fundamento para a conclusão, eis uma questão.
Platão, Críton.
Pela liberdade de expressão.

E agora Sr.ª deputada Odete Santos?

Como é que eu vou agora conseguir ouvir as intervenções desta Senhora deputada sobre alguma questão mais séria do foro social, se ontem à noite a vi defender a mais espalhafatosa explicação conspirativa para o 11 de Setembro sem se rir? Eu sei que o infotainment vende muito bem revistas e jornais, mas irra, que me dói o desperdício da inteligência.

O velho e recorrente discurso do anti-imperialismo. O que se aprendeu com ele?

Ao acaso li o seguinte no jornal “The times Recorder” do Ohio, do dia 11 de Dezembro de 1948.

“During the sharp debate leading to adoption (Universal Declaration of Human Rights) Andrei Y. Vishinsky, soviet deputy foreign minister, charged it was the leaders of the West – not Hitler – who share the chief blame for the second world war.
“The cause of the second world war”, he said, “is not so much Hitler, but the leaders of France and Britain, supported by the USA.”

Pois...

Um sonho académico quase tornado realidade

Para investigadora em Ciências Sociais eu sou um bocadito destrambelhada. Só hoje fiquei a saber pelo artigo de D. Pires Aurélio no DN que o Google tem para subscrição um serviço de arquivo dos jornais publicados nos últimos duzentos anos nos E.UA, Inglaterra, Canadá, Jamaica, Alemanha, Dinamarca, Irlanda, Japão e África do Sul. Em cinco minutos estava a subscrição feita e eu a consultar os jornais que me interessavam, sendo-me dada a possibilidade de cruzar as palavras-chave com a data. A actualização de novas páginas é feita ao segundo. Ena! Ena!

Porquê quase um sonho? Falta Portugal na lista de países que dispõe de uma base dados deste género, e falta a comunidade presencial de investigadores, para discussão, análise e fiscalização mútua das nossas conclusões.

segunda-feira, setembro 11, 2006

Por mais e melhor democracia



"The Dust Cries Out: Homage to September 11"

Karen Swenholt



Temporary World Trade Centre Memorial and Eternal Flame



O mundo está mais inseguro depois do 11 de Setembro? Não. O mundo sempre esteve inseguro, manifestando-se esta insegurança de forma mais visível desde que formas de governo totalitárias e com políticas externas agressivas na vontade de se universalizarem, coadjuvadas com a invenção da bomba atómica, se impuseram contra os valores da democracia como o ocidente os tem vindo a desenvolver.
Para relativizarmos as coisas analisemos com cuidado as décadas de sessenta e setenta no mundo. Era terrífico. A China ditatorial, o Paquistão descontrolado, a Índia à procura da sua identidade política, a desenvolverem todos a bomba atómica. Os EUA e a ex União Soviética, a prestarem apoio logístico nesta área aos novos recém-chegados que mais lhes interessavam e todos a mostrarem os "dentes" entre si, ameaçando-se mutuamente com o uso de tal arma. Fora as outras ditaduras, as guerras coloniais e civis por esse mundo fora. Era um tempo muito seguro, para quem?

Há uma luta de culturas ou de civilizações? Não me parece nada. É um erro que alguns analistas vão alimentando. Há uma luta clara pela hegemonia do poder nos países muçulmanos e vontade expressa de a exportar desta esfera mais restrita para o mundo. Começa por ser uma forma de controlar o comportamento da sociedades muçulmanas mas com intuitos de proceder à sua expansão e consequente erradicação dos valores ocidentais. Neste caso a ideologia que combate a ocidental afirma-se em nome dos valores da religião muçulmana, mas a verdade é que os discursos são exactamente os mesmos que os líderes com tendências totalitárias marxistas ou ditaduras militares de direita ao longo dos tempos utilizaram. O combate faz-se contra as mesmas questões com que anteriormente era feito, utilizando o terror e a violência tal como então se utilizara. Basta ver como procedia Stalin, Mao, Kim Il Sung (o filho deste continua a proceder), Pol Pot, e outros tiranetes menores , ou Augusto Pinochet e Perón.

Seria um trabalho pedagógico interessante analisar em paralelo os discursos de Stalin ou Mao, por exemplo, e confrontá-los com os de Bin Laden, e outros líderes muçulmanos defensores da luta contra os ocidentais.
O jornalismo americano não ficou bem na fotografia do 11 de Setembro. A aprender que os jornalistas não são membros da administração que governa os Estados Unidos, que devem procurar manter os seus princípio profissionais, procurando o distanciamento, a objectividade e a luta contra as pressões da imposição de uma agenda governativa vocacionada para a propaganda bélica. Já aqui escrevi sobre alguns trabalhos académicos conseguidos nesta área.
O que se aprendeu? Que o jornalismo reflecte a capacidade de resiliência do povo americano. A escolha da fotografia dos bombeiros em pé a olharem de cabeça levantada a sua bandeira é uma imagem de desafio. Algo que eles ensinam ao mundo e a si próprios, mas que eu já tinha visto na comunidade dos Açores logo após os sismos. Gente que enfrenta com coragem a adversidade.


O que fazer? Manter-se vigilante em relação a todos o s poderes, sobretudo os que não são escrutináveis, reconhecer a importância e o valor das oposições dos países sob governos ditatoriais, destacando o seu papel, e chamando-os a representaram a sua posição no concerto mais global da discussão pública. Tendo o cuidado de fazer com que um tirano não seja apoiado pela inteligência ocidental só porque se opõe a outro tirano. O que aconteceu no Irão com a revolução islamista devia ser um aviso a todos nós ou na Indonésia, ou...

sexta-feira, setembro 08, 2006

professores portugueses

Sou só eu que tenho a impressão que esta notícia,
"Professores portugueses dos mais bem pagos da OCDE -
Contas da organização feitas com base nos salários de topo de carreira", foi muito bem conseguida por alguém que sabia que esta notícia ía decididamente sair antes:
"Professores podem perder 25 a 50% dos salários
Sindicato contesta regime de transição para nova carreira".


A isto chama-se saber impor uma agenda política. É um bom caso para estudo de como um ministério usa a comunicação para reforçar uma certa imagem do alvo das suas políticas junto da opinião pública, com o intuito de retringir o grau de influência dos sindicatos na discussão sobre o Novo Estatuto da Carreira Docente. Resta saber a verdade, toda a verdade, dessas contas. De um lado e do outro. Só.
Eu gostaria muito que o Ministério da Educação discutisse ideias, mas pelo vistos este contentasse em continuar a fazer um jeito ao Ministério das Finanças. Há pouca Educação para além do défice.

pacto de reforma na justiça

Uma justiça mais célere e mais próxima do cidadão. Estamos cansados de ouvir isto e de assistir impotentes ao contrário disto. Como tornar o sistema melhor, colaborando com os agentes judiciais e sem esquecer os interesses dos cidadãos descrentes no processo da justiça e que recorrem aos tribunais portugueses? Parece que finalmente se procurará escolher, de forma mais aberta e activa à participação dos representantes políticos no parlamento, o que é melhor para o país e não para o governo em exercício, qualquer que ele seja. Sinal de maturidade política.
Esperemos que este pacto de regime para a justiça seja como chuva na horta e sol na eira.

Parabéns Belém!



Belém, a ti devo a minha entrada na blogosfera. A ti devo dias de respirar solto e sensibilidade alerta em tempos que eram para mim complicados.
Felicidades para vocês os dois e uma vida cheia de vontade de continuar a fazer coisas boas e lindas.

quinta-feira, setembro 07, 2006

O filósofo iraniano Ramin Jahanbegloo foi libertado

Só hoje fiquei a saber que o filósofo iraniano Ramin Jahanbegloo (رامین جهانبگلو‎ ) foi libertado no dia 30 de Agosto. Na entrevista que deu após a sua libertação, o filósofo faz algumas contrições relativamente à sua insconsciência sobre as consequências políticas da sua acção académica, para agradar ao regime de Teerão. Bom, faz-nos pensar como a sofisticação da mente humana, e a sua honestidade, faz-nos ficar desoladamente, por vezes, na terra de ninguém.

"Sometimes the trigger for a person to confess to his or her mistakes is not torture by a brutal bunch of interrogators but his or her honest and couragous encounter with the larger picture to which he or she is contributing. Thanks to the work of the reformists who governed the country until 2005, Iran has passed the stage of state terror. The danger now is that the regime-change plan of the Bush administration has the effect of turning everything in Iran back to a pre-Khatami stage. Such a policy must be opposed."

Mas há muitos mais prisioneiros políticos no Irão. Neste site podemos ficar a conhecer os seus nomes, em seu nome e no da liberdade.

luz para Darfur

"In order to help bring even more attention to the suffering of innocent men, women, and children in Darfur, we are launching 10 Days of Action leading up to September 17.
Today, as the first of those days, we encourage you to "Shine a light for Darfur." Join thousands of other Darfur activists by organizing a local candlelight vigil to remember the victims of the genocide in Darfur.
Place a single lit candle in your window as a remembrance, or ask others in your community to join with you and hold your event in a public place.Please take photos of your event, no matter how large or small, and email them to shinealightphotos@savedarfur.org. We will post them online for all to see.
As we approach the September 17th events, we also need your help to ensure the genocide in Darfur remains in the news and on the minds of decision makers.
There is no better way to do that than with a letter to the editor of your local newspaper.
The editorial page is one of the most widely read sections of the newspaper, especially by elected officials who want to know what’s on their constituents' minds. Let newspaper readers know that you will not stand by and watch a government-sponsored genocide take the lives of hundreds of thousands of innocent men, women, and children in Darfur.
Click here to write your letter to the editor today.
We have provided some information to help you, but the more personal your letter is, the more likely it will be printed.
So please take a moment to make your letter as unique as possible by telling your own story. Are you planning on traveling to the New York City event? Do you know a Darfur refugee? Has your church, mosque, or synagogue done something distinctive to raise awareness of the genocide in Darfur?
Click here today to write your letter to the editor.
Thank you for everything you continue to do on behalf of the people of Darfur."

David Rubenstein, Save Darfur Coalition [darfur@mail.democracyinaction.org]

quarta-feira, setembro 06, 2006

Filosofia


El Greco, pormenor do quadro Madalena de 1576-78.












Fiquei a pensar no seguinte por estes dias (2):

Como é que alguém consegue falar de religião como se soubesse em absoluto que essa é a resposta para todas as inquirições humanas, sem que lhe tremam profundamente as palavras quando são proferidas? De que modo César das Neves assume a sua competência em distinguir as manifestações do que diz não passarem de deuses terrenos da manifestção verdadeira, do que é? Onde aprendeu a adoptar este tom prosélito, esquecendo como essa questão poderá ser deveras angustiante, deveras íntima, deveras pessoal, e deveras sofrivelmente passível de ser respondida a não ser no domínio convicção que nasce de uma crença? Como é possível que se continue a arredar com desdém os esforços dos profanos que procuram os princípios racionais universais que possam ser evocados pela sociedade humana como guias de acção justa? Em nome de uma ideia de sagrado que, para ser ideia, terá que ser pelo menos uma expressão do conceito de Deus reflectida nas palavras dos seus representantes, dos que falam em seu nome? Que testemunhos têm essas pessoas para dar que não a graça pessoal da sua fé, e poderá esta ser pouco mais que murmurada, e aflitivamente vivida como uma excepção, não sendo esta uma prova de excumunhão de todos os que negam, ou de todos os que não sabem?
Não compreendo a arrogância de quem quer que seja, nem dos que evocam a autoridade indiscutível das leis humanas, nem dos que usam o dinheiro, este ou qualquer outro poder de influência para humilhar, nem o dos ignorantes e dos maus, nem dos que evocam a subordinação da criatura a uma qualquer ideia de um criador, ou de um seu profeta.
Em homens de fé, religiosa ou política, só reconheço o valor da inquietação, e o percurso dos que perguntam, mesmo que sejam pessoas de convicção, mesmo que saibam por onde querem conduzir a sua existência na terra, mesmo nos que a perspectivam tendo o transcendente como guia.

bebés e heranças

Porque é os jornalistas nos noticiários que tenho visto na TV (e já foram dois) têm que arredondar a voz, em quase júbilo, quando anunciam o nascimento do garotinho da família real japonesa? Há algum outro motivo, para além da óbvia felicidade e alegria que é o nascimento de qualquer bebé, para que se lhe dê uma atenção maior para além do que é a de saber se o Japão consegue entrar na contemporaneidade, alterando a risível lei de sucessão imperial?

terça-feira, setembro 05, 2006

comunidade de blogues

Recebi hoje o relatório do meu “sitemeter”, este registou mais um abalo. A causa está no link que Pedro Correia do Corta-Fitas fez para este sítio. Registei também o seu comentário. Obrigada.

Considero este também o tempo de agradecer a leitura do JPT do Ma-schamba

A ONU e a FIFA

Fiquei a pensar no seguinte por estes dias (1):

Enquanto comentava as últimas notícias relativas ao caso Mateus e a sua relação com as instâncias desportivas internacionais, o jornalista desportivo e comentador sobre futebol da Sic, Rui Santos, dizia o seguinte, cito de memória: “A FIFA quer ser uma espécie de ONU do futebol”. Ora, não. De todo. Pelo que eu tenho lido e ouvido tomara ao lunático mais favorável à ONU que esta tivesse o poder da FIFA. Nem eu, que sou uma bocadinho lunática a favor da ONU, quereria que a ONU tivesse este poder que a FIFA parece ter.

cais do ginjal

Vou recontar um segredo. Eu gosto tanto, tanto, do cais do Ginjal. Mas mesmo assim gosto muito menos do que todos aqueles sem-abrigo que tomaram aqueles armazéns abandonados para ali viverem. O cais do Ginjal está cada vez mais sujo, é um lugar porco, os armazéns estão em ruínas, os muros em risco de desagregação, mas com grafitis de um artista conhecido, ocultam interiores decrépitos, as pessoas doentes, pobres e sem casa, vadios alguns, dependentes quase todos, acamam-se no interior dos edifícios abandonados, lado a lado com um ou outro morador que resta ainda desses tempos em que o cais era um lugar onde se trabalhava e vivia. O cais do Ginjal é um lugar que consegue ser tão maravilhoso.
Eu gosto tanto, tanto, do cais do Ginjal. Porque a água do rio bate prendida ao cais, porque a luz sobre Lisboa é um dos melhores espectáculos da natureza em Portugal, porque há lá uma casinha que tem uma varanda de ferro forjado em semicírculo, porque um menino pequeno ali brincou ontem aos piratas, porque se pode ir lá comer, porque nas noites quentes os pescadores amadores se misturam com os pouco passeantes, e estes passam entre grupos de homens meio bêbados, meio drogados, meio lúcidos. Homens que respondem às boas-noites dos que passam tensos e vigilantes, olhando-os de soslaio e estugando o passo a caminho dos restaurantes que ficam mais à frente.

Um dia o cais do Ginjal ficará como o "jardim do rio", o percurso que lhe dá continuidade e de onde se pode ter acesso, quando o elevador funciona, ao miradouro de Almada. Tubo bonitinho, com a relva aparada e verde, as árvores certas e as pedras em destaque, como nas revistas. Daí até ao lugar de “olho-de-boi” vamos percorrendo um caminho iluminado, limpo e seguro. Há quem deixe aí ficar o carro e ande no caminho mais perfeitinho até à mesa do restaurante. Mas isso é batota. Há que fazer a travessia de barco, sobressaltar-se com a beleza do lugar logo que se vira à direita na estação fluvial do Seixal, quem quiser pode suspirar pela recuperação das pessoas e dos edifícios, sobressaltar-se com a destruição, sentir até um pouco de medo por causa desses seus desconformes moradores. Mas não se espera que sinta repugnância. Será de esperar que no fundo, no fundo, peça que não transformem o cais do Ginjal em mais um “jardim do rio”. E que o cais de desembarque dos “táxis do rio” junto ao primeiro dos dois restaurantes desapareça

segunda-feira, setembro 04, 2006

como se estivesse a falar de futebol

O meu professor de ontologia, salvo o erro chamava-se António Rosas, chamava-nos a atenção para a necessidade de ponderarmos, nas especulações que iniciássemos sobre o problema do ser, no tipo e o grau de influência do estado de nutrição do indivíduo, em paralelismo com a história alimentar da espécie a que ele pertencesse, e sobre as novas causas de morte do indivíduo no nosso tempo.
Segundo julgo ter compreendido, a história da fome que marcaria os nossos genes, e o registo exponencial de mortes violentas fora do quadro das mortes assistidas, clinicamente ou não, em meio familiar, determinariam a nossa acção no presente. Isto é, o passado intuído e o futuro temido, poderiam estar a ser as causas para a manifestação do ser nas forma recorrentes de distúrbios comportamentais nas diferentes esferas da acção humana: do indivíduo consigo próprio e de si com os outros, na família, na profissão, no lazer, no exercício do poder.

Confesso que não tenho nenhuma tendência para idealizar o passado, não o faço com as estórias que construí a partir do meu, nem com as da espécie, e reajo intelectualmente à ideia que defende a existência de um estado na história em que, na sua extensiva maioria, os seres humanos não tivessem tido muita fome, não sofressem da violência mais absurda sobre os seus corpos e não se sentissem o mais desprotegidos em relação às doenças.
Essa absoluta privação no passado, e esse estado de incerteza quanto ao nosso futuro, assim bem como a deficiente socialização dos indivíduos numa sociedade com regras democráticas a serem bem interiorizadas, explicará o fenómeno de tantas pessoas em Portugal parecerem absolutamente incapazes de assumir as suas responsabilidades, e de porem os seus lugares à disposição sempre que são confrontadas com questões que se prendem com a sua incompetência para o exercício do mando?

Novo blogue

João Carlos Correia tem um novo blogue, "
Boas e muitas leituras lhe desejo eu.
Um abraço.

sexta-feira, setembro 01, 2006

prioridades 2




Imagem enviada por e-mail pela minha amiga Eunice Braz.

Estabelecer prioridades 1

Há quem se ria com o número e com o tipo de actividade dos militares portugueses enviados para o Líbano, no quadro do pedido pelo feito para a ONU. São poucos, é verdade. Mas, façam-me um favor, perguntem a muitos aldeões de Portugal o que pensam eles dos militares que após o 25 de Abril foram destacados para as suas localidades para fazer aquela ponte a ligar aglomerados populacionais onde antes só se conseguia passar no verão pelo meio do leito do rio, para rasgar estradas largas onde antes só passava uma carroça puxada pelo jumento, para fazer puxadas de electricidades onde antes só havia o candeeiro a petróleo, e depois digam-me o que fica mais presente no imaginário popular: mil “rambos” a pavonearem-se de arma ao ombro, ou um grupo de intervenção directa na reconstrução de infra-estruturas?

Darfur - a política de interesses nessa parte do mundo

"The Security Council finally took action today to protect civilians in Darfur, but this resolution will be meaningless unless member states get Sudan to agree to a U.N. force," said Peter Takirambudde, Africa director at Human Rights Watch. "While the Security Council was debating this resolution on Monday, the Sudanese military was dropping bombs on rebel-held villages, with predictable consequences for civilians. Now that Council members have resolved to send U.N. troops to Darfur, they must
do everything possible to actually put that force on the ground."

(...)

"Russia, a major supplier of weapons to Sudan, and China, a major consumer of Sudanese oil, both abstained in today's vote on the resolution, which sends an extremely unhelpful signal about their lack of
willingness to press Khartoum to accept U.N. troops."
(...)


The U.N. reports that violence in Darfur is worse than ever despite the Darfur Peace Agreement, leading to the forcible displacement of 21,000 people since July in the state of North Darfur alone. Humanitarian access in Darfur is at its lowest level since 2004, with almost 500,000 needy civilians beyond the reach of humanitarian aid.

For more of Human Rights Watch's work on the crisis in Darfur, please
visit: http://www.hrw.org/doc?t=africa&c=darfur