sexta-feira, fevereiro 29, 2008
O poder do professor e o totalitarismo do modelo de gestão
quarta-feira, fevereiro 27, 2008
Uma nova ordem de reprodução cultural?
Sendo a nossa ministra da Educação especialista em sociologia das organizações traz essa marca formativa para as decisões que toma ou que corrobora com a sua assinatura. Há pois que perceber quais são os modelos explicativos da realidade em que a governante se ancora para estruturar os projectos que vêm para as Escolas da 5 de Outubro, isto se quisermos ter argumentos que a contrariem.
Num livro de introdução à Sociologia como é o de Anthony Guiddens ( e eu relembro que este autor foi assessor de Tony Blair e um conceituado mestre de pensamento, um ideólogo, da política de centro-esquerda, logo é uma referência teórica incontornável para a nossa política de centro-esquerda e, acentuadamente, para este governo), ele dá-nos conta do que se passou com a política da educação na Grã-Bretanha, contextualizando-a com dados provenientes de outras parte do mundo.
terça-feira, fevereiro 26, 2008
Instituto do protectorado
Confesso que já me tinha perguntado que doutrina iria justificar esta prática. E fiquei aqui a saber que foi esta.
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Muito interessante o artigo publicado no DN.
Adriano Moreira, Mais um risco
Os professores no Prós e Contras
segunda-feira, fevereiro 25, 2008
vertigem pela forma de vida totalitária
Pus-me a enumerar as dificuldades: trabalhos que tenho para terminar, outros a que tenho que dar continuidade, os quais implicam todos muitas leituras em áreas divergentes; nas viagens é um livro pouco prático para se transportar e o facto de ter duas actividades profissionais concorrentes e que não me deixam muito tempo disponível para leituras que exijam uma longa actividade continuada. Mas... tudo isto é meia verdade. Para não dizer que são no seu conjunto uma justificação falsa. O que me parece, e me parece a sério e me inquietou muito, foi o facto de eu estar a ler com interesse mas também com alguma distracção a vida de um biografado político democrático.
Na verdade todos os biografados que eu tenho lido, da esfera da actividade política, da antiguidade aos nossos dias, foram grandes figuras centralizadoras do poder e mesmo totalitárias.
O que sinto como verdade, e digo-o com sentido desapontamento por mim, é que o fascínio das ideias e das acções impostas pelo terror me terão instigado a uma leitura mais célere do que as demandas de uma vida singular pelos caminhos sempre cheios de percalços eleitorais próprios de um Estado de direito, num sistema democrático do exercício do poder.
Eu sei, é terrível.
A vertigem
Se eu fosse chefe da polícia, ou uma polícia mesmo, destacada para o serviço em questão mas possuidora de uma matriz cívica democrática inabalável, jamais aceitaria cumprir a ordem do: o primeiro que prestar testemunho a um jornalista vai logo ter que ser identificado.
Então vai levantar-se a suspeita de que os transeuntes reunidos só são passíveis de serem suspeitos de uma ilegalidade se disserem o que pensam e o que fazem ali reunidos aos meios de comunicação? Corre-se este risco numa sociedade democrática? Então não há o pudor, já não digo do respeito pelos princípios, mas pelo menos da aparência do respeito pelos princípios?
domingo, fevereiro 24, 2008
As palavras
e poderás sorrir-lhe como a uma
namorada antiga que nunca envelheceu.
Sorrir-lhe
(entendes o que eu digo?)
numa mistura de timidez e confiança,
porque
(entendes mesmo o que eu digo?)
te tornarás feliz e eterno. "
António Lobo Antunes, "Agora que já pouco te falta" in Visão
sexta-feira, fevereiro 22, 2008
A aparência de realidade
quarta-feira, fevereiro 20, 2008
A avaliação dos professores
terça-feira, fevereiro 19, 2008
Acreditamos todos em si, senhor primeiro-ministro
(...)Por mim, apenas confirmei, através de uma adequada análise de conteúdo, que nunca foram usadas palavras como civismo, democracia, participação, patriotismo ou Estado de Direito, quanto mais socialismo, cosmopolitismo ou europeísmo. Este "public relations" da abstracta governação podia ser propagandista de outra qualquer governança sem governo, de outro qualquer sistema geral de pilotagem automática, ao serviço da melhoria de uma qualquer balança teconológica, onde se confirmasse que o calçado e o têxtil melhoraram e que aumentámos para 35% os cursos profissionalizantes na educação, tendo mais alunos com menos dinheiro, dado que ainda podemos crescer 2,5% ao ano, conforme consta das cábulas postas em bloco, com marcador grosso... "
Post de Adelino Maltez publicado no blog Sobre o tempo que passa.
Sublinho as palavras de Maltez e penso ainda: e depois não há nenhum jornalista que se dê ao trabalho de ir ver a que correspondem na prática os cursos propagandeados, e qual é efectivamente o seu valor científico, tecnológico, educacional ou profissional para a sociedade tendo em conta a sua (pouca) consistência. Também ninguém pergunta pela taxa de abandono desses cursos. Pois, embalemo-nos com a conversa dos mesmos meios e mais alunos e com mais qualidade e acreditemos no primeiro-ministro.
O domínio pelo meio de transmitir representações sociais
segunda-feira, fevereiro 18, 2008
...colhe tempestades, mestre?
Silêncio ou pouca explicação por parte do governo português sobre o acontecimento, que nestas coisas deve estar a aguardar para ver o que faz a maioria dos países no mundo. A literatura oficial fala em secessão e a prática habitual internacional é ser-se contra este tipo de veleidades, pois há muitos países que temem o efeito bola de neve das independências territoriais e perdas de integridade territorial. É o caso da Espanha, por exemplo, que já disse que não aprova a independência do Kosovo, e o caso da Rússia, também. Estes países não têm nada a ganhar com a prática de verem o que consideram uma secessão transformar-se num reconhecido território independente. Estes países têm os seus problemas territoriais internos e estas declarações de independência podem ajudar a manter vivos os desejos dos povos que se encontram eles próprios em luta pela sua independência.
A literatura também fala em autodeterminismo, veja-se o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos; art. 1º “Todos os povos têm direito a autodeterminação. Em virtude desse direito, determinam livremente o seu estatuto político e asseguram livremente o seu desenvolvimento económico, social e cultural”.
Eu tenho dificuldade em tomar partido. Parece-me que o Kosovo não tem maturidade institucional para declarar a sua independência e que vai buscar na UE uma escapatória ou um suporte para a sua fragilidade como Estado, pondo-se à sombra da Comunidade. Perturba-me que Estados fracos advoguem a sua independência, pela incongruência desse estatuto que continua a ser de dependente. Por outro lado, também sei que se não fosse agora, a manutenção do território como parte da Sérvia tornar-se-ia pouco a pouco como um dado político cultural mais consolidado, e tornar-se-ia mais difícil fazer com que a comunidade internacional reconhecesse no futuro essa independência.
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Tu és feita de açúcar?! – Perguntava-me um alemão quando eu me lamuriava por estar a chover logo no primeiro dia em que com um grupo de amigos decidira atravessar uma floresta e subir a uma montanha na Baviera, a pé. Claro que não sou. A partir desse dia aprendi a não ter lamúrias. Bom, bom, aprendi a não me lamuriar muito, sempre que há compromissos de passeios e está a chover.
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A caminho do Convento de Cristo para ver a peça “O nome da Rosa” levada à cena pelo grupo Fatias de Cá. Íamos presos na sugestão do livro e do espaço. Uns amigos já nos tinham falado há mais do ano da existência desta companhia, mas foi J.Moroso, que escreveu sobre o assunto no jornal Sol, quem deu o empurrão para a marcação de reservas.
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Grupo de umas cinquenta pessoas preparadas para o espectáculo. O espaço é sublime, como já se sabe de outras visitas. E o texto é inquestionavelmente uma obra de arte superior. Aguardávamos com expectativa para ver o que ali nos seria oferecido. Passam dois monges em silêncio por nós, no claustro onde aguardámos, seguem e ficam a olhar por uma janela, lá fora monges descem em fila a escadaria exterior do convento entoando cantos. O edifício está impregnado de água e cintilia à luz prateada que no fim de tarde nos permite vislumbrar como se num sonho a sua sóbria majestade de linhas. Senhoras e senhores, o teatro começou.
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Depois são cinco horas de fruição sensorial e intelectual.
"No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o verbo era Deus."
Caminhemos com o erudito, inteligente e fascinante Frei Guilherme. Façamos de jovem Adso, sigamos o mestre.
A actriz que representa frei Guilherme faz-nos estranhar ao princípio. Não pelo género mas pela idade. Comenta alguém nas minhas costas: "Mas Frei Guilherme não era uma mulher!". Comento eu para o meu lado:"Frei Guilherme era muito mais velho...". Mas depois de estranhar, aceita-se. E não volto a perturbar-me com a personagem durante todo o acto teatral, que foi sendo construída de forma serena, com cuidado e à procura da maturidade que Umberto Eco lhe dera. Entra-se no mundo da imitação que Aristóteles tão bem definira e estamos prontos para a catarse. Venham os outros actores.
Os níveis de interpretação são diferentes, todos os actores são amadores, no sentido em que nenhum está ali a ganhar dinheiro. E estando nós sempre colados aos seus corpos e atentos às mínimas falas, já que o espaço e o modo não os protege do nosso olhar, e estendendo-se a peça por tantas horas, dificilmente poderíamos exigir constantemente um nível superior na arte de representar.
Eu fiquei fascinada particularmente com Frei Guilherme e com Bernardo Gui, também com o despenseiro e com o velho Alinardo. Mas todos contribuíram para a circunstância do ritual dramatúrgico da passagem da palavra. Mesmo os guardas que nos acompanham pelos corredores e pelas imensas divisões do convento ganham o seu papel na trama teatral. A paixão de um deles pelo acto era visível no brilho e na entrega com que acompanhava os passos dos actores e os nossos.
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De tempos a tempos vamos ao refeitório. Seis vezes seremos convidados a lá ir. Porque sete são os dias em que decorre a história. A certa altura perdemos a conta. Haverá um momento em que achamos que não vamos conseguir pôr na boca mais do que quer que seja. Mas o cuidado com a cenografia da alimentação, a atenção dada à confecção e a selecção dos produtos dos pratos apresentados, a entrega ao momento, tudo nos empurra para a confraternização. Fica-se a saber segredos enquanto se partilham copos de vinho quente com especiarias. Um certo jornalista foi tomado também ele da vontade de criação e pediu para se juntar ao grupo e comungar daquela cerimónia do outro lado do auditório. Há autores e líderes de opinião consagrados e a ganhar algum rio de dinheiro que se envolvem em pouco éticas e nada nobres acções contra a companhia, impedindo-a de representarem o seu texto. Há actores muito cultos que têm por única vontade fazer com que obras civilizacionais sejam ouvidas e apreciadas pelo maior número possível de vezes.
No fim, na última refeição, temos uma grata surpresa. Um sobressalto de realidade versus ficção. E todos se igualam, actores entre si, público, pessoas que circulam. Não há ali egos a reclamarem a assinatura por baixo da sua existência.
Brindemos a Baco e às transfigurações. O acto é de entrega à imitação de acção.
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E brindemos também a Apolo, pois a discussão teológica que opõe Franciscanos e os seus críticos é uma discussão de elevada racionalidade argumentativa e pode ser trazida aos nossos dias sob a forma da pergunta:"Capitalismo ou democracia?" Perdoem-me os teólogos. Na verdade discute-se então, a cena passa-se no século XIV, se seria ou não heresia a proposição a favor da pobreza de Cristo que os Franciscanos pregavam. O Capítulo de Perusia, documento onde se delineia uma doutrina sobre renúncia à propriedade de todas as coisas como regra de santidade, está em discussão. Ubertino de Casale, o teórico sobre a questão da pobreza, defende os princípios que regem a Ordem dos Franciscanos, e opõem-se-lhe na doutrina os Dominicanos, com o apoio da corte eclesiástica de Avinhão.
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A adaptação do texto esteve sempre muito bem feita. Até mesmo na substituição destas palavra finais por outras menos eruditas mas igualmente filosóficas acerca da universalidade das leis e a sua questionação à ideia de existência de uma livre vontade de Deus. Então há leis universais num universo de livre vontade divina, fora dessa vontade?
Eu por mim ficaria ali a ouvir discutir este tema durante dias, com Frei Guilherme, com Umberto Eco ou com quem quer que me deixasse.
Aplaudimos de pé e gritamos: Bravo!
sábado, fevereiro 16, 2008
Quem semeia ventos...
E então, nessa nossa (in) capacidade para os atendermos, sem descurar o nosso conhecimento das suas vidas, mesmo quando as sabemos também elas entregues à ideia de uma juventude eterna e de uma ilusão de perene existência num estado sem necessidade, é que podemos testar quão simpáticos ou bondosos ou amáveis somos de facto. Paramos e atendemos às carências dos parentes idosos ou dos mais enfraquecidos ou daqueles menos capazes de dar rumo à sua existência, ou seguimos a pensar que a eles se deve a sua situação e que a nós nada nos é devido? Reclamamos responsabilização ou estamos disponíveis? Como equilibrar interesses? E onde se traça a fronteira?
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O senhor primeiro-ministro não gosta de se ver ao espelho que cada vez mais gente lhe mostra na vida pública.
O pior é sempre quando começam a questionar as razões. Aí é que se vê quem é simpático, ou bondoso, ou, no caso do governante em apreço, quem tem estofo de democrático.
sexta-feira, fevereiro 15, 2008
o discurso e os seus efeitos: o efeito tambor
Repare-se o que era sermos americanos e ouvirmos isto. São frases épicas, de encher o peito. Talvez a senadora Hillary Clinton tenha dos melhores projectos sociais para a américa das últimas décadas, talvez o senador McCain pudesse apaziguar os americanos entre o seu ímpeto para polícias no mundo e aquele outro de serem meros cidadãos regidos por um pensamento utilitarista quanto ao tipo de finalidade presente quando há escolhas a realizar na vida pessoal e pública, mas nenhum deles tem a grandiloquência do senador Obama.
Perelman explica-o muito bem quando diz que a argumentação, tal como a nova retórica o compreendeu, não visa só a adesão intelectual por parte de todos os que a ouvem mas que ela visa incitar à acção. É um discurso que tem por intenção convencer ou persuadir.
quinta-feira, fevereiro 14, 2008
Emoção e objectividade
E será a procura desses fundamentos uma actividade estéril? O contrário dessa procura será mais verdadeira e respeitará mais as coisas como elas são? É como são as coisas como elas são? Quem está preparado para dizer como elas são? Os que procuram saber os critérios que as condiciona? Os que se limitam a viver respirando o tempo com as regras que as circunstâncias lhes dão?
Admito que a liberdade promova a confusão, que exija uma personalidade mais estruturada para não se despenhar em ansiedade, que a autonomia pode ser dolorosa ao empurrar para a solidão das posições e dos sentimentos e ao provocar a ruptura com o grupo. Não me admira que mulheres ilustradas queiram no mundo voltar à ideia de uma sociedade orientada por ordens superiores à dos seus desejos e vontades.
O meu filho diz algumas vezes quando instado a fazer escolhas e a responsabilizar-se por elas: "Não sei, escolhe tu." É ainda uma criança, mas já compreendeu como é mais fácil, ainda que possa ser aborrecido, escudar-se na decisão dos outros. Evita a inquietação interna.
As mais cínicas dirão: "É homem, há-se sempre ter a fama de tomar decisões e dá-las a tomar realmente para as mulheres."
Escolhe tu, decide tu, deixa-me na minha paz, ou na minha preguiça ou na minha existência física: expiro, inspiro, expiro, inspiro. E o que isto, mesmo involuntário, já dá de trabalho. Dá tudo um grande cansaço.
Mulheres ilustradas querem pois voltar a usar o lenço, como em épocas antigas. Veja-se o que acontece na Turquia. E com o lenço a cobrir a cabeça vêm as regras de relacionamento social que se juntam ao lenço. Não ter que escolher um homem com quem casar, não ter que escolher uma profissão para se sustentar e uma casa onde viver sozinha, e uma crença ou não crença religiosa a transmitir aos filhos, decidir a cor de um carro, ou se faz aquela viagem ou não, e escolher um partido ou uma ideologia contra a ordem tradicionalmente estabelecida e que possa romper com ela. É muita perturbação.
As minhas amigas que vivem sozinhas mais ou menos a contra gosto dizem-me: "Vá, já que tens opinião para tudo, diz-me lá porque há tantas pessoas solteiras, homens e mulheres, que não se encontram, ou porque não encontramos ninguém que valha a pena conhecer?
Eu respondo sempre, pragmática: porque os nossos pais e mais tarde nós mesmos descuramos esse facto simples que os pais deles conheciam muito bem, do povo às elites sociais e intelectuais, e que é o de terem que providenciar frequentemente encontros entre pessoas que queiram relacionar-se. Havia bailes sem fim por esse país fora, ou não havia? Não há outra grande explicação para que seja tão grande o número de pessoas que gostavam de conhecer outras e não o conseguem, senão o facto de não estarem a ser realizados o número suficiente de encontros sociais que de forma continua, generalisada e sem pressões, a não ser as de um qualquer outro encontro social, se frequente. Vão lá ainda às aldeias e vejam o número de relacionamentos. Ninguém os diz felizes. Di-los relacionados. Sim, está bem, mas é uma questão diferente. Adiante.
As pessoas ficaram entregues às suas próprias competências sociais que assentam na rede de amigos e familiares. Mas a competência das pessoas nessa área é muitas vezes nula. E as redes são cada vez mais alargadas mas também com laços mais frouxos entre si.
Comprendo por isso muito bem, posso rir-me, mas comprendo aquela avó que perguntou aos seus filhos, meus amigos, quando eles compraram uma casa de férias numa pequena aldeia quase sem jovens: "E com quem é que os meus netos se vão relacionar neste ermo, já pensaram?"
Eu que tive na minha adolescência uma "condessa de Ségur" como catequista, vi como ela procedia com os mais velhos do grupo, incentivava ao convívio frequente, organizando encontros, seminários e festas, sempre como se fossem casuais, mas com o olho vigilante de quem tece um tapete de várias cores. Ninguém se apercebia da intenção, ou se de facto se apercebiam não se mostravam desagradados, e no entanto ela sentia ser sua essa obrigação social.
Digo aos meus alunos:"Reparem na segurança que dá serem os outros a escolher por nós ... até o nosso par." Reacção generalizada de repúdio. Sorrio. É bom senti-los com a ideia interiorizada de responsabilidade pessoal, sem querem paternalismos. É bom. Mas vai doer. E será mais difícil. Digam-lhes isso e preparem-nos para isso. Não os enganem. E seria bom que depois não andássemos à procura de razões para a solidão, que passam, em primeiro lugar, pela solidão em que se está e da qual dificilmente se conseguirá sair sozinho, e só depois virão as outras razões pessoais de cada um. Mas isto também deriva de não sabermos que valores promover, ou de como conjugar o respeito absoluto pela liberdade individual e os interesses do grupo.
As meninas turcas querem a segurança da tribo. Sacrificam a sua individualidade à coesão social por uma ideia que é a de nação turca não laica. Eu arrepio-me com essa escolha. Mas sei que escolher o contrário disso também não é motivo de felicidade individual por si só. O que haverá a pesar é o resultado do maior bem público que se pode obter com cada um dos modelos e tendo em conta a posição livre de todos os interessados. A liberdade, sempre a liberdade como critério. Até para se ser infeliz é doce a liberdade. Para quem é.
Inspiro, expiro. Ideia para a sociedade/sentir do indivíduo.
Mónades, milhares de mónades. Gosto de conceito pitagórico e mais tarde leibniziano.
O problema é que nós não somos mónades: porque somos tudo menos matéria simples.
"Não, não, não. Tu é que dizes que não são matérias simples." Vício profissional.
Mais vale tarde do que nunca.
quarta-feira, fevereiro 13, 2008
A mentira das criaturas
Inventamos todos a vida dos outros. E ás vezes estamos profundamente convictos que não estamos a inventar a nossa. E que por isso só nós podemos falar dela e ter a última palavra contra a dos outros. E às vezes é verdade.
Não consigo ver nas invenções discursivas deste primeiro-ministro e no seu ministério da educação, na sua despudorada forma de inventarem a realidade que mais lhes convém para justificar as suas decisões, nenhum resto de razoabilidade discursiva. E só me apetece repetir: os homens mentem, os homens mentem, os homens mentem e ainda se mostram como mártires da verdade. E quando o fazem não me parece que estejam a trazer liberdade à sua acção discursiva no mundo, ou à sociedade, mas antes o manto da calúnia por todos sobre os quais mentem.
Mas ele já mentiu antes, porque incomodar-me tanto quando ele diz de forma tão convincente :"Há trinta anos que os professores não são avaliados"? Mas não há outros assuntos mais importantes para o país do que aqueles que dizem respeito aos professores? Haverá, no presente haverá.
Jakob van Gunten: um diário. Lisboa: Relógio d´Água, 2005.
terça-feira, fevereiro 12, 2008
Como estás?
explico que não estou redondo nem quadrado. Neste momento acho-me mais uma espécie de losango.
- Estou losango
quem interroga a olhar para mim sem entender:
- Losango?
e eu
- Sim, losango, nunca te sentiste losango?
Nunca se devem ter sentido losangos. Há alturas em que me acontece pensar que as pessoas são esquisitas mas deve ser problema meu. Aposto o que quiserem que é problema meu. "
António Lobo Antunes, O homem que se sentia losango
Crise 3
domingo, fevereiro 10, 2008
Crise 2
Crise 1
Será verdadeira a ideia, para os que a fizerem verdadeira com o seu exemplo. Mas será uma ideia pedagógica?
Os deveres dos aliados
Ele há imagens culturais com muita força
sábado, fevereiro 09, 2008
Três presidentes prováveis 2
Clinton tem uma página com fotografia em pose presidencial, confiante sem ser confiada (não se foi primeira-dama em vão). Tudo nela muito em ordem. O cabelo, a maquilhagem, a roupa (ainda que pouco se veja porque a candidata é fotografada do pescoço para cima), o sorriso e um olhar amigável. As cores são as da bandeira, como todos os outros candidatos o fizeram, e sob o seu nome próprio (é curioso que se escolha um nome próprio para se propor à presidência, obviamente uma estratégia discursiva de fazer ver o que é obvio, ela não é mais um Clinton a candidatar-se, é ela, Hillary que até é casada com um antigo presidente americano.) uma linha de bandeira.
Três presidentes prováveis
A sociedade americana não está a escolher o negro ou a mulher ou o herói, está a escolher políticos, senadores com obra feita, está a seleccionar ideias, está a dizer o que prefere numa pessoa para o cargo de presidente. Não é o sexo ou a cor, ou por si um passado militarmente glorioso que são eleitos. Isto parece-me uma análise da sociedade do século passado, do tipo: “Olhem, incrível, um negro, ou uma mulher a poderem ocupar um cargo da natureza a que se encontram a concorrer!” É retirar à pessoa o que ela ganhou com as conquistas ideológicas promovidas e divulgadas pelas declarações dos direitos do homem. Não há que reparar no que é óbvio. São aquelas pessoas, com a experiência que acumularam, com o carisma que possuem, com o dinheiro que conseguiram angariar para as suas campanhas, com os apoios que conseguem obter, com as ideias que defendem e o comportamento que manifestarem, que vão ganhar. Não me parece que seja por serem ou mulheres ou negros ou só homens brancos a disputarem as eleições o que leva as pessoas às urnas numa américa do século XXI, mas sim o que essas pessoas têm a oferecer de diferente, ou a propor na governação do país, por serem candidatos credíveis numa América que tinha muitos candidatos por onde escolher.
Paul Haggis, li no jornal Público de ontem, está a levantar com o seu filme “No Vale de Elah” (que ainda não vi) uma questão fundamental para o futuro dos americanos: o que pensam vocês que vai acontecer com os soldados que estão a vir do Iraque? Esta questão vai mais longe do que a mera constatação de uma realidade como é a de que esses soldados não estão a ser devidamente acompanhados pelo Exército no seu regresso. Isto é mau. Mas pior parece-me ser o que daqui possa advir no que a uma ordem interna dos Estado Unidos diz respeito. Dir-me-ão que as sociedades têm uma grande capacidade de resistência e de integração das pessoas. Que os soldados e as suas histórias serão devidamente escalpelizados pela indústria cinematográfica o que dará à imensa maioria um meio de sublimar a sua dor. Talvez haja uma pequena minoria a soçobrar, e que sendo lamentável não será inibidor da estrutura social tal como ela se conhece, mas eu duvido que estes milhares de soldados a chegarem, e tendo os meios de comunicação digitais ao seu dispor como nenhum outro soldado da história o teve, não tragam consigo uma mudança social, nos modelos sociais e no tipo de projectos políticos futuros. Infelizmente não sei prever em que direcção essa acção ou pensamento se encaminhará. Sou péssima a fazer previsões. Não sei se daqui sairá um maior reforço à Carta das Nações Unidas ou um outro documento internacional sobre conflitos, ou se, pelo contrário, se procurará fechar mais o país sobre si próprio e os seus problemas internos, suspendendo, ou invertendo as políticas externas mais agressivas. Seja como for, e como Cutileiro o destaca, o que se pode dizer é que, por agora, “os projectos de qualquer dos três presidentes prováveis em Janeiro de 2009 acabarão com os lados mais ofensivos, iníquos e ruinosos da política da administração actual e as relações dos Estados unidos com a Europa Melhorarão”.
Espero que a prática confirme esta hipótese.
sexta-feira, fevereiro 08, 2008
Agitação de águas à superfície
Há muito tempo que queria escrever sobre este episódio. Não sei porque o faço hoje aqui. Podia dizer que é porque ando para falar de um conjunto de temas para os quais não encontro palavras. Não é que eu me queira comparar em atitude à de Tunhas, não, porque eu não sou filósofa e por isso opinião lá isso eu tenho sempre, tal como o cãozinho de Pavlov salivava quando ouvia a campainha eu boto faladora quando oiço a palavra opinião, a questão está em que não tenho é palavras. Ou disposição para me sentar e encontrar as palavras. Para falar do conceito de crise, ou de ética, ou de deontologia profissional, ou de análise política de eleições a partir da questão do género, ou das pessoas da minha pátria que ciciam, ou das outras que dizem bem alto o que deve ser dito, mas que depois da excitação inicial que as suas palavras provocam são tomadas de uma reserva cúmplice para com uma ideia de estabilidade social que ninguém sabe o que é, nem sob que virtudes públicas deve ser fundada. Agitação de águas à superfície. Como seria interessante saber o que dessas correntes é arrastado para o fundo e cria lastro cultural.
quinta-feira, fevereiro 07, 2008
Plataforma democrática
Atente-se no destaque dado às eleições americanas e o nível de participação dos internautas por comparação ao interesse dos mesmos sobre a questão relativa ao futuro da União Europeia em 2008. Os números dos participantes no debate não enganam. O interesse está no continente a Noroeste.
Pendant des mois, le même slogan ressassé : « travaillez plus pour gagner plus ». Un éloge bienvenu du travail ? Bien plutôt l’annonce benoîte d’une adoration absolue pour l’argent (confirmée expressis verbis autant que de facto : yacht, jet privé, etc. – où l’on a vu que le président jouit surtout de l’argent des autres). Le but général : gagner de l’argent, à n’importe quel prix. Traduction : rien de moins qu’un esclavage, subjectif pour le riche, objectif pour le pauvre. Toujours plus d’argent, donc toujours plus de servitude, supposée vite oubliée devant la jouissance totale procurée par l’argent.
La tyrannie de l’activité (ou le simulacre de l’action) : le président ressemble à un enfant pathologiquement hyperactif, qui dissout son angoisse dans une agitation stérile et acéphale. Inquiet de l’amour qu’on lui porte, souffrant d’un complexe multiforme, il se dépense en efforts permanents de séduction. Séduire les électeurs des autres (Front National et centre droit), les militants des autres (les transfuges du Parti Socialiste), les femmes des autres. Un enfant œdipien en somme, mais qui est enfin parvenu à plier la réalité à l’empire de ses désirs. C’est pourquoi il ne peut s’empêche de s’exhiber : sa jouissance ne consiste pas seulement à posséder mais aussi à susciter l’envie. Je jouis, à la galerie, donc je suis. La morale est désormais désuète, la bienveillance politique caduque : reste la jouissance, le plaisir d’être adulé, obéi, admiré, envié. Triste tyrannie du désir insatiable d’être aimé.
Le fondamentalisme religieux personnel élevé au rang de politique de la République : la foi catholique, intense sentiment intérieur, source d’une jouissance rendue supérieure par sa référence présumée à la transcendance et à l’infini (les leurres classiques de la folie mystique), doit donc devenir une règle publique. Jouissance de détourner le lourd appareil de l’État au profit de ses petites croyances personnelles. Plaisir de poser son séant sur la Constitution (pied de nez à de Gaulle). Tyrannie de la jouissance religieuse (éprouvée grâce à l’idée d’une valeur suprême, d’une vocation totalement noble – en vérité un héroïsme de bénitier).
Immédiatisme, hédonisme, activité morcelée et éruptive, désir d’être apothéosé, culte de la jouissance sans limite. Tel est le programme inconscient du président Sarkozy. D’où une fâcheuse proximité pulsionnelle entre le raptus du roi de la rupture, la jouissance onaniste et la délinquance ; le voleur en effet veut lui aussi une satisfaction immédiate : pas de travail, pas d’attente, pas de négociation avec le réel. Jouir hic et nunc.
En cela, nulle rupture avec les présidences antérieures qui, cependant, s’exhibaient moins. Une sorte de honte caractérisait les corruptions du président Chirac et le président Mitterrand dissimulait ses prévarications – ce qui laissait encore fonctionner publiquement la norme de la justice et du droit. Le président Sarkozy se distingue d’eux par une telle exhibition de la jouissance qu’elle en acquiert un statut politique, effectivement renversant. À la subalternation juste de la pulsion au pouvoir politique, il substitue une subordination réelle du pouvoir à la pulsion. À promouvoir politiquement la jouissance, on établit la tyrannie.
Dès lors, le discours récurrent de l’autorité, l’éloge interminable de l’ordre, deviennent nécessaires. Il faut masquer l’anarchie pulsionnelle à la fois pour contenir sa propagation et en assurer l’existence au lieu seul du pouvoir. C’est pourquoi la demande sociale d’ordre et d’autorité, originairement suscitée par l’illimitation du capitalisme et par l’extension de l’anomie, est accrue précisément par l’hédonisme présidentiel public.
Plus le président affiche la tyrannie de ses pulsions, plus le « peuple » désire cette jouissance par procuration et, simultanément, s’effraie de l’inquiétante abolition des limites impliquée par cette jouissance. L’excitabilité sociale augmentant du seul fait du statut normatif du chef de l’État, l’attente de contentions répressives s’en trouvera automatiquement accrue. Ainsi, loin d’être mystérieusement concomitantes, l’exaltation de l’ordre et la promotion de la jouissance forment un unique système, où la jouissance du maître a pour condition la frustration pour (presque) tous les autres."
quarta-feira, fevereiro 06, 2008
As reformas e o seu povo
A mãe e o pai do rapaz suspiraram, fizeram um sorriso triste um para o outro e encolheram os ombros, e o menino nem notou as reticências. O desfile…o desconforto com a situação, a incapacidade de nos ligarmos, de criarmos empatia com o acontecimento, a sensação de alheamento e de tristeza que perpassava por toda aquela audiência que mesmo assim se amontoava para ver passar os carros alegóricos.
Quem desfila finge que não vê os forasteiros que ali no passeio os vêm passar, por desfastio uns e outros a encenarem os seus papéis, mas olha, olha, como ali à frente já se acena e se sorri à família e aos amigos.
Claro que também havia momentos de júbilo aqui ou ali. Um grupo grande de jovens raparigas adolescentes, animadas, alegres e cheias de graça, encantavam com os seus meneios, e perdoava-se-lhes até o inebriamento de cada uma por si própria e o esquecimento do seu serviço ao grupo. Pareciam uma nuvem e o efeito era engraçado.
E os homens? Confesso que me pareceram todos patéticos, ou então sem espaço para se me imporem pelo que quer que fosse: pelas roupas ou pelas coreografias, pelo arrojo ou pela virilidade, pela diferença ou pela loucura. Quase sem história, não fosse eu recordar o desvelo e o carinho com que três ou quatro “comandantes” já de meia-idade trataram uma jovem “hospedeira” que um imberbe “comissário de bordo” arrastara pelo chão no decorrer de uma cabriolice mais estúpida do que engraçada.
Não sei se se sentia o distanciamento entre o público e os participantes no espectáculo. Eu sei que senti esse distanciamento. Mas isto de percepções valem o que cada sujeito quiser que elas valham.
Não há empatia a circular por ali, sentem os pais do menino, e no entanto não pode deixar de haver simpatia, talvez uma certa piedade pelo destino comum de que não gostamos, que não desejamos mas que de alguma forma reconhecemos. Conhecemos aquele cansaço, aquele ar mortiço, as cores debotadas dos cabelos e dos sobretudos, a gordura a mais de muitos corpos sem ânimo, a parolice de ficar a olhar a fraca festa de Carnaval dos outros, ou o desleixo de um desfilar sem brilho pela avenida abaixo e rua acima. Conhecemo-nos de outros Carnavais.
Saí de lá com mais um argumento para o facto de estar profundamente convencida que Portugal precisa de referendar rapidamente o regionalismo. Da primeira vez votei contra. Imaginei Portugal governado por milhares de homenzinhos como Alberto João (com a minha devida vénia aos milhares bem gastos em infra estruturas na Madeira) ou ao Pinto da Costa (com a minha vénia às vitórias do FCP). Votei contra. Parva. Imaginei ser preferível um país centralizado a ser governado por homenzinhos como Barroso, Santana ou Sócrates. Pelo menos, pensava eu, estes podem ser mais fiscalizados pela imprensa e pelo público. Parva. Como se não houvesse ou não pudesse haver imprensa regional igualmente com vontade, que o poder talvez seja mais débil, de ser tão fiscalizadora quanto a outra. Como se o povo de cada região não soubesse exigir mais de cada político liberto da desculpa do governo central ser um empecilho à política regional. Como se o povo português, que no seu conjunto parece apagadito, temeroso ou inerte, feio mesmo com as suas roupas sempre escuras, não fosse formado por indivíduos que se olhados na sua singularidade revelam forças: um carácter esforçado, empenhado, um brio em fazer bem assim entenda como, um espírito de sacrifício, uma vontade de cumprir metas, assim saiba para que lado elas ficam.
Um banho de loja e uma ida ao cabeleireiro também ajudava, não resolvia tudo, mais ajudava a dar mais cor ao pessoal enquanto espera que o desfile passe. Na Nazaré como na vida. Parolices, isto também, eu sei.